Clarissa estava deitada sobre uma maca envolta por aparatos complexos feitos de metal. Monitores especiais exibiam ao seu lado gráficos que informavam incontáveis dados sobre sua atividade cerebral, níveis radioativos e eletromagnéticos. Seus padrões normais de pensamentos foram suprimidos. Presa pelos pulsos e tornozelos através de robustas e especiais pulseiras metálicas, a garota era subjugada por braços robóticos que ministravam coquetéis de drogas em sua corrente sanguínea. Seu corpo sacudia-se deitada como um peixe fora d'água. Enquanto gritava, seus olhos brilhavam em um tom violeta incandescente. Após alguns instantes se aquietou. Um líquido branco percorria os tubos que emaranhavam-se entre as engrenagens daquela máquina fria e desprovida de piedade. Em meio aos remédios aplicados, uma grande quantidade de escopolamina, ou mais conhecido pela CIA como o soro da verdade, fazia a arcanista ruiva soltar a língua. Uma forma um tanto mais grosseira que sua técnica de submissão psíquica como a usada no capitão Kentarou Nakazawa. Tal procedimento, entretanto, era marcado pela característica hostilidade do major Daniel Montegrappa.
"Iniciando fase de testes. Nível 03" Dizia a voz computadorizada do sistema robótico que analisava Clarissa.
- Ela já está pronta, Major. - Confirmou um dos cientistas.
Montegrappa assentiu.
Um grupo de quinze membros da equipe de biologia acompanhava cada alteração no quadro metabólico da arcanista pelos monitores. O cilindro de vidro blindado que envolvia o aparato em torno de Clarissa era resistente o bastante para que eles pudessem estudá-la destemidamente. Era uma chance única para eles. Cada resultado dos exames na garota representava um grande avanço tecnológico em diversos níveis.
Clarissa levanta meia pálpebra e seus olhos parecem vagar em direção ao infinito, totalmente involuntários.
Um pequeno som eletrônico anuncia a fala de Daniel sempre que ele pressiona o botão no painel que lhe permite se comunicar com a cobaia.
- Clarissa. Major Daniel Motegrappa falando. Consegue me escutar?
A garota não reage.
- Clarissa. - Insiste o major. - Está escutando?
Um filete de saliva escorre pelo canto da boca da garota enquanto sua cabeça balbucia lentamente.
- Tem certeza de que ela está pronta, doutor? - Pergunta Daniel ao sujeito ao lado.
- Sim, senhor. Acho que só precisamos dar um pequeno estímulo.
- Então faça isso agora mesmo!
Após alguns comandos enviados pelo computador, os braços robóticos aproximam-se do tórax de Clarissa e lhe despejam uma descarga elétrica que a faz se sacudir freneticamente na maca. Incomodados com a cena dantesca, alguns dos cientistas presentes desviam o olhar.
- Basta. - Diz o major. - Vamos tentar mais uma vez.
Ele pressiona novamente o botão de comunicação.
- Clarissa! Consegue me escutar agora?
- A....água. E...eu quero água. Estou com sede. - Responde ela.
O cientista que administrou as drogas na garota suou frio até ver que finalmente ela reagiu.
- Dê-lhe água. - Ordena o major.
Novamente outro conjunto de braços mecânicos se aproxima, dessa vez porém, para saciar a sede da ruiva.
- De onde você veio, Clarissa?
- Atalanis. - Responde ela convicta e de olhos fechados.
- Onde isso fica?
- Atalanis é um conjunto de reinos que fica, com certeza, em outro mundo, muito distante deste. Nada lá se parece com o que tem aqui.
- Como aprendeu a usar sua paranormalidade?
- Isso não é paranormalidade, são poderes arcanos. Algumas pessoas em Atalanis possuem o dom necessário para desenvolver essa habilidade.
- E como sabem quem possui tais dons?
- Simplesmente sabemos. Somente sentimos.
- É capaz de dizer se mais alguém nesta sala possui tal habilidade?
- Ninguém no seu mundo possui. Não existem arcanistas aqui. Vocês nunca vão conseguir fazer o que fazemos.
- Balela! - Retruca o Major. - Não existem magias, poderes arcanos e nem nada disso, Clarissa. Eu já percebo que no seu mundo vocês ainda vivem na idade média brigando a pau e pedras. Já passamos por isso há muito tempo. Você não passa de uma garota com distúrbios paranormais. O que vocês chamam de dom, nós chamamos de energia radioativa, eletricidade, eletromagnetismo, termodinâmica etc e etc. São somente pessoas ignorantes que poetizam a ciência. Mas nada do que você é capaz de fazer nós também não somos. Estamos tratando disso, porém, como uma novidade. Mas hoje está sendo o dia em que irá aprender a não subestimar os "desprovidos do dom mágico de Atalanis".
- Há, há, há, há. - Debocha ela. - Reze para que eu nunca saia daqui, major. Existe uma diferença abissal entre eu e você. Para mim não são mais que formigas que carregam folhas grandes. Ainda posso esmagá-los como insetos. Não importa o que façam, eu sou a Ordem, e mesmo que vivam por mil anos, ainda faltaria muito para alcançar a supremacia de um mestre arcano.
- Então me esmague! - Enfurece-se Daniel. - Esmague-me com toda sua força, garota! Venha com tudo! Estou bem aqui diante de uma deusa ou uma fraude?! Eu não sei quem está tentando enganar com esse discurso falacioso, se a mim ou a si mesma!
Após mais uma dosagem de escopolamina, Montegrappa continua.
- Quantos homens possui em seu exército?
- Nenhum. - responde.
- Como nenhum? O que houve com sua força militar?
- Foram exterminados no fim de uma guerra.
Daniel preocupa-se. Os militares presentes entreolham-se.
- Poderia ela estar falando sobre algum tipo de artefato nuclear? - Questiona o major ao seu subalterno.
- Eu não duvidaria, major. Essas pessoas tem certo controle sobre energias radioativas.
Após voltar a pressionar o botão de comunicação, Daniel torna a questioná-la.
- Como isso aconteceu? Explique.
- Muitos reinos estavam em guerra há muitos anos, porém a nossa Ordem sucumbiu ao final. Éramos o centro das atenções. Mas mesmo a Ordem mais poderosa não pode contra todas de uma vez só. Foi então que meu pai e minha mãe lideraram uma ultima batalha, uma batalha em nosso próprio território. Então...
Após alguns instantes em pausa, Montegrappa insiste.
- Continue!
- ...então Ágata pôs um fim a guerra. Pôs um fim em tudo.
- Como?
- Ela usou um de seus portais. Não sei explicar como ela fez aquilo, mas ela acabou com tudo. Não sobrou ninguém, nem mesmo papai e mamãe. - Resume ela.
- Mais de vocês conseguem abrir esses portais?
- Não.
- Você também não?
- Se eu soubesse, eu não estaria aqui, seu cretino!
O major Daniel solta uma gargalhada farta.
- Mas que coisa, Clarissa. Eu não sei o que significam mil anos para você, mas novamente foi ultrapassada. Porém não só pela sua irmã, Ágata. Mas também por mim. A propósito, ela já está em nossa lista. Iremos fazer uma visitinha à ela na catedral de Campo das Flores em breve.
- O...o que querem dizer com isso? Fui ultrapassada por vocês? De que maneira?
Daniel encerra a conversa, dando-se por satisfeito.
Após saber um pouco sobre o que esperar de Atalanis, o major reúne-se com os militares para criar uma estratégia de reconhecimento para quando estiverem na terra mística de Ágata e Clarissa. Sabendo que não havia mais exército ou guerras, o caminho estava livre agora. Eles estavam quase prontos para iniciar a primeira colonização interdimensional. Restava somente definir a frequência correta para abrir um portal artificial que os levassem direto para Atalanis.
Após recolher sua pasta na mesa de reuniões do quartel o celular de Daniel toca um sinal.
"Email recebido: Caixa de entrada: 'Urgente' - Gen. Jaime Ranor".
A mensagem foi curta e desoladora:
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A Câmara Secreta de Ágata
FantasyIvan é um garoto recém-chegado na pacata cidade de Madeira Negra. Em um passeio particular, dá de cara com uma enorme catedral isolada e abandonada, longe de qualquer outro lugar. Sua curiosidade o leva para os fundos daquele antigo e vazio templ...