1944.
Chegamos de volta a Orlândia em um leve pouso e fomos escoltados até o palácio de Salem.
Enquanto as empregadas desfaziam as minhas malas, deitei e me afundei na cama, estava cansada demais para pensar ou escrever sobre as vivências que tive no Quênia. Acordei no meio da noite ainda com a minha roupa de viagem, fui me trocar e vesti uma camisola em um bege mais para branco.
Estava com fome e fui ver se tinha algo na cozinha, logo peguei minha luminária e desci as escadas.
O caminho era longo e escuro, mal podia enxergar mas me lembrava dos corredores, o chão estava frio e conseguia me apoiar nas paredes para não cair ou tropeçar em algum móvel ou estátua.Por fim acabei me perdendo e meus olhos começaram a pesar, até que achei um sofá em um lugar com cheiro de mofo e dormi ali mesmo.
Fui encontrada por um dos empregados pela manhã, mas que estranho... tinha acordado na biblioteca, mas não sei muita importância para isso, e fui me trocar nos meus aposentos, queria algo leve para este dia, não quis me abanar com meu leque o dia todo morrendo de calor, afinal estávamos no verão.
Continuei a mandar cartas para o Antônio, mesmo que ele não recebesse eu queria sentir a sensação de que ele abrisse e sentisse minhas palavras em seu coração.
Fui a casa do José pela parte da tarde, ele iria se mudar e queria agradecer por tudo que ele tinha feito por mim no bunker, mas tinha certeza de que um dia iríamos nos reencontrar.
- Obrigado José por tudo, tenho uma profunda gratidão por você, espero podermos nos reencontrar.
(Abracei ele e o dei um beijo em sua bochecha).
- Tenho uma grande dívida com você. Obrigado pelos momentos, mesmo sendo de tristeza e ruins, mas sou grata, siga a sua vida, mas com responsabilidade, te amo meu querido amigo.- Obrigado pelas lições Elena, serei eternamente grato por tudo, por ter salvo a minha vida, mesmo você dizendo que não foi nada, você foi uma grande amiga que a vida me deu, vou te levar para o resto de minha vida, te amo Elena.
- Seguramos a mão um do outro enquanto sorríamos, até que de minha foi falado um Adeus, pondo um ponto final e exclamação em mais uma história.
De lá, fui para a casa da Betty e Carmita, vê como elas estavam.
- Olá Betty, você está radiante hoje, o que tem feito?
- Fui para a horta colher alguns tomates, a colheita está sendo boa esse ano.
- Ah que bom minha amiga, e a Carmita como tem passado?
- O mesmo de sempre Elena, você sabe. Ela tem seus altos e baixos, mas depois do que passamos no bunker ela piorou, mas se acalma quando toma os remédios que o médico prescreveu para ela.
Entrando para a parte da sala, fui falar com a Carmita em sua cadeira de balanço. Me surpreende que ela se lembre de minhas histórias, e olha só, tinha mais uma para ela. Não sabia se ela iria se lembrar daquela história da próxima vez que fosse visitá-la, mas continuei contando, sempre é bom ter um ouvinte, principalmente um que saiba escutar muito bem.
Os olhos dela se enchiam de um sentimento, de que eu não sabia qual, mas brilhavam mais que estrelas cadentes. Como se sua alma se expressasse para mim.
Antes de ir embora tomei um chá de camomila e agradeci pela tarde agradável que passei lá, dando um beijo quente em Carmita e um abraço doce em Betty.
Voltando para casa, vim recitando uma poesia que Carmita sempre dissertava para mim e eu ouvi-la com a mesma empolgação que da primeira vez.
Ele diz assim:
"Depois de estar cansado de procurar
Aprendi a encontrar.
Depois de um vento me ter feito frente
Navego com todos os ventos."Aquelas palavras ecoavam em minha mente, despertando garra para navegar com os ventos que estavam ao meu favor.
Diante o ano de 1944, aprendi a expressar melhor o meu lado artístico, até que descobri a vocação de que cantava muito bem. Logo aprendi a tocar Piano e toda festa que meus pais davam, eu era meio que obrigada a tocar para os convidados, uma forma de agrado e presente de Salem para todo os outros.
Eu amava ouvir música francesa naquela época e estava começando a desbravar a música popular brasileira, carregada de energia e emoção. Tinha meus favoritos, claro.
Eu ia junto com a Eleanor, minha governanta fazer compras no comércio local, não tinha muitas opções, estávamos nos reerguendo pouco a pouco. Fui comprar morangos para fazer uma torta mais tarde, alguma coisa para me distrair.
- Olá senhor Harries. Gostaria de uns morangos hoje.
- Olá Elena, qual a quantidade que você deseja??
- Cerca de 30.
- Nossa, hoje não vai faltar morango né? (falou com um sorriso discreto).
- Não vai mesmo. (Respondi em um tom gentil).
Logo voltei para o palácio e pus a mão na massa, como os italianos dizem. Comecei fazendo a massa e derretendo o chocolate, preparei a forma e esquentei o fogão. Fiz um pequeno corte no meu dedo enquanto cortava os morangos, mas nada demais, continuei cortando e recheei a torta, tinha receio de dar errado, mas minha governanta estava me ajudando na receita, seguindo um velho livro de gastronomia.
E Voilà, uma torta de chocolate com pedaços de morango, aproveitei um pouco da calda e morangos que sobraram para mais tarde, meu rosto ia ficar cheio de espinhas, tinha certeza, por isso comi com mais vontade ainda... o que não mata, engorda não é mesmo?
Fiquei admirando o meu corte que levei cortando os morangos, nem estava doendo mais, era como as dores que tinha levado na vida, no começo dói, é insuportável, você pensa em diversas vezes desistir, mas com o tempo essa dor diminui, e logo não existe dor, e só cicatrizes fechadas. Eu estava completamente recuperada das dores do passado, finalmente meus conflitos internos haviam acabado.
Continuei saboreando a torta enquanto deixei a outra metade para a janta, com a finalidade de comer junto com os meus pais. Um ato de compaixão.
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A Rainha
Historical FictionNascida logo após a Primeira Guerra Mundial, no país de Salem, Elena Davies cresceu longe dos holofotes, apagada da linha de sucessão ao trono, junto com os seus pais em um pequeno palácio, mas logo após o seu Tio abdicar do trono, todo rumo da hist...