6. Kings of Convenience - Misread

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"Meus pais acham que eu sou lésbica."

Depois de pensar bastante se devia ou não falar sobre isso, enviei a mensagem para Gianina. Estava perto do fim da aula de Matemática, na segunda-feira após a festa de aniversário da minha amiga. Era estranho pensar como os últimos dias vinham convergindo para isso, como se houvesse uma data limite para que eu admitisse publicamente por quem eu me atraía. Mas eu simplesmente não podia nem conseguia me decidir por diversos motivos. Um deles era o fato de eu nunca ter realmente me envolvido com alguém.

Eu já tinha visto vários relatos pela internet de pessoas que, mesmo sem ter se relacionado com alguém, sabiam que eram homossexuais desde muito novas – mas eu não era uma dessas. Há anos eu apenas reprimia meus sentimentos pelas pessoas, a ponto de anular minha própria sexualidade. Eu não sentia nada por ninguém, e só a ideia de isso acontecer me apavorava tanto que eu bloqueava. Imaginar ter que lidar com a rejeição me deixava extremamente ansiosa, e eu não sabia como lidar com isso, logo fugia de qualquer possibilidade. E agora as pessoas começavam a desconfiar e sugerir coisas que nem mesmo eu sabia se era verdade. Eu gostava de garotas? Ou de garotos? Ou de ninguém?

Um fato era real: eu estava mexida por causa de Liam. E por isso passei a evitá-lo desde aquele abraço, mais uma vez voltando ao hábito de reprimir sentimentos. Entretanto, estava incomodada por não conseguir; era difícil esquecer algo que era real, não só inventado na minha cabeça. Eu tinha realmente me sentido... atraída por ele. E eu só sabia lidar com paixões platônicas. Ou seja, eu não conseguia – porque não sabia como – esquecer que ele existia.

Enquanto isso, ao longo de um domingo de preguiça e cabelo pro alto, ouvi meus pais conversando sobre, bem, minha vida amorosa. Com a festa de Gianina terminando de madrugada, fui dormir quase de manhã e acordar no meio da tarde. Meus pais tinham me buscado de carro, como de costume, então minha mãe não tinha me acordado – coisa que fazia normalmente –, pois sabia que eu tinha ido dormir tarde e não tinha nenhum compromisso. Eles não perceberam quando eu acordei, provavelmente porque a TV estava alta demais para me ouvirem andar pelo corredor, contudo, eu os ouvia falando em alto e bom som.

– Talvez... – disse minha mãe, e eu parei no corredor, uns passos antes do campo de visão dela, que estava na sala. Meus pais costumavam conversar coisas sérias entre si que evitavam falar na minha frente, diziam que eu não tinha que ouvir certas coisas. Eu continuava ouvindo, porque tinha me tornado uma fofoqueira profissional dentro de casa, inclusive andando sempre de meias para não fazer barulho. – Eu achei estranho ela ter entrado em crise por causa das roupas, mas agora faz algum sentido.

– E ela sempre gostou dessas coisas – meu pai pausou, procurando a palavra certa para falar – diferentes, né?

– Como assim?

– LBTG, sei lá a sigla – respondeu ele, e eu arregalei os olhos, prendendo a respiração sem necessidade alguma. – Aquela cantora que ela vai ver semana que vem mesmo, não sei se você percebeu, mas as letras são sobre gostar de garotas. Garotas gostarem de garotas.

– Mas isso não diz nada – minha mãe replicou. – Você gosta de Queen e nem por isso é gay.

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