Capítulo 6: Coincidência desesperadora.

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Com apenas onze anos Wang Yibo teve a sua primeira crise de ansiedade.

Naquela época Yibo estava passando por aquela fase detestável da adolescência conhecida como "odeio-todo-mundo", que toda pessoa já enfrentou, ouviu falar, ou presenciou; fosse por amigos, parentes ou gatos. Yibo nunca foi uma criança muito rebelde, talvez seu maior ato de rebeldia na infância tenha sido comer o pedaço de torta de sua irmã mais velha enquanto ela dormia. Porém, ele foi uma criança muito expressiva e emotiva, que dificilmente conseguia controlar seus sentimentos, embora tentasse reprimi-los na maioria das vezes.

Era aniversário de Guo, um garoto nada extraordinário do colégio, dono de três aves caras e de uma paixão incomum por Yu-Gi-Oh. Depois dos parabéns a mãe de Guo decidiu que os convidados deveriam discursar brevemente sobre o quão honroso era tê-lo como amigo, afim de aumentar ainda mais o ego inflado do filho.

Obviamente não faltou elogios, as crianças queriam muito os doces da festa e fariam qualquer coisa para tê-los, mesmo que isso significasse elogiar aquele pavão. Quando chegou a vez de Yibo a tensão caiu em peso sobre ele.

Verdade seja dita, Guo e Yibo não eram grandes amigos, ele nem mesmo sabia o porquê havia sido convidado, como se estivesse ali somente para fazer volume. Quais adjetivos poderia usar para descrever uma pessoa que nem sequer conhecia? Talvez algo do tipo "suas cartas de Yu-Gi-Oh são de qualidade" ou "Conversei com uma de suas aves e ela foi bastante simpática"?

De repente, Yibo se sentiu mal.

A maioria dos doces distribuídos eram bolinhos com formato de pêssego. Reza a lenda que uma deusa celestial conseguiu longevidade após ter ingerido pêssegos. Desde então, a fruta passou a ser um símbolo da longa vida, e assim surgiu o costume de come-los no aniversário. Antigamente, só os pêssegos frescos podiam ser servidos. Porém, devido à restrição regional e da temporada em produção, hoje em dia, é comum usarem bolinhos em forma de pêssego como substituição.

Mas Yibo nem sequer gostava deles!

Os convidados não pouparam olhares impacientes, olhares cruéis que apenas crianças irritadiças são capazes de expressar. Diante de tanta pressão, Yibo começou a criar seus habituais "e se".

E se eu gaguejar?

E se eu desmaiar?

E se eu vomitar?

E se ele me odiar?

Uurinar nas calças?

Ou pior, e se um meteoro cair no momento em que eu abrir a boca e todos passarem a me chamar de "maldição da China"?

Foi então que ele se lembrou de uma frase que ouviu em filme e resolveu usa-la, porque situações de desespero requeriam soluções desesperadas.

"Guo é uma boa pessoa, como um anjo caído do céu."

Nesse momento alguém - muito incoveniente, diga-se de passagem - falou:

"Até onde eu sei, quem caiu do céu foi lúcifer."

E em poucos segundos a sala inteira estava rindo. A mãe de Guo fuzilou Wang Yibo num misto de desgosto e insatisfação. Suas pernas tremeram feito gelatina e sem mais nem menos ele correu para fora. Atravessou a porta feito um jato e quando chegou (depois de exatos sessenta e cinco passos contados) a um ponto de ônibus, simplesmente vomitou na lata de lixo todo o macarrão de aniversário consumido no dia.

Sentou-se no banco com uma imensa vontade de gritar e chorar. Encolheu-se procurando proteção no silêncio não crítico. Sufocando numa onda de insuficiência, auto-validação e constrangimento. Naquele momento ele aprendeu que, se você engolir tudo o que sente, no final acaba se afogando. Ou vomitando.

FROST [EM REVISÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora