Capítulo 9 - Criatura

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Nova York, Sede da Organização, Localização desconhecida. Duas e cinco da manhã.


Eles me dizem o que fazer. E ficam repetindo. De novo e de novo.

Olho para baixo e minhas mãos estão vermelhas. Estão queimadas. A dor não me incomoda, na verdade me faz sentir vivo e invencível. Aprendi que o fogo não é meu inimigo. Cada dia é como um novo começo: o poder invade minhas veias, sobe para o cérebro e me transforma. Renasce.

Eles continuam dizendo: ninguém é mais poderoso que você.

Será que isso é possível?

Alguns testes atrás descobriram que tenho uma falha. Não me disseram o que é. Na verdade, sussurravam uns com os outros que eu não devia saber de nada. Que meus progressos não deveriam ser interrompidos e que não devo ser distraído. Eu sou como seu Deus. Eles me idolatram. Me temem. Precisam de mim.

Alguém entra na sala. É uma das minhas enfermeiras. Sua pele cintila com a luz fluorescente e hoje seus cabelos estão trançados, firmemente. A prancheta que aperta contra o peito está cheia de anotações sobre mim. Eu sei. Ela não me deixou ver, mas eu sei. Antes de me espetar com mais uma agulha, me dá um sorriso leve.

–Como está se sentindo hoje?

–Melhor. – Respondo sem hesitar. – Não estou sentindo mais dor.

Ela concorda com a cabeça e anota na folha de papel.

–Estamos trabalhando para que isso não aconteça novamente. Mas por enquanto vamos dar uma pausa dos seus treinamentos.

Dá pra perceber que ela se sente desconfortável com o cargo. De cuidar de mim. A criatura. E de saber que faço o que faço. Agora estão querendo parar meu treinamento. Mas nada do que eles dizem me importa muito. No fundo, nós dois sabemos que eles não podem me controlar. E isso os assusta. Mas não a mim. A sensação de dominação é tão confortante que quase parece uma parte do meu ser que nunca foi descoberta antes, mas ansiava para triunfar.

Depois que ela se vai me levanto devagar. Me aproximo da porta que dá para a outra sala quase sentindo um extremo êxtase só de saber que vou atravessá-la. Assim que se abre o vejo lá, no chão, encolhido e adormecido. Sua pele está comendo a ficar verde pela falta de comida. Seus braços estão manchados de cores diferentes como um arco-íris de dor. E o cabelo que antes era abundante e brilhoso agora está opaco e caindo.

Mas devo admitir: a sua perseverança me alimenta. Me motiva a continuar porque sei que no fundo ninguém consegue ir até o fim. Eu passei por isso. Ninguém.

Assim que o fecho comigo na sala ele desperta. Primeiro fica assustado. Depois tenta utilizar seus truques em mim. Mal sabe ele que sou maior que qualquer um. Mais forte que qualquer um. Sou invencível. Implacável. E seus esforços... inúteis.

–Está pronto para falar? – lhe pergunto.

Por mais que esteja lutando com tudo que consegue, seus olhos vermelhos estão cheios de água e me olham com uma súplica. Que implora por sua vida. Que sabe o que está por vir caso não comece a contar os planos dos Guardiões.

Lhe dou mais alguns minutos. Até que desiste e olha para o outro lado, chorando.

–Como quiser, Abel. 

O Quinto ElementoOnde histórias criam vida. Descubra agora