Capítulo II - Contigo, a conversar sobre a vida, sobre Deus... (parte 1)

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   Margarida avançou em relação a Laila. A garota esperava-a sentada num dos bancos ao pé do lago que tinha os patos. Estava virada para o lado da rua, não para o interior do jardim, no entanto aquele ponto específico já ficava num lugar mais interior ao próprio jardim, se não no centro daquele lugar que as pessoas procuravam para relaxar. 

   Laila estava virada para a universidade com o nome do talvez maior poeta português. Podia estar assim orientada porque, sabia que era naquela direção que sairia a amiga, mas estava também de costas para a academia de dança onde treinava. O corpo encolhido, as pernas em cima do banco, organizadas ao estilo chinês (mesmo sabendo que para ser o verdadeiro estilo chinês, teria de estar sentada no chão).

   As costas não tinham apoio, mas nem a isso Laila parecia ligar. Tinha o saco do equipamento do lado esquerdo e uma bolsa que agarrava com alguma convicção no lado direito. 

   Mesmo antes de chegar até Laila, Margarida já observava a cena. 

   Laila, quando a viu, apenas colocou as pernas para baixo. Tentou organizar de outra forma o corpo. E sorriu-lhe ainda que com algum nervosismo. 

   Margarida veio, com as folhas que segurava nos braços, sentar-se ao pé dela. Cumprimentou-a, disse-lhe "Olá" e tocou-a no ombro, mas não a abraçou ou deu dois beijinhos. Aqueles não eram comportamentos normais para nenhuma das duas.

   Depois disso, Laila fora a primeira falar, ao mesmo tempo que colocava a bolsa do seu lado direito no colo (dantes, fazia o mesmo, mas com o saco do equipamento).

   - Então, o que contas? O que descobriste sobre os teus pais? - questionou ela.

   Margarida sorriu, de um jeito nervoso.

   Laila voltou a inquirir sobre as descobertas da amiga.

   - Acho que descobri duas coisas que não estava à espera: a primeira coisa é que o meu pai e a minha mãe não estão juntos, pelo menos em termos geográficos (o meu pai, segundo a papelada que me deram, está na Suíça) e a minha mãe continua na casa onde morei com eles e a segunda é que a minha mãe já esteve presa.

   - E isso desmotivou-te na tua luta para regressares a casa?

   Margarida sorriu:

   - Não. Apenas, me fez pensar que talvez estejamos a precisar mais da companhia um dos outros do que à partida possa parecer! Porque, se eu estivesse perto da minha mãe, teria feito de tudo para que ela não fosse presa. Melhor do que isso, partindo do princípio de que houve um momento de perdição na vida dela, em que ela achou que o crime era o melhor caminho para resolver um problema, apoiaria-a para que ela percebesse que, apesar de o crime lhe poder dar alguma satisfação imediata, nunca seria um método eficaz de avançar no caminho da verdadeira felicidade. Na verdade, é como se ela quisesse atalhar um pouco o caminho e como colocou as coisas mundanas à frente de tudo o resto, acabou por se perder, quando tentou regressar ao trilho original.

   Laila pareceu um pouco chocada.

   - Mas, achas que a tua mãe pode, de facto, ter feito alguma coisa de grave que a pode ter conduzido à prisão? Não achas que pode ter sido cometido um engano e ela pode ter sido condenada, estando inocente?

   A garota, amiga da b-girl, voltou a sorrir. A questão nunca fora assim tão simples, evidenciou ela. Na realidade, ela não sabia que contornos tinha sofrido a história dos pais, depois do seu último encontro. Podia ter sido que em algum momento, eles tivessem feito alguma coisa que não estivesse propriamente de acordo com a lei. Mas, conhecia a essência da mãe, da mulher que a amamentara e lhe dera carinho, daquela que sonhou protegê-la sempre, que se fascinava ao ver a sua filha crescer. Sabia que se essa mulher tinha cometido um crime, não teria sido de todo um crime violento, algo vergonhoso e desprezível. Teria sido um daqueles crimes para sobreviver. 

De regresso a casa...Onde histórias criam vida. Descubra agora