De Outro Mundo

Voando

 
  — Então, está pronta? – Perguntou Justin.

Era uma noite de lua cheia e o apartamento estava vazio e silencioso. As luzes estavam acesas, mas se apagassem todas elas, a luz do luar iluminaria os cômodos do mesmo jeito. Os dois adolescentes estavam na varanda, estendendo o tapete e esperando o momento em que ninguém passasse na rua, para decolarem. Alex estava inebriada pelo céu estrelado, quando a voz de Justin lhe chamou de volta:

— Ahn... o quê? Ah, sim, claro que estou pronta! — Disse ela balançando a cabeça para tentar se concentrar no que tinha que fazer. Era difícil: no escuro da noite, o rosto de Justin parecia ficar misteriosamente sério e encantador. Suas feições rijas se destacavam mais sob aquela iluminação, e seus olhos verdes pareciam brilhar constantemente. O fato de que ele a encarava profundamente e estava bem próximo também não ajudava.

— Certo. Acho que dá para sairmos agora. Me leve até uma altura segura. Ao menos isso você já deve ter aprendido, não? — Pediu o rapaz.

Lembrar de suas últimas lições de voo fazia o estômago de Alex revirar, especialmente pela distância que predominou entre ela e o seu tio nos últimos dias, por conta daquilo. Havia um clima de irritação no ar sempre que os dois se aproximavam e a garota simplesmente não sabia o que dizer para melhorar a situação. Esperava realmente que sua aula com Justin fosse capaz de ajudar, senão, não saberia se teria chance de essa situação insólita se resolver. Então, mesmo com a sensação ruim que isso lhe causava, decolou.

O decorrer da aula foi bem diferente de como vinham sendo suas outras lições. Justin não fazia pressão, e explicava de maneira clara o que ela devia fazer, além de ser bastante atencioso. Depois de uma hora, ela já estava tentando manobras complicadas.

— Uou, calma aí! Fazer um looping em cima de um arranha-céu já excede todos os limites de cautela! — Falou o garoto rindo, mas preocupado. Depois completou — Você não precisa aprender mais nada; acho que com o que sabe, já consegue impressionar o Jerry.

— Você acha?! Mas já?!

— Sim, você é maravilhosa; incrível! — Falou num ímpeto. Depois, percebendo o que havia dito, ficou meio vermelho e tentou concertar – Acho que tem um dom natural para voar.

— Ah, já que é assim, precisamos voltar agora? Eu tô gostando desse lance de ser boa em voar...

— Não sei se... Ah, tudo bem, podemos estender um pouco a aula.

Então, eles passaram o resto da noite, voando por Nova York e aproveitando para conhecer melhor as redondezas, já que não tiveram muito tempo para isso desde que chegaram. Foram zoando um com o outro, brincado e se divertindo. Alex voou em volta da Estátua da Liberdade e tentou fazer eles encostarem a mão nela. Depois de conseguirem, sobrevoaram um estádio de baisebol e uma bola até caiu em Justin. Enfim, foi uma noite só de diversão. Justin teve que fazer um esforço enorme para se lembrar que estavam competindo entre si e que apenas um deles seria feiticeiro no final, senão teria beijado- a ali mesmo, em cima do tapete. Provavelmente fora isso que lhe fez orientá-la a voltar para casa, quando já estava ficando tarde. Estavam tão entrosados, que se não fosse essa questão, com certeza retornariam só no dia seguinte.

Quando chegaram de volta, tiveram de se separar rápido e não fazer barulho, pois Harper e Max já haviam voltado e estavam dormindo a sono fundo. Eles souberam disso assim que pousaram, com o barulho constrangedor dos roncos, que ferrou completamente com qualquer momento fofo de despedida. Mas certamente, Alex e Justin tiveram os melhores sonhos possíveis naquela noite. Como não tinham há muitos anos, desde que seus respectivos problemas pessoais começaram a atazanar suas vidas.

No dia seguinte, Alex mal tomou o café da manhã e já foi correndo falar com o tio, com uma empolgação que não era comum dela, dizendo que havia conseguido aprender a voar e queria mostrar isso para ele, a fim de que acabasse aquele clima ruim entre os dois. A princípio, o homem estranhou, mas ela insistiu tanto que ele acabou cedendo. A garota não iria, depois de tudo que aconteceu, cogitar outra ideia para melhorar a relação com Jerry. Sem falar que Justin lhe inspirava uma confiança muito grande, e por isso ela sabia que esse plano ia dar certo. Assim, Alex não desistiu nem desanimou, mesmo com os resmungos do tio (algo que não era muito comum com a garota, que estourava por qualquer coisa).

Meio preocupado, Jerry pegou o equipamento de proteção, e montou novamente com a sobrinha no tapete.

***

Quando voltaram, nem parecia que haviam passado alguns dias sem se falar direito. Era como se esse tempo nunca tivesse existido. Jerry estava completamente animado e havia recuperado a confiança em Alex e na sua própria capacidade de cuidar dela.

“ Exatamente como Justin previu! Ele é mesmo um cara incrível, além de maravilhoso... hahah”- pensou Alex. — “ Hey, espera! Mas o que estou pensando? Ele é o maior nerd, careta, compete comigo, não posso me deixar envolver com alguém assim. Realmente, nunca daria certo” – Concluiu o raciocínio, com um certo pesar.

Até que pegou um moreno gato piscando para ela do balcão onde naquele dia trabalharia. Alex, ficou um longo momento boiando, tentando se localizar na situação novamente.

— O que você quer dizer com isso? — Foi tudo que conseguiu sair de sua boca no atordoamento.

— Isso o quê?

— Essa piscadinha.

— Eu disse para o meu padrinho que você fez tudo sozinha, sem minha ajuda. — e piscou de novo. Novamente Alex ficou zonza e disse que não entendeu. Justin se ressentiu pensando que ela estava fazendo para irritá-lo ou que não fosse tão inteligente e revirou os olhos.

— Eu também não entendi esse negócio, não. — Falou Jerry.

— Ah, não é nada. — e piscou de novo. O que acontecia era que Justin não sabia mentir, e piscava para se livrar da tensão. Mas ele nunca iria admitir isso. Nem para si mesmo. Era normal fazer aquilo. Não era?

— Ainda não saquei.

— Ah, esquece! — Concluiu frustrado, se retirando dali.