CURSED - NIMULOT

PARTE SEIS - A FÉ E A DÍVIDA

I Could be Your King - Katherine Langford

Monge Choroso
_ Alta madrugada, Jesus dirigiu-se a eles, andando sobre o mar. Quando o viram andando sobre o mar, ficaram aterrorizados e disseram: “É um fantasma!” E gritaram de medo. _ Padre Carden narrava. _ Mas Jesus imediatamente lhes disse: “Coragem! Sou eu. Não tenham medo!”. “Senhor”, disse Pedro, “se és tu, manda-me ir ao teu encontro por sobre as águas”. _ sussurro a frase junto a ele e em resposta ele esboça um leve sorriso. A lâmina da espada que carrego corta o ar liberando o som familiar que guia meus movimentos como música. _“Venha”, respondeu ele. Então Pedro saiu do barco, andou sobre as águas e foi na direção de Jesus. Mas, quando reparou no vento, ficou com medo e, começando a afundar, gritou: “Senhor, salva-me!” _ giro em torno de mim mesmo e a capa que estou usando, muito pesada e maior que meu corpo, me atrapalha fazendo com que caia com tudo no chão remarcando hematomas adquiridos nos dias anteriores. _ Imediatamente Jesus estendeu a mão e o segurou. E disse: “Homem de pequena fé, por que você duvidou?” _ Carden me estende a mão, me ajudando a levantar. _ Quando entraram no barco, o vento cessou. Então os que estavam no barco o adoraram, dizendo: “Verdadeiramente tu és o Filho de Deus”. _ ele faz uma pausa olhando em meus olhos. _ Sabe o que isso significa, meu filho? _ sua voz grossa e autoritária fazia meu estômago revirar e me causava a sensação de frio.

_ Que é preciso ter fé? _ pergunto receoso e ele assente.

_ Comece novamente. _ Pego a espada do chão e começo tudo outra vez.

***

Eu tinha apenas doze anos, mas já havia decorado toda a Bíblia Sagrada. Treinava todos os dias até não conseguir mais sentir as palmas das minhas mãos ou meus calcanhares sangrarem. Calos em minhas mãos demarcavam o a estrutura do cabo da espada. Minha pele estava sempre decorada, seja com hematomas, seja com cicatrizes. Tudo tinha de estar perfeito ou começaria de novo. ‘Se desobedecer passará o dia trancado no calabouço’. ‘Sem resmungar ou perderá suas refeições’. ‘A dor irá purificá-lo. Acha que aprecio fazer isto com você, meu filho? Estou apenas tentando salvar a sua alma.’

Estas cenas se repetiam de novo e de novo em minha mente. Frio, medo e escuridão.

***

Como se fosse nocauteado pela realidade acordo com Nimue segurando meu rosto e me encarando com um olhar que transiciona de assustado para aliviado.

Seus olhos. Havia tanta luz dentro de si que as vezes me esqueço que ela não é um anjo. Como Padre Carden várias vezes me disse: ‘O demônio escolhe formas que nos enganam.’

_ Pelos Deuses! Você está vivo! _ minhas mãos seguram as suas ainda em contato com minha pele e simplesmente não sei reagir ao seu toque. Por um instante só consigo admirar seus olhos completamente ternos e gratos. Nunca recebi um olhar tão cativante, nem mesmo do Padre Carden quando me parabenizava por um treino impecável ou uma missão bem sucedida. Era como se realmente importasse.

_ Lancelot! Você está vivo! _ me ponho sentado sobre a grama tentado compreender o que aconteceu e Esquilo me abraça cortando o contato que tive com Nimue. Eu o abraço de volta fechando meus olhos e apenas me entregando a sensação de estar bem depois de muito tempo, mas ainda não entendo o que está acontecendo. _ Por um instante achávamos que havíamos perdido você!

Eu não digo nada. Eu continuo confuso. O lugar onde estamos é tão diferente de tudo o que já vi. Era iluminado e colorido... Era como a ideia que tinha do paraíso. ‘Estamos todos mortos?’

Ao olhar para Nimue vejo que ela me encara e pela primeira não é com olhar de desprezo ou medo. Ela parece feliz.

_ Obrigado. _ digo a ela que desvia o olhar rapidamente mas logo volta a me encarar com seriedade. Esquilo desfaz o abraço e nós três continuamos sentados sobre a grama.

_ Ainda temos um acordo, certo? _ ela me pergunta séria.

_ Sim. Nós temos.

***

Nimue
Saímos de Avalon sem saber muito bem para onde ir. Nós tínhamos um plano e o cumprimos. O Monge está bem e o plano agora era manter Esquilo vivo até termos novas opções.

O Monge e eu não conversamos depois do que ocorreu em Avalon e eu estava com medo do que viesse a ocorrer a partir daí. Tentava manter em mente que ele é um assassino perigoso mas meu coração dizia que ele apenas foi imposto a lutar por uma posição errada na guerra.

Todos somos monstros aos olhos dos adversários. Eu sei disso. Mas não posso confiar nele sem ter a certeza de que ele mudou.

_ Nós devíamos buscar abrigo. _ digo quando chegamos em terra novamente. Golias continuava exatamente onde o deixamos, nós o buscamos e seguimos as margens do rio.

_ Seguindo aquela colina encontraremos uma vila Feérica que nós... _ ele para e reformula sua frase _ uma vila tomada pelos Paladinos. Fica a algumas horas daqui. Possivelmente chegaremos ao anoitecer.

_ O lago passa pela vila? _ ignoro seu receio e vou direto ao que importa, sem o lago não sei se poderia chegar à vila.

_ Sim. Ela fica as margens do lago, em tempos de cheia as casas mais próximas tendem a serem invadidas pela água, então os moradores costumavam a migrar para mais afundo na floresta.

_ Há alguma chance de encontrarmos inimigos lá?

_ Bem baixas. Os Paladinos tinham ordens para marchar para o norte rumo ao reino de Pendragon. Creio que a Trindade também é contra o Rei, não perderiam tempo com estas vilas já tomadas.

_ Tudo bem. Seguiremos para lá então.

Continuamos nossa caminhada praticamente em silêncio, com exceção das travessuras de Esquilo. O Monge e eu mal nos falamos, nos evitávamos na mesma intensidade. Ele não me dizia nada e eu não dizia nada a ele a não ser que fosse algo de extrema importância.

O dia se foi e faltava pouco para chegarmos. Esquilo dormia sobre o cavalo e o Monge caminhava ao meu lado.

_ Eu sei que não confia em mim, mas cumprirei minhas promessas. Estou em dívida com você Nimue. _ ele quebra o silêncio finalmente.

_ Você está certo. Eu não confio. Mas não tenho escolhas quanto a precisar de você. Não me faça me arrepender. _ tento parecer o mais séria e fria possível.

_ Não farei.

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