A cidade que me trouxe luz

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Toda aquela animação me fez chegar ao Shangri La e largar bagagens. Eles nem tentam mais discutir comigo lá. Fazem o check-in com informações passadas e guardam as malas na minha suíte preferida.

Eu senti o imediatismo de andar pelas ruas de Paris, de vivenciar aquela cidade que eu vi, mas talvez nunca tenha observado.

Quando em família, tudo era "Vamos até a casa de tal pessoa", "Tem um evento à noite, não se atrase", "Por que você não estava com as suas primas?" e talvez Paris tenha escapado pelos meus dedos. Eu sei que ela escapou.

Aproveitei os sapatos levemente confortáveis e andei. Vi cafés, vi namorados, vi muitos turistas que obviamente eram turistas. Vi restaurantes, vi padarias, inúmeros jardins. Prédios e mais prédios (mas era a beleza arquitetônica parisiense, afinal de contas). A noite foi caindo e eu comecei a ver bares. Parei em algum. No dia seguinte, boa parte do meu corpo estava jogada por cima de alguém na cama completamente desfeita de lençóis perfeitamente brancos do Shangri La.

O bartender me explicou por cima o que ele lembrava: após várias bebidas, eu pedi que ele fosse embora comigo. Ele me perguntou se eu não me incomodaria de esperar até terminar o horário de trabalho dele. Não foi muito difícil esperar enquanto os drinks continuavam vindo e vindo. Ele chamou um carro e fomos para o hotel. Porta escancarada com força, botões de camisa sendo abertos (sério, como é que eu abri botões naquele estado?), zíper aberto, vestido no chão. Cinto desamarrado, costas contra a parede e nenhuma palavra. Homens são fáceis quando você quer a mesma coisa que eles.

De alguma forma paramos na cama e em algum momento apagamos de sono. Ele sabia muito bem o que precisava fazer: pegou suas roupas, uma água do frigobar e jogou um tchauzinho no ar, sorrindo.

Entrei no banho para lavar o álcool da minha aparência. Pedi café da manhã praticamente sem escolher. Mandaram aquele exagero francês que nós já conhecemos: salgados, doces, sucos, frutas e mais tudo que alguém pudesse imaginar para um café da manhã ao meio dia. Brunch? Maybe.

Uma das vantagens de beber é impedir meus sonhos vívidos de virem me fazer uma visita. Foi no meio de um desses devaneios quaisquer que recebi uma ligação. Era Claire, minha prima. A irmã do meu pai se casou com um empresário francês e eles decidiram morar em Paris, então eu só via Claire algumas poucas vezes por ano, geralmente em datas comemorativas ou férias.

- Samantha, ma cherie, onde você está? A Vó Enriquetta está louca atrás de você!

- Deixe que ela fique, Claire. Nem ouse dar nenhuma informação a ela. Eu sai. Eu não vou mais voltar.

- Tudo bem, mas onde você está?

- Mais perto do que você acha...

Ela soltou um som de "Sabia..."

- Me encontra hoje à noite? Tenho uma festa. Você trouxe trajes de gala, não é?

- Sério que você teve que perguntar?

Comi, me recompus (nada como mais bebida para resolver uma ressaca, não é verdade?) e comecei a me arrumar para a tal festa com as normais duas horas ou mais de antecedência. Chamei a cabeleireira, a maquiadora e a manicure. Comecei aquele ritual familiar e incômodo de aguardar todos aqueles procedimentos serem feitos para... Para que finalidade? Terei que chegar e tirar toda a maquiagem, desfazer o penteado, tirar grampo por grampo, pentear o cabelo para remover parte do spray de fixação, descer do sapato de salto, tirar o vestido (o que é um desafio e tanto com aqueles zíperes finos, pequenos e quase imperceptíveis. É sério, quem é o responsável por essa merda?) e então voltar à estaca zero. Cama, conforto e descanso.

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