3. A CONQUISTA DO PODER

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A sorte da democracia está ligada, já o verificámos, à sorte do movimento operário. Mas a evolução da democracia terá tornado supérflua ou impossível uma revolução proletária visando a conquista do poder do Estado, a conquista do poder político?

Bernstein resolve este problema sopesando cuidadosamente os aspectos negativos da reforma legal e da revolução, mais ou menos como se estivesse a pesar pimenta ou canela numa cooperativa de consumo. No caminho legal, vê a acção da razão, no revolucionário, a do sentimento, no trabalho reformista, um método lento, na revolução, um método rápido de progresso histórico; na legalidade, uma força metódica, na insurreição, uma violência espontânea.

É de facto por demais conhecido que o reformador pequeno-burguês vê em tudo um lado "bom" e um lado "mau" e que anda por todos os caminhos. É também um facto bem conhecido que o curso real da história não se inquieta absolutamente nada com as combinações pequeno-burguesas e deita abaixo os andaimes bem construídos e os seus melhores cálculos, sem considerar os "lados bons" das coisas, tão bem escolhidos na mistura.

De facto, na história, a reforma legal ou a revolução põem-se em marcha por motivos mais poderosos que o cálculo das vantagens ou dos inconvenientes comparados entre os dois métodos.

Na história da sociedade burguesa, a reforma legal teve por efeito reforçar progressivamente a classe ascendente até se sentir suficientemente forte para tomar o poder político, deitar abaixo o sistema jurídico e construir um novo. Bernstein, condena os métodos de conquista do poder político, censurando-os por retomarem as teorias blanquistas da violência, contribuição prejudicial do blanquismo ao que, desde há anos, é o eixo e a força motriz ,da história humana. Desde que existem sociedades classistas e que a luta de classes constitui o motor essencial da história. a conquista do poder político foi sempre o objectivo de todas as classes ascendentes, assim como ponto de origem e ponto final de todo o período histórico. É o que constatamos nas longas lutas dos camponeses contra os financeiros e a nobreza na antiga Roma, nas lutas entre a nobreza e o clero e artesãos contra fidalgos na Idade Média, tal como da burguesia contra o feudalismo nos tempos modernos.

A reforma legal e a revolução não são métodos diferentes do progresso histórico que se possam escolher à vontade como se se escolhessem salsichas ou carnes frias para almoçar, mas factores diferentes da evolução da sociedade classista, que se condicionam e completam reciprocamente, excluindo-se, como, por exemplo, o pólo Norte e o pólo Sul, a burguesia e o proletariado.

Em cada época, a constituição legal é um simples resultado da revolução. Se a revolução é acto de criação política na história de classe, a legislação é a expressão, no plano político, da existência vegetativa e contínua da sociedade. O trabalho legal das reformas não tem nenhuma forma motriz própria, independente da revolução; só se realizará em cada período histórico na direcção que lhe foi impulsionada pela última revolução, e também durante o período de tempo em que essa impulsão se continuar a fazer sentir ou, para falar concretamente, exclusivamente no quadro da forma social originada pela última revolução. Estamos agora no centro do problema.

É inexacto e contrário à verdade histórica apresentar-se o trabalho de reforma como uma revolução diluída no tempo, e a revolução como uma reforma condensada. Uma revolução social e uma reforma legal não são elementos que se distingam pela sua duração, mas pelo seu conteúdo; todo o segredo das revoluções históricas, da conquista do poder político, reside precisamente na passagem de simples modificações quantitativas, numa nova qualidade ou, concretizando, na passagem de uma dada forma de sociedade a outra num período histórico.

Quem se pronuncie a favor da reforma legal, em vez do encontro do poder político e da revolução social, na realidade não escolhe uma via mais agradável, mais lenta e segura, conduzindo ao mesmo fim; mas tem um objectivo diferente; em vez de procurar edificar uma sociedade nova, contenta-se com modificações sociais da sociedade anterior. Assim, as teses políticas do revisionismo conduzem à mesma conclusão que as suas teorias económicas. Na essência, não visam realizar o socialismo, mas reformar o capitalismo, não procuram abolir o sistema do salariado, mas dosear ou atenuar a exploração, numa palavra: querem suprimir os abusos do capitalismo, mas não o capitalismo.

Reforma ou Revolução? - Rosa LuxemburgoOnde histórias criam vida. Descubra agora