Capítulo VI - Revivendo o passado, através das palavras de quem me conhece...

31 9 0
                                    

   Este capítulo contém cenas fortes.

   Nota importante: Uma amiga disse-me que seria importante colocar uma classificação etária neste capítulo. Eu confesso que não sabia bem que classificação etária colocar, mas a verdade é que também não quero ferir a suscetilidade dos leitores mais novos. Acima de tudo, acho que é minha obrigação como escritora proteger-vos enquanto leitores, pelo que vou classificar este capítulo como para mais de 16 anos. Contém cenas de alguma violência emocional. 

(parte 3)

   Elton ficou a olhar para a mãe, quando viu o pai arrastar a irmã porta fora. Perguntou-lhe para onde iam. Ela não sabia. Mandou o filho ir deitar-se que já era tarde.

   Ele continuou a insistir para saber respostas sobre o que iria acontecer à irmã, quanto tempo demoraria a regressar a casa, perante a impaciência da mãe. Ele tinha 5 anos, o pequenote tinha medo de dormir sozinho. Tinha medo do escuro, tinha medo de estar sozinho. Por isso, Laila e ele dormiam no mesmo quarto e por vezes, até na mesma cama, quando ele tinha pesadelos. Ela era a sua aliada para sobreviver àquele ambiente hostil ao seu normal desenvolvimento.

   E na visão do irmão, ela tinha superpoderes. Era uma ladainha que ele lhe recitava todas as noites. Pedia-lhe que "lhe retirasse os maus pensamentos, para que nada de mal lhe acontecesse e para que não tivesse pesadelos" e Laila já farta de o aturar, dizia-lhe que ia ser tudo como ele lhe estava a pedir e para fechar os olhinhos e dormir. Nem sempre acontecia como a irmã lhe prometia, ele adormecia ao som das discussões dos pais muitas vezes e algumas vezes tinha pesadelos e nesses momentos, Elton ralhava com ela, só para a perdoar depois. De certa forma, todas as noites que dormira em paz sentira dever-se a ela. Devia-se de facto, mas não era por causa de ela possui superpoderes, era antes o seu amor ou o amor de Deus pelos dois a operar milagres, na vida deles.

   Mas, hoje, não tinha Laila para cuidar dele e estava sozinho. Elton foi para o quarto como a mãe lhe tinha mandado, mas em vez de fazer a higiene para se ir deitar, em vez de dormir, deitou-se sobre a sua cama (que era um colchão pousado sobre o chão) e começou a chorar. Para todos os efeitos, era uma criança que sentia a falta daquela que, sendo em termos de sangue sua mãe, sempre desempenhara a função de mãe.

   A sua "mãe" não estava na sala. A sua "mãe" tinha sido levada por um homem perigoso para longe dele e ele sentia-se, mais do que tudo, abandonado. Elton continuou a chorar até que Laila regressou a casa. E, na realidade, ele tinha muitas razões por chorar por aquela pessoa que ele tanto amava.

   Laila era sua "mãe", mas nem por isso tinha a maturidade para sê-lo. Nem a biologia lho permitiria por enquanto. Laila era muito mais inteligente do que as outras crianças da sua idade, mas não estava, nem estaria num futuro próximo preparada para ter uma relação com um homem. Laila era, na melhor das hipóteses, uma criança noutra etapa de desenvolvimento que Elton, mas, mesmo assim, uma criança, que deveria ter direito a viver a sua infância.

   Só o pai biológico dela é que parecia não pensar da mesma forma. A inocência de Laila, no entanto, a sua ignorância sobre estes assuntos, levou-a a cogitar que a pior coisa que lhe poderia acontecer, naquela noite, depois de ter regressado com o irmão doente das urgências, era acabá-la roubando. Porque devia ser isso que o pai a queria, para realizar um assalto, para os desenrascar numa qualquer situação em que ser pequeno pudesse significar uma vantagem. O que lhe parecia um pouco desproporcional seria o tempo que demorariam a fazer o assalto com a necessidade imediata que o pai devia estar a sentir em relação ao álcool.

   O braço dela estava a ser puxado com uma força absurda, como se ele estivesse preparado para o caso de ela tentar fugir. Mas, ela não tentou, nem tentaria. Até porque ela não sabia onde se esconder, que orientação tomar, ainda numa noite tão cerrada como aquela. Ela não estava a oferecer resistência. Deu ao pai total poder, porque queria que aquela noite infernal acabasse rápido. Queria regressar para o lado do irmão e sossegá-lo, ver se estava tudo bem com ele e com a mãe, que, por minutos, pareceu querer defendê-la. E nada disto seria possível até que aquele homem concretizasse as suas ideias!

De regresso a casa...Onde histórias criam vida. Descubra agora