4: Godofredo e as Bolotas Amarelas

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O ratinho vagou por dias em meio ao frio e imundície das ruas, até encontrar uma casa que lhe pareceu muito atrativa

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O ratinho vagou por dias em meio ao frio e imundície das ruas, até encontrar uma casa que lhe pareceu muito atrativa. Penetrou nela através de uma falha escondida na fundação e, para a sua sorte, foi parar direto na cozinha.

A maioria das pessoas discordaria se lhe dissessem que ratos podem sorrir, mas ali, depois de incríveis técnicas de escalada em panos de prato e gavetas abertas que permitiram Godofredo chegar até o balcão, qualquer um que passasse poderia comprovar que aquele roedor ardiloso, de fato, o fez.  Mas ninguém passou, e Godofredo chegou, sem dificuldades, até um prato repleto de bolotas amarelas que se pareciam com filhotes de sol e emanavam um cheiro quente de frango e delícia frita.

Ele ficou fascinado. Suas minúsculas e estreitas orbes escuras transbordaram gula, enquanto tentava se equilibrar nas patas recheadas de garras que não lhe davam nem um pouco de aderência contra o mármore escorregadio. As bolinhas estavam tão perto, brilhando em sua perfeição fumegante...

Até que ele escorregou.

Seu corpo pequeno foi arremessado contra o chão, no mesmo instante que passos ecoaram no cômodo, anunciando a presença de alguém. O rato disparou para debaixo do armário e encolheu-se numa bola trêmula de pelos acinzentados, observando os contornos de dois pés humanos – muito bem cuidado, diga-se de passagem – estacionarem a poucos centímetros dele.

– Ei! – ouviu uma voz sibilar e quase saltou de susto.

Olhou em todas as direções, até suas orbes se cruzarem com as de um igual. A pequena roedora, que só não era idêntica a Godofredo pelo tom mais escuro da pelagem, surgiu da penumbra, encarando nosso ratinho com uma curiosidade indescritível.

– Você não é daqui, não é? – a estranha questionou, seu minúsculo focinho rosado tremelicando no ar, como quem fareja.

— Não. – Godofredo respondeu, meio receoso. – Quem é você?

Uma barata tinha lhe dito uma vez para não confiar em nada além dos próprios bigodes. Ele, julgando a Sra. Barata um exemplo de sabedoria pela sua longevidade e resistência – poderia sobreviver a um ataque nuclear, ele tinha ouvido – sempre seguiu a risca essas palavras e nunca duvidou delas.

– Eu sou a comandante de todos os ratos que vivem nessa casa, assim como meu pai foi e a rata que veio antes dele. – a estranha respondeu, em tom dramático. – Estamos trabalhando em uma operação de roubo de comida de aniversário. Quer fazer parte, irmão Rato?

Godofredo sentiu seu estômago dar pulos de expectativa e fome.

– Comida? – arregalou os olhinhos pidões, recebendo em troca um balançar positivo de orelhas da roedora. – Quanto?

– Tudo o que você quiser. Até as que estava tentando pegar agora mesmo.

Quando se lembrou do cheiro delicioso dos filhotes de sol, não pôde fazer outra coisa além de aceitar. Sua boca desejava provar nem que fosse uma ínfima migalha daquele paraíso culinário humano.

Então, a rata mais experiente o conduziu por caminhos escondidos da casa, entre correrias incansáveis por baixo de móveis e pernas de humanos distraídos, até mergulhar em um buraco pequeno na parede atrás do sofá. Godofredo ficou receoso, mas pensar nas suas amadas bolotas deu a determinação que o pequeno rato precisava para enfiar-se naquele canto desconhecido.

Escalaram a parede e andaram com cuidado por cima do encanamento do telhado, para que suas presenças não fossem notadas. A roedora, que nunca tinha ganhado um nome, disse-lhe que toda cautela era necessária, pois da última fez que um desavisado fizera ruídos, os humanos colocaram os bastões verdes tão temidos por ratos de todas as espécies e muitos dos seus companheiros morreram. Godofredo nunca tinha visto os tais bastões, mas lhe foi explicado que eram perigossímos, porque pareciam com algum tipo de doce muito gostoso, mas quando um irmão rato dava algumas dentadas, caía morto. Mas que sobreviviam por mais tempo para contar a história, diziam que era a coisa mais deliciosa que seus dentes já tinham mastigado e, embora a morte os esperasse, toda a vida tinha valido a pena, somente por terem provado aquela delícia.

Godofredo ficou curioso, mas jurou para si mesmo que os filhotes de sol deveriam ser ainda melhores – e provavelmente não eram tóxicos, já que a garota que chegara na cozinha ia comê-los.

Forçaram as quatro patinhas sobre a tubulação por um tempo, até que mergulharam numa última fresta e, pela visão do pequeno amontoado de ratos de todas as cores e tamanhos que preenchiam o forro da casa de conversas baixas e discretas, Godofredo foi abraçado pela certeza que tinha, finalmente, chegado onde sempre teve que estar.

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Capítulo curtinho do nosso rato, ashuashua.

E aí, o que acharam?

Curiosidade nem tão curiosa assim: Eu escrevia os capítulos do Godofredo rindo a cada parágrafo e pensando a que profundidade um ser humano tem que chegar do fundo do poço pra escrever essas coisas.

Enfim...

Beijos de nuvem pruceis! Até a próxima postagem <3

Ismália, Afonso e o Rato Devorador de CoxinhasOnde histórias criam vida. Descubra agora