"Comportamento gera comportamento"
AnônimoRafael, acordou mais cansado que o dia anterior. Ainda na cama, olha para o teto penando o dia de ontem. Penando mesmo. Dor. Agrura. Impotência.
Olhou para a televisão, mas não a ligou. A única coisa que desejava era continuar deitado. Com certeza, os noticiários deveriam estar comentando sobre o funeral da freira assassinada. E a última coisa que Rafael queria, era assisti aquele circo de horrores, criado por ele mesmo.
O mínimo movimento que ele faz, o deixando mais cansado. A cada dia ele sabe que é um dia a menos da sua vida. Como acontece com todos nós, porém, ele sabe até quando vai seu prazo de validade.
Rafael, procura sua bengala e se levanta da cama não calçando suas sandálias, preferindo sentir o frio da cerâmica em baixo dos seus pés. Por um momento, aquela sensação o faz esquecer do inferno que vive.
A cafeteira, ainda tem um pouco do café que ele fez ontem. Parado, olhando para ela, fica em dúvida se passa um café novo ou se toma aquele da cafeteira.
Como quem que se recrimina, Rafael balança sua cabeça. E mexe os ombros respondendo tanto faz à pergunta que se fez. Café é café para quem gosta. Frio, quente, gelado, novo ou velho... café é café.
O homem de quarenta e cinco anos, mas que parece ter sessenta, coloca todo o café num copo personalizado e sorve-o de uma vez.
Sente vontade de fumar, e chega a procurar o maço de cigarro por instinto, mas lembra-se que não fuma mais. A dois anos que não dava nem um trago, até o dia de ontem.
— Oi. Bom dia. Vocês entregam cigarro? Ótimo. Eu quero um pacote. Ainda vem dez? Maravilha. O pagamento será em dinheiro. Anota aí meu endereço. Meu nome é Juarez. Vai demorar muito? Nem dobrando a taxa de entrega, vocês chegam mais rápido? Hum. Entendi. Fazer o quê? Sou eu quem estou com vontade de fumar... irei aguardar. — Rafael, desliga o telefone, e não passa muito tempo, o celular que está dentro da fruteira, vibra.
A foto de Júlio aparece no display do Iphone. Rafael fica em dúvida se entende ou não. Mas, suspirando e puxando o ar atende.
— Estou vivo.
— Você está com a televisão ligada?
— Não.
— Se fosse você, eu ligaria. E se estiver em casa, acho que a polícia deve está se preparando para invadi-la. — Júlio, recebe apenas o silêncio do irmão.
— Júlio, eu preciso desligar. Obrigado por tudo. — Dito isso Rafael desliga o telefone e pegando o controle remoto que está próximo da fruteira de mesa, liga a televisão.
A foto dele está estampada no noticiário nacional, para todos verem. Rafael, senta-se no sofá marrom de listras brancas e assisti a polícia civil saindo da sua residência fixa.
Depois que Júlio o deixou em casa ontem, ele teve um sentimento de sair dali e se dirigir para seu esconderijo de número um. Rafael, sempre usou três esconderijos e uma residência fixa.
A sua intuição mostrou-se verdadeira. O repórter não para de repetir que o assassino da freira, foi denunciado por uma testemunha anônima. E que tudo indicava, o homem procurado pela polícia fazia parte de um cartel miliciano.
— Oi. Sou eu. Posso contar com você?
Depois de ouvir a resposta, Rafael joga o telefone na parede. E com seus últimos vestígios de força, arrasta o sofá empurrando-o com as mãos.
Ira. Muita ira no coração. Aquela ira que traz o desapego, agora queima no coração de Rafael.
Era exatamente isso que ele temia. A ira nascida por Glauco não ter parado com seu plano de vingança. E querer acabar com ele, de todas as formas.
Porém, o pior, se é possível dizer assim, é trazer mais dor para a mãe de sua filha. Agora, Laura sabe que ele é o assassino. E fica imaginando a dor que ela deve estar sentindo, ao saber que abraçou e beijou o homem que matou sua única filha.
Rafael, com seu semblante caído e arrasado, rumina sua vingança, sabendo que tem poucos dias de vida. Agora, na cabeça de Rafael, tudo que vier a acontecer a Glauco e seus filhos, terá sido porque o mesmo procurou isso. Comportamento gera comportamento.
A morte de Maria Fernanda, havia o deixado com o sentimento de equidade, embora sua filha fosse inocente, e esse sentimento, no mínimo, ser doentio.
Rafael, aceitou conviver com a perda, achando que estaria pagando pelos seus pecados até o dia da sua morte, e desejando ainda sofrer mais, mesmo quando passar dessa para a outra vida, caso exista.
Agora, juntamente com o sentimento de desapego da sua vida, Rafael passa a sentir o mesmo pela vida de Glauco. E isso não é bom para uma pessoa vingativa e que tem o dom de matar.
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O Coice de Mula - COMPLETO - Lançado no dia 03/05/2020
Mystery / ThrillerA "sorte", a morte, um coice, a vida e a verdade... tudo caminha junto. Tudo está ligado. Somos um tudo de um todo. Conexões e conexões. Rafael Souza, 45 anos, solteiro, assassino por natureza e com uma doença terminal, recebe seu últim...