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O CAOS

O poder de dar ordens no dia do aniversário é um costume entre os jovens da cidade. É como se ele fosse o rei do seu dia. Pode ser um jogo perigoso dependendo de quem é o aniversariante.

- Vamos curtir a noite até o fim, querido! -declara Emy, erguendo sua bebida.

O garoto volta para o seu baixo, rindo alto.

- Esse é o Iuri e ele é o asiático mais lindo que você já viu. - Emily fala baixinho para que apenas Júlia e eu tenhamos o alcance de escutá-la.

- Tenho certeza que já me disse isso antes.

Emily sobe e desce os ombros para mim antes de dar mais um gole em sua bebida agora azul.

- Eles normalmente fazem covers - Júlia começa a dizer ao meu lado -, mas tem composições originais também e a maioria delas são do meu irmão.

- É uma das poucas coisas que ela se orgulha de dizer sobre o irmão. - Emily cochicha ao meu lado. - Não precisa se sentir aborrecida. Prometo que ela não vai falar sobre ele a noite toda.

- Bem, como também queremos aproveitar a festa, - Isak diz ao microfone e dá um daqueles sorrisos que fazem meu sangue ferver. Seus fios de cabelo sobre a testa estão úmidos e seus lábios parecem cativantes demais enquanto continua falando - vamos cantar uma última música. De nossa autoria. Espero que gostem.

Iuri traça algumas cordas do baixo, Isak outras da guitarra, porém é Kenedy quem inicia a melodia com o teclado elétrico. O som está em um tom semelhante ao rock de garagem, mas também consegue ser sensível e lento. É então que ele canta:

- Sou a sombra de onde nunca há luz e não há nada que me seduz. Mas você pode tentar. Tente um sorriso, tente uma lágrima. Talvez me faça importar. Me permita fazer seu sangue ferver por mim enquanto te confesso um segredo - O sussurro rouco que se segue faz-me sentir frio de repente - querida, eu sou o caos! - A pequena pausa é preenchida pela bateria atingida com batidas violentas.

Não vou ligar que ele tem o estilo dos meus rockstars favoritos e uma guitarra idêntica à de Tomo Milicevic! Não, não mesmo. A voz...

Esquece a merda da voz, Ayla!

- Mas, hey, olhe para mim e veja se eu pareço ao menos infeliz. Hey! - Todos da banda dão ênfase.

- Me encontre na linha do horizonte, mas cuidado para não cair...

Isso é ele, o babaca, eu sei e está mais que claro em cada palavra que canta. E é loucura, mas eu sinto a dor que ele canta. Por mais que não seja melancólico, eu simplesmente sinto.

- Quando você chorar, eu não beijarei suas lágrimas. Quando desmoronar, meus cacos não poderão recolher os teus, mas quando me beijar, querida, se prepare para queimar!

Bad boys são bons apenas na fantasia, não são atraentes no mundo real... Repito meu mantra.

Jamais admitirei, não em voz alta, o que sua música faz comigo. E, afinal, Isak é um babaca arrogante e ridículo. Mas, ainda assim, sua música parece se encaixar em mim.

Isso tudo é culpa do meu sistema fã de carteirinha de artistas com caráter duvidoso, voz suave com o tom certo de grave, tocante e viciante, que chamo de síndrome da garota platonicamente apaixonada por Jared Leto. Claro que é isso!

Eu me conheço, sei que estou instigada, talvez até entusiasmada para conhecer o caos que é esse garoto e provar para mim mesma que sou capaz de mudar sua teoria, de deixa-lo de joelhos. O que só me deixa mais aborrecida! Pois não vivo a fantasia dos clichês onde existe o Feliz Para Todo o Sempre. Na minha realidade, quando garotas como eu atraem-se pelo popular cobiçado e mesquinho, a prima dele te joga na piscina em uma festa, que era para ser a sua festa de quinze anos - aquela maldita data que toda garota sonha com cada detalhe desde muito nova - e o garoto dos seus sonhos te faz ter pesadelos, te zoa por não ser perfeita, sem uma cintura fina e uma boa bunda. Garotos assim fazem da sua vida um inferno e eu já mergulhei nele de cabeça para agora tomar cuidado.

Isak e eu não nos demos bem desde o primeiro momento e isso é um fato. Porém, os olhares que me deu desde que cheguei na boate não foram gelados e sua expressão não chega a ser de zombaria ou arrogância como foram nas poucas vezes que nos vimos ao decorrer da semana.

A voz dele... Talvez seja culpa dela. Ela faz coisas comigo que me assustam, como as batidas descompassadas no meu peito. Nas partes mais graves, sua voz é arrastada, como se suas palavras estivessem sendo tecidas sobre minha pele.

As sensações são de fato tentadoras e sua voz é perfeita... Todavia, ele não e é nisso que foco. Não posso vacilar, não quando ainda estou me recuperando da pior fase da minha vida.

Quando a música acaba, eu me encontro notoriamente abalada, até que sinto algo frio e úmido na minha saia. Está molhada.

- Oh, desculpe - pede Anny, na minha frente. Seus olhos não parecem arrependidos, nem seu sorriso. - Talvez isso complique seus planos de levantá-la e foder como uma vadia está noite.

- Talvez não - respondo, simplesmente.

- Acho que estraguei isso - diz, colocando seus dedos sobre o tecido da saia.

- Você acha?

- Acho. - Venenosa!

- Anny, acho que aquelas suas amigas estão te chamando - avisa Júlia.

- Bem, é só bebida. - Forço um sorriso. - Curta sua festa, vadia.

- Ah, eu vou sim. Talvez você deva ir embora. Molhada assim vai pegar um resfriado.

- Tão preocupada - resmungo, já de saco cheio.

- Agora vou curtir minha noite. Boa sorte com isso aí. - Sai jogando seu cabelo sobre o ombro.

- Vai é pro inferno, isso sim! - grita Emily, já alta pela quarta bebida.

Assisto enquanto a garota se aproxima mais do palco, balançando seus quadris e os cabelos em ondas.

Você é uma garota legal, Ayla. - Emily diz ao meu lado. - Outra pessoa não lidaria tão bem com o jeito que Anny vem te tratando. Eu não sei o que há com ela. - Dá mais um gole na sua bebida. - Essa merda é tão errada.

- Eu não acho que estou tão bem assim. - Minha probabilidade de cometer um crime agora diz exatamente isso.

- Ei, confia, eu sei o que falo. Você está, sim, indo muito bem. - Emily parece sincera. De certa forma, até demais, como se soubesse mesmo as piores formas de reagir a situações ruins. O sorriso parecendo falso ao ser comparado com a profundidade momentânea que seus olhos acabaram de ganhar delatam isso.

E me sinto triste ao notar, porque, por mais que nossa amizade seja recente, gostaria que Emily jamais tivesse sofrido, nem Júlia, mas isso é estúpido, certo? Afinal, eu sei bastante sobre como o mundo pode ferir.

Sorrio para Emily, de um jeito que espero ter sido gentil e não penoso.

- Vou ver se encontro algo para limpar isto.

Minhas amigas concordam e eu me afasto do palco, buscando por guardanapos ou algo do tipo.

Eu não vou embora de jeito nenhum. Vou ficar a noite toda, são ordens do aniversariante, e agora vou obedecer com muito mais vontade do que já estava.

Encontro lenços sob os pratos de uma mesa e limpo minha roupa o máximo que posso, mas ainda está úmida. Bem, não é como se pudesse reverter isso.

Sinto um corpo muito perto de mim e me viro na intenção de descontar o meu estresse no idiota que acha que pode simplesmente chegar na garota que quiser desse jeito, mas as palavras não saem. Estou surpresa por ser logo ele. Como se em consequência do meu consciente perceber sua presença tão perto, sinto o calor do seu corpo emanar para o meu.

- Ora, ora... Temos uma destruidora de decorações entre nós - caçoa, mas sua voz fica mais rouca quando desce o tom e prossegue: - Não me diz que vai embora tão cedo, - Seus olhos diretamente nos meus - por favor.

Esᴘᴇʀᴏ ǫᴜᴇ ᴛᴇɴʜᴀᴍ ɢᴏsᴛᴀᴅᴏ! Nᴀ̃ᴏ ᴇsǫᴜᴇᴄ̧ᴀᴍ sᴇᴜ ᴠᴏᴛᴏ, ᴘᴏʀ ғᴀᴠᴏʀ!

As mil melodias que cantei por você [Em Atualização]Onde histórias criam vida. Descubra agora