três || I'm only human after all

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Depois de cinco horas, eu me odiava por diversos motivos.

Mas o que encabeçava a lista era não ter nunca pego o endereço de Carolina.

E uma vez que aquela maldita não atendia o telefone, eu não tinha como entrar em contato com ela. Procurar o nome Carol Fontana no google não ajudara bastante, e tentar fazê-lo na lista telefônica era muito trabalho para pouca vontade.

Eu estava cansado, com uma roupa pelo menos sete números maiores do que eu vestia agora, com fome e sem ter para onde ir. Já que, graças a minha alergia a relacionamentos, eu deixara claro ao porteiro do meu prédio que nenhuma mulher poderia entrar em meu apartamento sem a minha expressa autorização.

Vítima da própria armadilha, apenas para me provar que pouco castigo era bobagem.

Pra falar a verdade, eu estava me odiando por não ter a quem recorrer, também.

Meu celular tinha uma extensa lista de números, mas nenhum deles poderia me ajudar no momento. E eu também não sentia a mínima vontade de olhar para qualquer um deles e dizer "Ah, oi, sou eu, o Miguel, mas uma vadia que eu devo ter comido muito mal decidiu me dar uma buceta. Posso dormir na sua casa?"

Isso não funcionaria. Nem mesmo tinha aquela intimidação pela qual eu era até que bem conhecido. Agora eu seria conhecido por ter uma maldita vagina.

Ah, Carolina Fontana, eu vou me vingar assim que te encontrar.

Meu carro estava parado em uma esquina de pouco movimento e de onde eu estava parado, conseguia ver plenamente a pequena casa simples, de portão esverdeado, com a luz da sala acesa, provando que a única pessoa a quem eu poderia pedir ajuda ainda estava acordada.

E pedir ajuda justamente à essa pessoa não seria nem um pouquinho fácil.

Pra ser honesto, eu havia demorado cinco horas para chegar à conclusão de que aquela era a minha única escolha. Antes disso, eu já tinha desistido umas três vezes e até tentado enganar meu antigo porteiro com uma voz grave.

Sabendo que se eu não saísse daquele carro naquele momento, eu não sairia nunca mais, dobrei as mangas da minha camisa, puxei minha calça mais para cima e me arrastei até a casa em questão.

Minha proposta era boa o bastante para que fosse aceita.

Do contrário, o fato de eu estar me humilhando daquela forma já era recompensa o bastante por tudo o que eu fizera a ela ao longo dos anos em que ela trabalhara ao meu lado.

A pintura azul das paredes da garagem estava descascando e o número 50 pendurado perto da campainha estavam meio tortos, o que me levou uma grande força de vontade para apenas apertar o botão e não ter um ataque de TOC por conta dos dois números de metal.

Respirando fundo pude ouvir o som da televisão diminuindo e quase pude ouvir os passos se aproximando da garagem. Só agora que eu estava perto o bastante de colocar meu plano em prática, me veio o pensamento principal: "E se ela não aceitasse minha proposta?". Eu tinha uma vagina, mas não tinha a merda de um plano B.

E então eu me odiei pela enésima vez naquele dia.

Ela não conseguiu me enxergar direito, pela escuridão da sua rua mal iluminada e se aproximou mais, chegando perto do portão. Eu só tive tempo de encarar Amélia por dois segundos antes que ela se virasse e voltasse na direção de onde viera.

O som da televisão aumentou novamente e eu fechei os olhos, apoiando a cabeça no metal das grades do portão, batendo palmas com a maior força que minhas mãozinhas conseguiam e intercalando isso com a campainha, apertando-a sem parar, torcendo para que aquela algazarra fizesse Amélia voltar até lá.

DianaOnde histórias criam vida. Descubra agora