-Às vezes acho que você tá dentro da minha cabeça. –Expressou ele, entrando em uma estrada de areia após chegarmos na cidade. Eu sorri e senti minhas bochechas ficando quentes, uma resposta involuntária do meu corpo. –O que significa que você pode ser uma bruxa e eu posso te mandar pra fogueira, não fique tão risonha.
-Eu não tô risonha.... –Acabei rindo sem querer, meu cérebro parecia não responder meus comandos.
-Tudo bem, é bom te ver assim.
-Assim como?
-Você quase não sorri e geralmente desconta a raiva em alguém... –Sua voz foi ficando mais baixa, uma tática para disfarçar o que quer dizer. Dei um tapa de leve no braço dele.
-Isso é uma mentira!! –Eu dizia isso para mim mesma.
Já fazia um tempo em que olhava no espelho e não reconhecia aquela pessoa. Sentia acordar cada dia em um corpo diferente, e realmente depositava toda minha frustração própria nas outras pessoas. Isso me custou amigos, relacionamentos importantes, uma chance de ter uma saúde mental estável, me perdi totalmente. E todos a minha volta, que ainda restaram, fingiam não perceber e não falavam nada, pois sabiam as lutas internas que eu estava enfrentando. Me olhavam com pena e remorso, nunca com verdade. Era quase como se eu fosse invisível, uma pessoa que morreu e foi substituída sem que ninguém notasse.
Exceto Dex. O único a me olhar nos olhos e pedir calma, o único a me enxergar, mesmo invisível, mesmo na escuridão. Em um dia normal, com um simples comentário na aula, talvez um ato desesperado do meu subconsciente pedindo para ser notada, eu pude trazer minha consciência mais um pouco para a realidade.
A gente caminhou mais alguns minutos em silêncio, e acabamos chegando em uma pequena ponte abandonada. Era coberta por um telhado vermelho de madeira, e paredes marrons de madeira envelhecida com pequenas aberturas, como janelas sem vidros. Na entrada, bem em cima, havia uma placa com o nome da cidade esculpida em ouro, e o ano 1918 de criação. Tinha uns trilhos, imagino que antigamente passavam trens aqui, que hoje já não existem mais. E embaixo, corria o rio, incrivelmente tranquilo para um dia chuvoso. Não conheço ninguém que saiba a localização deste lugar.
-Como você achou esse lugar? -Perguntei, me escorando na janela para ver a água passar embaixo de nós.
-Fazendo trilha por aqui. -Dexter se escorou no espaço ao meu lado, e ambos ficamos olhando para baixo. -Gosto de vir aqui de noite, para pensar.
-Está explicado a habilidade em pular o portão.
-É... -Concordou. Rimos olhando ligeiramente um para o outro.
-É realmente bem pacífico aqui. -Expressei, ouvindo o som dos pássaros e da água batendo nas rochas, além das folhas voando das árvores em algum lugar mais distante. Foi uma visão totalmente inesquecível, tanto verde, tanto azul...
-Espero que você possa vir aqui quando estiver nesses seus dias ruins. E se quiser falar sobre, saiba que meus ouvidos estarão abertos.
-Por que você se importa tanto, afinal?
Ele se virou para mim, e ficou parado ao meu lado. Eu fiquei de frente para o mesmo, esperando a resposta.
-Eu...me identifico com você, eu acho...-Suspirou com leveza, colocando a mão nos cabelos e mexendo seu corpo para frente e para trás, como se estivesse com medo de dizer algo errado.
-Bom, muito obrigada então... -Agradeci, deixando uma atmosfera de vergonha no ar, típico de pós momentos fofos. -Você já foi por ali? -Apontei para o lado oposto do qual viemos, foi a primeira coisa que me veio na cabeça junto com um sorriso de canto. -Vamos.
Parti na frente e sai caminhando explorando novos caminhos. Era uma floresta de pinheiros, igual aqueles que usamos no Natal, e as árvores eram grandes ou nanicas, algumas até já cortadas. Também tinham pedras no caminho, que nós ficamos subindo e pulando delas.
Conversamos mais sobre nossas vidas, e descobri que a mãe de Dex trabalha na Interpol, assim como meu pai, e possivelmente os dois se conhecem. Foi meio loucura saber disso, ver o quanto temos em comum por sermos os filhos de pais super ocupados que mal estão em casa. Após conversas e piadinhas, acabamos achando mais um lugar incrível.
-Que lindo!!! -Fiquei fascinada pela parte do lago que encontramos, onde havia uma rocha gigantesca, e a água tranquila.
-Ei, cuidado pra não escorregar.
Dobrei minha calça listrada vermelha, e subi na rocha. O vento batia de forma que respirava e me inovava por dentro, uma experiência eufórica e significante para mim.
-Quando o pessoal e eu éramos menores, costumávamos ir em uma parte grande da montanha, e a gente se atirava lá de cima para cair na água. Eu lembro de ser a primeira, e o Dash sempre ter que empurrar a Emma pra entrar... -Relembrei em voz alta. -Era bem parecido com esse lugar.
-Já pensaram em reviver esse momento?
-Não... nós mudamos.
-E o que tem demais nisso? Vocês ainda podem fazer coisas antigas sendo novas pessoas!
-Vai ser diferente, vai alterar a lembrança que já temos.
-Por que tanto medo em mudar e deixar as coisas pra trás? -Questionou Dexter, se aproximando de mim. -Não importa o quanto você se agarrar ao passado, ele já se foi.
-Por que você tá falando isso? -O encarei nos olhos, de cabeça erguida.
-Maeve.... -Senti sua mão levemente tocar a minha, e eu deixei. Sua outra mão encostou no meu rosto, um toque suave e carinhoso. Eu não conseguia me mover e nem falar nada, enquanto ele se aproximava lentamente de mim, cada vez mais próximo... Conseguia sentir sua respiração se fundindo com a minha, quando o desespero bateu.
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Epifania
Bí ẩn / Giật gânOs adolescentes mais ricos e promissores de Stowe presos na escola, treinando dia após dia para o grande final de temporada. Mas algo acontece, uma noite que é capaz de mudar a vida de todos para sempre... Foi apenas um sonho? Salas de interrogatóri...