Isso não é Orgulho e Preconceito

Capítulo 7

   Eu estava confusa. Um lado de mim queria fugir para o mais longe que eu poderia ir e fingir que nunca tinha ouvido nem falar da existência da Will, nunca tinha ouvido falar nem de Jane Austen ou de Orgulho e Preconceito. Porém, outro lado de mim queria estar respondendo as mensagens e as ligações de William. Até Lara estava me perturbando com mensagens perguntando o que estava acontecendo. Minha maior sorte é já ter passado em todas as disciplinas da faculdade e estar de férias, assim posso só ir trabalhar e me esconder no resto do tempo. E depois de hoje, me esconder até de Aurie por 15 dias das minhas férias do trabalho. Amo muito minha melhor amiga, mas ela consegue ser insuportável quando o assunto é ficar jogando coisas na minha cara. Coisas essas que eu não quero lidar. A merda de ter uma melhor amiga é que ela te conhece melhor que ninguém e sabe quando algo não está bem. Só que geralmente quando as coisas não estão bem, eu não quero falar sobre isso.

-Eu to vendo que tu tá tentando me evitar, Elizabeth. E também notei que William não aparece por aqui há mais uma semana e que teu celular não para de tocar um minuto. Até Lara me perguntou ontem o que diabos tá acontecendo. O aniversário do Gabriel é daqui duas semanas, o que tu vai fazer quando tiver que ver ele lá? - Aurie tá me olhando com aquela postura típica dela de papo sério: braços cruzados, olhos fixos em mim e boca em uma espécie de biquinha que parece um peixe botia. Ela odeia quando eu falo desse lance que ela faz com a boca haha

-Não to te evitando, só não to nem um pouco afim de conversar sobre esse assunto. Acho ridículo aliás que William tenha envolvido Lara nisso. Ele nunca ouviu falar que a falta de uma resposta já é uma resposta? Significa que não quero falar com ele e ninguém pode me obrigar a fazer isso, parte do motivo de eu não querer ter envolvimento romântico com alguém é porque todo mundo fica fazendo pressão em volta. Se tá tudo bem, perguntam se o casalzinho feliz vai morar juntos, se vão ter filhos e um vira lata caramelo. Se acabou, todo mundo quer saber a porra do porquê. Se eu não quero mais ver a pessoa, eu não quero mais falar dela e não quero que me perguntem sobre isso. Simples. E sobre o aniversário do Gabriel: Eu não quero ir mais. - Desabafei uma missa inteira para Aurora, porque sabia que ela ia ficar me perguntando e me olhando várias vezes daquele jeito até eu finalmente falar o que aconteceu. Ia ficar enchendo o meu saco, que eu nem tenho, para tentar saber sobre e racionalizar toda a situação.

-Pelo o que conheço do comportamento emocional padrão de Elizabeth é que tu transou com ele, inventou uma desculpa e foi embora. Depois parou de responder ele totalmente do nada. Tu tá certa que ninguém pode te cobrar nada e tu também tá certa na parte de não ser obrigada a ficar ou falar com alguém que tu não quer. Porém, tu tá muito errada em ignorar o rapaz sem nem explicar o que aconteceu pra ele. Aposto que se tu tivesse dado um fora de verdade nele, ele não estaria te ligando e perguntando para Lara o que houve. Todos nós temos responsabilidade emocional, Liz. Tu nunca prestou atenção naquela frase do Pequeno Príncipe que diz somos eternamente responsáveis por aquilo que cativamos? Tudo bem que deve ser horrível dar um fora em alguém, mas também acho que todos merecemos um fim apropriado. Tu realmente quer fazer com ele o mesmo que o Arthur fez comigo? Meu caso pode ter sido bem pior, mas eu estive do outro lado e posso dizer que é o pior de tudo é ser deixado no escuro. - Só depois que Aurora terminou de falar, com os olhos vermelhos, que eu me lembrei em como dar ghosting é um assunto sensível para ela.

Aurora me contou pouquíssimas informações sobre a vida dela antes de conhecê-la e principalmente sobre Arthur. Única coisas que consegui pescar é que ela estudava no Anchieta e conhecia Arthur a vida toda. Eles sempre foram "namoradinhos" quando crianças e se apaixonaram de verdade quando tinham 14 anos, porém isso durou muito pouco. Um pouco depois do aniversário de 15 anos de Aurie, o pai dela se matou devidos à dividas altissimas na empresa que ele tinha. A mãe dela teve que vender todos os imóveis e carros que eles tinham para pagar parte das dívidas e por ficarem sem ter onde morar, as duas se mudaram para o apartamento da avó materna de Aurie. Ela teve que largar as aulas de ballet até começar a trabalhar e mudar para uma escola pública, tudo que ela conhecia estava desmoronando. Mas tudo sempre pode piorar. No sábado após o falecimento do pai dela, ela foi em uma festa de um colega mais velho do colégio. Aurie nunca foi de beber, principalmente com 15 anos, mas naquela noite ela bebeu e experimentou tanta coisa diferente que esqueceu completamente do que aconteceu. No outro dia quando acordou, nenhum dos amigos que tinha a vida toda e nem Arthur a respondiam. Ficou sabendo depois que Arthur falava para quem quisesse ouvir que ela era uma vagabunda que desejava nunca ter conhecido. Até hoje ela não sabe o que aconteceu aquela noite, se colocaram algo na bebida dela e nem como ela chegou em casa. Há alguns anos fui com ela no ginecologista para ver se ela ainda continuava virgem. Ficamos um pouco mais tranquilas de saber que o pior não aconteceu.