Capítulo XXIX

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"Trago-te flores - restos arrancados

da terra que nos viu passar unidos

e ora mortos nos deixa e separados."

Machado de Assis.

Desculpem se houverem erros. Boa leitura.

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》(SeuNome)

De modo algum eu poderia entender o que se passava com aquela mulher que, pouco a pouco, se deixou levar por um choro angustiado, mas silencioso. Sem saber o que dizer, permaneci quieta enquanto a envolvia com meus braços e a sentia soluçar contra o meu corpo. Eu nem sequer podia imaginar ou fazer uma suposição de por que razão ela estava chorando, mas, claramente, para se entregar ao pranto de forma tão repentina, coisa boa não podia ser.

- Chefe, estão... - Ouvi Vicent falar ao entrar sem bater. Camila logo se afastou passando o dorso das mãos contra os olhos. Eu me virei em direção ao rapaz que se calou e mantinha a porta escancarada. - Eu volto depois.

- Senhor Wood, deveria aprender a bater na porta. - Avisei antes que ousasse se retirar. - O que você queria?

- Precisam da senhora na cozinha.

- Okay, estarei lá em alguns minutos.

- Está bem, chefe.

O rapaz saiu vexado por ter invadido a sala, porém, eu não poderia puni-lo por aquilo, pois tudo parecia ser tão novo para ele. Além do mais, aquele rapaz se tornaria, dentre todas as pessoas que me cercavam, aquele em quem eu realmente poderia confiar e pedir ajuda. Se mostrou um bom rapaz com o tempo e digno de estima.

Após a saída de Vicent da sala, pude retornar minha atenção a Camila que ainda permanecia quieta e cabisbaixa em um canto. Por mais que uma hesitação dominasse meu ser interiormente, eu precisava averiguar a que se devia tal estado de tristeza de Camila.

- Hey, pode me dizer o que foi isso? Por que estava chorando? O que está acontecendo? Tem a ver com o Nicholas? Ele fez algo contra você? - Talvez fossem perguntas demais para aquela mente humana ilimitada e cheia de suposições e pensamentos que talvez estivesse a lhe causar certo nervoso ou medo, perguntas que talvez não devessem ser feitas naquele momento a uma pessoa com a mente e coração cheios de angústia.

Em primeiro momento Camila mal conseguia levantar o olhar em minha direção, permanecia olhando para o chão como se não tivesse ouvido nenhuma daquelas perguntas que havia feito há poucos segundos, talvez como se nem percebesse minha presença ali. Contudo, passado esse breve instante em que ela esqueceu de minha existência e esteve focada em seu mundo infinito, ela, com algum receio ou, talvez, pesar, direcionou a cabeça em minha direção e me fitou com tanta intensidade que poderia comparar seu olhar àquele emitido por Medusa para petrificar seus alvos, porque foi exatamente assim que me senti: petrificada, imóvel, incapaz de abrir a boca uma vez mais, de esboçar alguma emoção ou me retirar dali.

- Gostaria de ficar um pouco mais com você, (SeuNome). Mas precisamos trabalhar. Aliás, precisam de você na cozinha. - O tom de voz sério que saiu de sua garganta não condizia em nada com a feição carregada de um sorriso nervoso, os olhos opacos e as sobrancelhas franzidas. Características que para mim denotavam séria negatividade.

Eu me recordaria da expressão em seu rosto pelo restante da minha vida. Jamais poderia esquecê-la, pois a feição que ela tinha permaneceu por muitos dias nas minhas últimas recordações de todas as noites e entre os primeiros pensamentos que tinha todas as manhãs ao acordar e ver Emily ainda adormecida ao meu lado. Eu ainda não descobri como é o outro lado, eu nem ao menos sou capaz de entender o que é a morte ou o que há depois dela, mas sempre soube muito bem o que esperar da morte quando ela me batia na porta, fosse para mim ou para alguém a quem eu estava conectada: um tumultuoso lamento permeado de sussurros, os quais eu não entedia com os ouvidos ou olhos, mas com alguma percepção irracional e inconsciente do coração. Sei que machuca e como uma certa ansiedade chega sorrateira para apertar-nos o peito e dificultar a respiração, vem para tomar à força toda paz e qualquer vestígio de alegria que ainda resta por dentro. Tem alguém que seja imune a isso? Porque eu nunca fui, pois, embora tenha tido controle sobre minhas emoções por tanto tempo, quando passei a ter situações envolvendo Camila, Emily e meu filho, por mais que eu ainda as reprimisse, eu nunca fui vulnerável a essa ansiedade e angústia, sempre foi como se me privassem de ouvir a minha canção favorita pelo resto de minha vida, e então eu a perdia como quando me sentia perdendo cada um deles.

Sete (Camila/You)Onde histórias criam vida. Descubra agora