– Pronto, acabei a minha rodada de hoje! – bloqueei a tela do celular, jogando-o sobre a mesa da varanda do quarto de Gianina, no segundo andar. Horas depois da ida ao shopping, esperávamos meus pais chegarem para me buscar. A distância para minha casa era pouca, mas sendo já de noite, eles se sentiam receosos de me deixar voltar sozinha. Como eles estavam na rua, de carro, desviariam um pouco do caminho para casa e me levariam.
Enquanto nós aguardávamos, Gina sentada em uma cadeira e com os pés no meu colo, fazíamos mais uma sequência de marcações num post do Instagram. Uma rádio local havia lançado uma promoção para levar duas pessoas ao camarim da Hayley Kiyoko, que faria um show no próximo mês, uma semana depois do aniversário da minha amiga. E eu era completamente doida pela Hayley.
De verdade, eu era doida por ela.
Era estranho pensar sobre o assunto, pois ao mesmo tempo que evitava olhar romanticamente para alguém, eu nutria um imenso sentimento de admiração e atração pelos meus ídolos. Eu me tornava obcecada por cantores e atores com uma facilidade imensa, algumas vezes até mesmo – vergonhosamente – sofria quando alguma notícia ruim surgia. Manter uma paixão platônica pelos meus ídolos era muito mais divertido e saudável que, bem, por pessoas comuns. E minha lista de ídolos era grandinha, com certeza. No entanto, Hayley Kiyoko estava definitivamente no topo.
Ela não era só mais uma cantora pop, pra mim. Apesar de ter visto Lemonade Mouth anos atrás totalmente por acaso, já que era parte do catálogo da TV a cabo, só algum tempo depois que fui reconhecer a garota que era a baixista do filme. Ela havia crescido, mudado, e suas canções falavam sobre sentimentos e ideias que eu também tinha. Eu me identificava com o que ela cantava, e ela representava algo que eu mesma via em mim, sem que eu precisasse me expressar por conta própria. Era reconfortante ver que uma pessoa completamente diferente de mim se aproximava tanto de um lado tão íntimo meu. Dessa forma, era fácil eu me sentir tão ligada a ela.
Óbvio que, como uma boa fã, eu surtei quando descobri que teria um show dela na minha cidade. Meus pais provavelmente não me deixariam ir sozinha, então antes mesmo da data do show chegar, fui influenciando minhas (poucas) amigas a ouvirem, e quem tinha se mostrado mais animada com isso foi Gina. Ela topou ir comigo e recentemente participávamos dessa promoção para irmos juntas ao camarim. Era o meu sonho e uma história legal que ela teria pra contar.
Durante o dia, tirávamos pelo menos meia hora para participar da promoção, já que era o que multiplicavam as nossas chances. Eu nunca acreditei muito nesses posts, mas não custava tentar, né?
– Eu tô acabando aqui – disse Gianina, concentrada na tela do celular. Sem perceber, fiquei durante alguns segundos encarando minha amiga, notando o quanto as feições sérias dela também a deixavam muito bonita. Ela era uma daquelas pessoas que chegavam a dar raiva, de tão bonitas, pois sequer sofreram na adolescência sendo um patinho feio.
Eu não precisava nem dizer que era o próprio patinho feio, claro.
Desviei o olhar quando percebi o que fazia, vendo um rosto familiar se aproximando. Liam acenou, abrindo o portão da sua casa e caminhando até perto de onde estávamos, do outro lado do muro que dividia o lote. Gina se virou para ele também, ao ouvir o som do portão.
– E aí, mais uma maratona de filmes hoje? – ele perguntou, sorrindo.
– Hoje não – disse minha amiga, ajeitando-se na cadeira. – A Amelia vai pra casa daqui a pouco.
– Ah, sim. – ele pareceu se lembrar de algo rapidamente. – Deixa eu subir, tenho um negócio pra vocês!
– Achou um brinde perdido de Wifi Ralph, que eu te pedi desde que lançou?
Liam negou com a cabeça para Gianina, rindo e sinalizando para esperamos. Pouco tempo depois, surgiu na varanda do próprio quarto, ao nosso lado. Segurava um pôster enrolado.
– É realmente algo perdido, mas desiste das princesas do Wifi Ralph que não vai rolar – disse, estendendo o pôster em nossa direção. Levantei-me para alcançá-lo, entregando direto para Gina, que era quem geralmente ficava com os brindes que ele trazia do trabalho.
– Nossa, esse filme é péssimo – minha amiga resmungou, deixando-me confusa. Ela estendeu de volta para mim, que só espiaria antes de devolver para Liam. – Toma.
Era o pôster de Os Últimos Jedi, pessoalmente um dos melhores da última sequência. Antes que eu terminasse de enrolar, Liam me interrompeu.
– Pode ficar, se quiser – disse ele, sorrindo de forma amigável.
– Ah, brigada! – abracei o pôster contra o peito, respondendo ao seu sorriso com um maior ainda. – Por que você não gosta do episódio oito, Gina?
– Oito? – ela fez uma careta. – Esse não é o último que lançou, o nove?
Liam e eu nos entreolhamos, ambos com a melhor expressão de "O que essa doida tá falando?" que conseguíamos fazer.
– Amiga, o último foi A Ascenção Skywalker, a gente viu tem pouco tempo até – expliquei, rindo de leve.
– Vocês até foram quando eu tava atendendo na pipoca, nesse dia – lembrou Liam. – Por isso eu disse que esse pôster era um perdido, ele é do filme mais antigo.
O rosto de Gianina se acendeu quando ela se deu conta do mal entendido.
– Ah... Eu gostei desse filme, na verdade.
– Agora já era – ergui uma das mãos, rindo. – Já é meu.
– Isso não é justo! – disse minha amiga, emburrada. Liam também ria.
– Foi totalmente justo – ele saiu em minha defesa. – Você podia ter perguntado antes sobre qual era o filme.
– Eu lá vou saber?! – Gina rolou os olhos. – Mas tá, fica com isso. Nem queria, mesmo.
– Ótimo, porque mesmo se quisesse, eu não ia dar – dei a língua para minha amiga, de forma infantil, e ela respondeu igualzinho. Ouvimos todos uma buzina, e o carro dos meus pais estava parado na calçada em frente. – Chegou a minha carona!
Acenei para meus pais, e logo minha mãe surgiu na janela que se abriu, cumprimentando Gianina e Liam. Virei-me para ele, que estava apoiado na grade da varanda. Apesar das casas serem geminadas e dividirem o mesmo terreno, não eram próximas o suficiente para que eu pudesse chegar perto.
– Eu te daria um abraço, mas tá meio complicado – comentei, fazendo-o rir brevemente.
– Fica pra outro dia – ele deu uma piscada e parecia feliz, mantendo o sorriso. Concordei com a cabeça. – Eu te cobro.
– Justo – concluí. Voltei minha atenção para Gianina, que já estava de pé na porta para seu quarto.
– Vamos, vou contigo até o portão – disse ela.
– Tchau, Liam – acenei antes de entrar, vendo-o fazer o mesmo.
Minha amiga fechou a porta de vidro, parada com as mãos na cintura enquanto eu procurava as minhas coisas pela bagunça do seu quarto. Ainda sentia o coração quentinho por ter ganhado o pôster de Star Wars, que além de uma das minhas sagas favoritas, tinha o Adam Driver na sequência, e ele era um dos que constavam na minha lista de obsessões de fã. Eu já tinha um lugar perfeito para colar o pôster, na minha parede. Eu realmente devia um abraço em Liam para agradecer.
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I L.G.B.T.?
Teen Fiction17 anos, uma lista de paixões platônicas e o sonho de conhecer a ídola da música. Tudo absolutamente normal para Amelia, exceto que ela não se sentia normal. Sob o estresse de esconder quem ela realmente é, como será a semana decisiva em sua vida?