O Relicário de Heróis de Valamurk - O Levante Contra a Aljava do Destino

Capítulo 05 - Giosep

Ao norte de Abbenhoth fica Ravendor, a cidade com a maior concentração de ebaneses de Valamurk. Mas Ravendor não foi sempre seu lar: suas origens remontam à Era das Conquistas, há mais de oito mil anos, a uma região a sudoeste de Deltrant que hoje corresponde à cidade de Usaq. Mas após a invasão de Deltrant, seus nativos foram escravizados juntamente com os vavoneses – um povo que mais tarde foi extinto.

Além de Usaq, no entanto, havia também uma civilização ebanese vivendo em total isolamento em Gwarot, uma pequena ilha a oeste do continente. Há registros que confirmam que há seis mil anos os habitantes de Gwarot já testavam suas primeiras embarcações. Três mil anos depois suas embarcações atracaram em Slyss, ao norte de Deltrant, na insurreição que libertou cerca de dez mil escravos. Por ser uma ilha pequena, Gwarot não poderia comportar tanta gente, por isso os escravos libertos buscaram refúgio em Abbenhoth e se estabeleceram na região que se tornou Ravendor. Um fato importante a ser lembrado é que nem todos os escravos refugiados eram ebaneses. Por isso, apesar da grande concentração ebanese, Ravendor é também um dos maiores polos de miscigenação étnica de Valamurk.

De acordo com o Código de Fogo, a cada cem anos nasce uma criança escolhida por Ghaldron para representá-lo entre os homens. Esta criança será o(a) Ghalahik: a autoridade máxima do culto a Ghaldron. Há pouco mais de cento e cinquenta anos, Seth Najin, o quarto ghalahik, proibiu o estudo e a prática de alquimia em todo o continente, acusando seus praticantes de se utilizarem de forças malignas. Ainda que a alquimia se trate mais de uma ciência do que de magia, muitos alquimistas foram executados ou presos por conta do medo em que as pessoas haviam sido imbuídas. O único lugar onde o culto a Ghaldron nunca exerceu influência é Gwarot, visto que apenas os próprios nativos conseguem entrar e sair da ilha com vida. Assim, Gwarot se tornou o maior polo de estudos alquímicos de Valamurk. Mesmo tendo uma boa relação com Abbenhoth, os habitantes de Ravendor mantém um eterno senso de gratidão e admiração por Gwarot, e alguns até sonham em ir pra lá para estudar alquimia.

Giosep era órfão e sempre viveu na rua. Aos oito anos de idade decidiu que seria alquimista, quando viu uma quimera pela primeira vez. Ouviu de outras crianças que os alquimistas sempre viajavam pelo mundo, e que às vezes escolhiam jovens para torná-los seus aprendizes, quase sempre preferindo crianças órfãs. Desde então Giosep passou a se dedicar unicamente a perseguir seu sonho.

Depois de três anos sem conseguir ao menos se aproximar de qualquer alquimista, a resposta às suas preces veio até ele por conta própria: Uma imensa quimera negra em forma de leão, com asas negras e azuladas nas pontas. Giosep ficou tão maravilhado que nem percebeu que havia sido encurralado em um beco.

-Partirei ao amanhecer. – disse o homem montado sobre a criatura, e jogou-lhe uma pequena caixa de madeira ricamente ornamentada. – Dentro desta caixa há um bilhete com o endereço de onde estou alojado. Se até o amanhecer você conseguir me encontrar, eu o farei meu aprendiz. – O grifo abriu as asas, se preparando para alçar voo – E não precisa trazer nada. – E partiu.

Giosep olhou incrédulo para a caixa: aquela era sua passagem para Gwarot. Imediatamente começou a examinar a caixa, que parecia um complexo quebra-cabeças, cheio de relevos que se moviam e encaixavam uns nos outros. Quando uma de suas elevações deslizava, outras cinco deslizavam simultaneamente nas outras faces. À medida que o Ghal ia se descendo, o desespero ia tomando conta do garoto, que já se via exausto e incapaz de resolver aquele enigma.

Somente quando Illar já estava alta no céu foi que um detalhe lhe passou pela cabeça: o alquimista lhe dissera que ele não precisaria levar nada. A princípio Giosep achou que ele se referia a roupas e pertences pessoais, mas, àquela altura, ele se permitiu concluir que a caixa também não precisaria ser levada.