Novos na Cidade pt: 02

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Adormeci com muita dificuldade, chorei bastante, mas me consolei quando meu cãozinho deitou ao meu lado e adormeceu nos meus braços, não consigo ficar infeliz com ele ao meu lado, sinto como se ele fosse uma parte do meu pai que ainda não partiu e ficou para me proteger, eu o amo tanto que faria de tudo por ele. Meu pai contava para mim a história de um homem que desceu até um poço cheio de espinhos para salvar seu cãozinho, que estava preso no meio dos arbustos, ele lutou e lutou contra todos os galhos espinhosos até chegar até o seu animalzinho, mas no caminho ele acabou cegado pelos espinhos e ficou preso junto ao cachorro, o animal então deitou ao lado do seu dono e esperou até que a ajuda viesse, mas as pessoas do vilarejo demoraram para descobrir o desaparecimento dos dois e quando finalmente os encontraram, eles já estavam mortos, mas seus corpos ainda estavam em um abraço caloroso, depois do ocorrido as pessoas do vilarejo decidiram criar uma estátua do homem e do cachorro. A história do dono com seu cãozinho, me faz pensar nas coisas que eu seria capaz pelo meu Bob.

Me sinto mal em deixar o Bob sozinho aqui, mas preciso ir até o Rio, Alexya está me esperando e acho que nadar um pouco vai ser um ótimo exercício. Deixei uma porção de ração para Bob e um pouco de água, me parte o coração ver ele com suas orelhas baixas ao me ver sair pela porta, falei um "Adeus bobizinho!" Antes de sair e ele já me olhou triste. Caminhei pelas ruas de Macuxi por alguns minutos e logo notei o olhar das pessoas, porém hoje é um dia feliz, o sol reina no céu e já vejo Alexya na porteira perto da serraria. A serraria é realmente gigante e bela, já posso escutar o som de serras e de madeira partindo e o cheiro é muito bom.

- Bom dia! Acho que hoje não poderemos nadar no rio - Disse Alexya de bochechas rosadas

- Por que? O sol tá tão quente e a água parece ótima.

- A serraria vai despejar alguns resíduos de madeira e não querem ninguém na água.

- E vamos fazer o que?

- Vamos para o lago. - Disse um garoto alto que surgiu atrás de mim.

- Oi Kevin. Acho que o lago não é uma boa. - Disse Alexya

- Por que!? A água tá bem quentinha Lexy e eu ainda trouxe o Matias e o Cameron.

- Tá bem. Olha esse é o Luca e Luca esses são Kevin, Matias e Cameron.

- Muito prazer! - Disse eu.

- O prazer é nosso! Vem garoto, você vai adorar o lago. - Disse Kevin

E lá estava eu, caminhando em direção ao lago com desconhecidos, entrando em caminhos pela pequena cidade que eu nunca entraria. Passamos por uma porteira perto da casa de Kevin que levava até a mata fechada, as plantas causavam coceira e havia muita umidade no ar, assumo que fui picado por diversos insetos até chegar naquele lago, porém valeu a pena o sacrifício. Um lago muito grande nos aguardava no fim como o esperado, havia um lugar com pedras grandes onde os meninos colocaram suas camisas antes de pular na água e também foi nas pedras onde Alexya se manteve quieta se bronzeando, enquanto isso eu ainda me tremia de nervosismo, tirei minha camisa depois de muito tempo, mas fiquei perto de Alexya na maior parte do passeio.

- Ei Luca. Vem pra água! - Gritava Kevin na água

- Não precisa ir se não quiser - Disse Alexya - Pode ficar aqui me fazendo companhia

- Não quero que me chamem de covarde. Eu vou! - Falei correndo para a água

- Urruu! Vem Luca se não souber nadar, eu ti ensino! - Disse Kevin.

Kevin era o típico garoto alto e forte que todas as meninas querem, ele gostava de mostrar o quão bem feito de corpo ele era, não tinha muita personalidade, mas era o clichê dos filmes americanas que as garotas de Macuxi desejavam, mas nos momentos em que passei com ele naquele lago, ele acabou mostrando uma afetividade muito grande com seus amigos Matias e Cameron, eles demonstravam ser tão próximos a ponto de dizer "Eu te amo", sempre se abraçando na água e brincando de dar saltos para trás com a ajuda um do outro.

- Vamos brincar de briga de galo? - Indagou Matias

- Vamos! Vem Luca eu vou fazer par com você. - Disse Kevin - Me colocando nas suas costas.

- Kevin eu sempre faço dupla contigo! - Disse Cameron

- Mas hoje eu vou fazer com o novato ele precisa de alguém forte pra proteger ele! VAMOS GAROTOS! - Gritou Kevin.

Começamos a derrubar uns aos outros, no começo foi tudo divertido, mas não demorou muito para os garotos mostrarem toda a raiva que estavam escondendo de mim, começamos a brincadeira e na vez que me derrubaram, Cameron e Matias se juntaram para me afogar no lago, enquanto Kevin em um momento de descontração achou que tudo aquilo não passava de uma brincadeira e começou a me puxar pra baixo e a me afundar. Enquanto eu agonizava podia ouvir os gritos de Alexya, momentos depois eu acabei desacordado.

- O QUE VOCÊS TÃO FAZENDO SEUS MERDAS!?

- Estamos brincando Alexya, deixa de ser chata - Disse Matias

Acordei com o sol forte no meu rosto e a primeira pessoa que vi era Kevin na minha frente, ele afirmou ter feito os primeiros socorros em mim. Perguntei o que aconteceu e eles me contaram que sentiram meu corpo ficar leve e acabaram se desesperando, Kevin ficou furioso com Matias e Cameron e me levou até a areia, lá ele fez de tudo para tirar a água dos meus pulmões. Alexya ficou furiosa com todos, ela não podia acreditar na merda que eles haviam feito e eu concordei com ela, não importa se Kevin me salvou ou se ele foi legal até agora, todos participaram da brincadeira de mal gosto e a única que tentou impedir foi Alexya. Decidi acabar com a brincadeira o mais rápido possível e voltei para casa com minha nova amiga que não parava de me pedir desculpas pelo ocorrido.

Chegando em casa eu me deparei com Bob deitado na frente da porta me esperando, ele ficou tão animado ao me ver que eu acabei esquecendo o quão encharcado eu estava e me deitei com ele no chão por alguns minutos, antes de ir tomar um banho quente. No banho eu não pude evitar pensar no que aconteceria se minha mãe descobrisse o que aconteceu, ela iria pirar e talvez me batesse, não quero que ela saiba disso de jeito nenhum. Anoiteceu rapidamente depois que eu cheguei em casa, dessa vez ainda eram 14:00 horas e a noite já se instalava e com a noite veio minha mãe, ela se aproximou de mim na sala em silêncio e logo me pediu desculpas pelo dia anterior, mas não é a primeira vez que ela faz isso e eu tenho medo que ela beba novamente, então decidi ficar com ela na sala mesmo que sem falar nada

Não vi a hora passar e só descobri o quão tarde estava quando ouvi os sinos da grande igreja católica, corri para ver os fiéis saindo de suas casas segurando velas, caminhavam e conversavam normalmente, podia-se ouvir risos e vozes abafadas ao longe, logo perdi eles de vista, também não os seguiria até a igreja, não gosto de missas.

Sonhos ConturbadosOnde histórias criam vida. Descubra agora