A velha terrível vida recebe o filho pródigo de braços abertos
Era bom voltar, secretamente.
Quem poderia imaginar que Hua Cheng, famigerado guitarrista da banda considerada "maldita" pela crítica, abreviada pelos fãs de 4GC'S, voltaria ao seu antigo bairro em que ele viveu na época que não era nada.
Os mais supersticiosos diziam que somente o nome da banda era amaldiçoado por carregar o número quatro, associado à morte e a má sorte na cultura asiática.
Mas, essa era a graça do estigma.
O gato preto também devia rir das pessoas estúpidas que o evitavam, era uma sorte para o gato que ele fosse temido por um detalhe tão ridículo.
Hua Cheng pensava o mesmo, sorte do gato, sorte a dele também.
O pouco da sua família que restara não morava mais na cidade, mas assim que ele conseguiu um bom dinheiro trabalhando como músico, ele comprou a antiga casa em que sua pequena família tinha morado, inclusive a garagem que ele tinha transformado em ateliê mesmo no tempo de escola.
Sua mãe nunca havia tido grana para um carro por gastar tudo com bebidas, então ele tomou posse da garagem sem mesmo pedir.
Fazia tanto tempo... Entrar e encontrar tudo como tinha deixado, era terrivelmente nostálgico.
Mas, claro que essa antiga casa não tinha ficado abandonada em sua ausência.
Finalmente, em seu retorno, assim que entrou pela porta dos fundos, encontrou Yin Yu que já o esperava na cozinha estilo americano.
Acontece que Yin Yu não tinha dado muita sorte após terminar os estudos, era um aluno tão miseravelmente medíocre que não conseguia ser bem sucedido em coisa alguma, por mais que tentasse e bem... Como ele tentou!
Até que se tornou uma espécie de ajudante pessoal de Hua Cheng.
Por vários meses falaram-se apenas por telefone e chamado de vídeo, assim que Yin Yu viu seu chefe, ele o cumprimentou com uma mesura educada e respeitosa.
- Espero que não tenha sido seguido como daquela vez, meu senhor. - Yin Yu disse assim que endireitou sua postura.
- Ora, se eu tiver sido... Não hesite em soltar os cachorros. - Hua Cheng sorriu acintoso. - Fez a pesquisa que eu pedi?
- Devidamente... Mas, devo dizer que não foi fácil localizar seu meio irmão. - Yin Yu replicou entregando-lhe um envelope pardo tamanho ofício.
Hua Cheng estreitou o olhar, ou ao menos o olho que tinha. No lugar de seu olho direito havia um tapa olho. Mas, suas sobrancelhas eram finas e arqueadas, às vezes tendo um efeito bastante intimidador.
Fechando seu semblante, Hua Cheng segurou o envelope entre os dedos, as mãos enluvadas em couro negro, os dedos bastante brancos a mostra. Preferindo espreitar seu conteúdo do envelope a perguntar os detalhes desagradáveis para Yin Yu.
- Isso é tudo por agora, por hora estarei no ateliê... Bom trabalho, Yin Yu.
Era a deixa para Yin Yu ficar a vontade na casa, afinal era ele quem cuidava do imóvel e Hua Cheng foi até o ateliê, não era preciso passar por fora, após uma pequena reforma, o que era antes a garagem, tornou-se um cômodo espaçoso que fazia parede e meia com o restante da casa.
Hua Cheng passou pela porta que tinha um "Aviso! Perigo nuclear" grudado na madeira e se fechou no ateliê.
De cara ele não acendeu todas as luzes, apenas a de um abajur de bambu, como se tudo a princípio precisasse ficar oculto até de seu olhar, havia muitas obras e esculturas cobertas, ou embaladas em plástico bolha, mas uma parte podia ser vista... Ele não queria olhar para este passado agora.
Então, ele abriu o envelope e primeiro tirou as informações sobre sua mãe e seu meio irmão mais novo.
A princípio, assim que começou a fazer dinheiro com a carreira musical, tentou fazer um acordo com sua mãe, se ela concordasse parar de beber e frequentar reuniões do A.A, ele daria uma ajuda financeira para que morasse na outra cidade com seu irmão caçula.
Assim que começou a ler o relatório, encontrar as fotos e fatos, seus dedos amassaram as beiras do papel.
Suas costas bateram tensas contra a parede, seu pensamento reverberando em ironia e raiva cortante:
"Sua velha estúpida... Eu só pedi uma coisa, só uma maldita condição!"
Aparentemente, tudo tinha ido pelo bueiro abaixo.
Além da sua mãe estar gastando toda ajuda financeira com vícios, E-Ming ainda tinha ido parar num reformatório.
E tudo que aquela "velha estúpida" precisava fazer além de manter a sobriedade, era manter E-Ming na escola.
Pelo o que constava, E-Ming tinha ficado seis meses num reformatório! Seis meses!
E justo nesse período quando falara com sua mãe por telefone na correria entre uma turnê e outra, ela teve coragem de dizer que tudo estava bem!
Enquanto ela continuava em outra cidade, E-Ming tinha fugido de volta para a cidade que moravam, isso até deixaria Hua Cheng feliz... Se E-Ming não estivesse metido com uma gangue.
Hua Cheng era só escuridão quando deixou os papeis caírem sobre o móvel ao seu lado.
Aquela "velha estúpida" teria uma surpresa bem desagradável e Hua Cheng sorriu um meio sorriso psicótico na penumbra.
Ela que esquecesse a ajuda financeira, que vendesse o próprio corpo para bancar seus vícios.
Pouco importava.
Seu foco estaria em E-Ming.
Contudo, respirando fundo, ele retirou o restante da papelada do envelope pardo e leu compenetrado sob a luz branca do abajur.
As informações dessa vez nada tinham a ver com sua família.
Eram sobre a falência de uma certa floricultura, uma das mais famosas da cidade a alguns anos atrás.
Podia imaginar o que poderia ter levado o negócio a decretar falência... Mas, ainda não fazia sentido.
Ele conhecia a família que geria a floricultura Xian Le e o mais importante, ele conhecia o único herdeiro dos negócios da família.
Hua Cheng estava se culpando cada vez mais por ficar tanto tempo fora, tanto tempo inevitavelmente alheio ao que acontecia enquanto estava viajando com a banda pela Europa.
Haveria uma esperança? Ele seria perdoado por si mesmo?
Porque a pessoa que gostava, nem devia lembrar que ele existia... Como alguém que nem se lembrava dele poderia perdoa-lo?
Nas últimas páginas descobriu que o único herdeiro da falida floricultura estava trabalhando como professor numa escola primária.
Foi então que Hua Cheng inflou os pulmões de ar e coragem e acendeu as luzes.
Refletores banharam o ateliê com sua luminescência e Hua Cheng encarou algumas telas que havia pintado quando ainda estava na escola... Ele olhou longamente.
Todas elas tinham o mesmo rosto... Da pessoa que ele gostava imensamente.
O único amor platônico que ele fazia questão de guardar.
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Starlight ☆ | HOB [Modern Au]
Fanfiction"Oh luz das estrelas, não chore Nós vamos fazer isso direito antes de amanhã Nós vamos encontrar um lugar onde nós pertencemos Onde nós pertencemos Você vai ver Assim como as montanhas caem e viram pó Há uma coisa que não vai mudar Eu acredito que h...