Assédio é papo de mulher?

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Uma vez eu estava conversando com um amigo sobre estupro. Ele me contou de uma aula da faculdade em que uma menina da turma falou que tinha sido estuprada. Em seguida, disse algo como: é bizarro como você sente o clima pesado entre as mulheres quando alguém fala esse tipo de coisa.

Desde então eu nunca me esqueci dessa fala.

O clima ficou pesado para as mulheres.

Então uma pessoa fala que foi estuprada e o clima não pesa para todos dentro do ambiente, só para as mulheres?

Depois, levando essa situação para outros amigos homens, eu entendi que muitos optam pelo silêncio porque entendem que esse lugar é nosso, e somos nós que devemos falar. Se você é homem e faz isso como um ato de solidariedade, de verdade: obrigada. Mas não é isso que a gente quer. Não é disso que a gente precisa. Ainda que a nossa voz precise ser ouvida, é muito evidente quem fala mais alto. E quem é mais ouvido. E não somos nós. Nunca, na história, foi.

Se solidarizar com alguma coisa vai além de se retirar e deixar o espaço vazio para ser ocupado por outra pessoa. É ajudar a criar condições favoráveis para que a narrativa dessa pessoa possa ecoar.

O assédio não pode pesar só para as mulheres. Isso é inaceitável. Socialmente criamos corpos assediáveis, majoritariamente femininos. Mas e os corpos assediadores? Quem os cria? É para doer nos homens também. É para doer em todos. Só somos vítimas em potencial porque existe um agressor em potencial, e ele tem um corpo masculino. Um corpo que é reforçado simbolicamente todas as vezes que vocês, homens, se retiram de uma discussão que também lhes diz respeito. Eu não quero carregar essa dor sozinha porque ela não pertence só a mim. Tenham a decência de carregá-la também. Tenham a decência de entender que enquanto existir uma vítima de estupro no ambiente, o peso recairá sobre todos nós.

Reflexões para todasOnde histórias criam vida. Descubra agora