5. O OPORTUNISMO NA TEORIA E NA PRÁTICA

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O livro de Bernstein teve para o movimento operário alemão e internacional uma grande importância histórica: foi a primeira tentativa para dar às correntes oportunistas da social-democracia uma base teórica.

Se considerarmos algumas manifestações esporádicas que aparecem à luz do dia – pensamos por exemplo na famosa questão da subvenção concedida às companhias marítimas– as tendências oportunistas no interior do nosso movimento vêm de longe. Mas sòmente em 1890 se esboçou uma tendência declarada e única nessa via: depois da abolição da lei de excepção contra os socialistas, quando a social-democracia reconquistou o terreno da legalidade. O socialismo de Estado à Vollmar, a votação do orçamento na Baviera, o socialismo agrário na Alemanha do Sul, os projectos de Heine tendentes a instituir uma política mercantil, as opiniões de Schippel sobre a política alfandegária e sobre a milícia:essas são as principais etapas que demarcam a via, da prática oportunista.

O sinal distintivo do oportunismo era, na altura, a hostilidade à "teoria". O que é natural porque a nossa "teoria" – quer dizer, os princípios do socialismo científico – limitam firmemente a acção prática em relação aos objectivos visados, aos meios de luta e, por fim, ao modo da própria luta.

Também os que só procuram resultados práticos têm um pendor natural para reclamar liberdade de manobra, quer dizer, separar a prática da "teoria", torná-Ias independentes.

Mas, a cada tentativa de acção prática, a teoria cai-Ihes sobre a cabeça: o socialismo de Estado, o socialismo agrário, a política de mercados, o problema da milícia, são outras tantas derrotas para o oportunismo. É por demais evidente que, para afirmar a sua existência contra os nossos princípios, essa corrente, muito logicamente, acabaria por organizar uma teoria própria, princípios próprios. Melhor que ignorá-Ios, tentar desacreditá-Ios e construir uma teoria própria. A teoria de Bernstein foi uma tentativa desse género. E vimos que no Congresso de Estugarda, todos os elementos oportunistas se agruparam à volta do pendão de Bernstein.

Se as diversas correntes do oportunismo prático são um fenómeno naturalíssimo, explicável pelas condições da nossa luta e pelo crescimento do nosso movimento, a teoria de Bernstein é, por outro lado, uma tentativa não menos natural para reunir essas correntes numa expressão teórica que lhe seja própria e entre em guerra com o socialismo científico. A doutrina de Bernstein serve de legitimação científica ao oportunismo e submete-o à prova do fogo. Como suporta o oportunismo essa prova? Já o vimos: o oportunismo não está à altura de construir uma teoria positiva que resista, um mínimo que seja, à crítica. Só é capaz de atacar alguns princípios isolados da doutrina marxista; mas, como essa doutrina constitui um edifício solidamente implantado, acaba por atacar todo o sistema, do último andar aos alicerces. O que prova que o oportunismo prático é incompatível, pela sua natureza e fundamentos, com o sistema marxista.

Isso prova igualmente que o oportunismo é incompatível com o socialismo em geral; a sua tendência intrínseca é orientar o movimento operário para a via burguesa, ou dito de outra maneira: paralisar completamente a luta de classes proletária. Sem dúvida que, se os considerarmos numa perspectiva histórica, a luta de classes proletária e o sistema marxista não são idênticos. Antes de Marx e independentemente dele, houve um movimento operário e diversos sistemas socialistas; cada um a seu modo e segundo as condições da época, traduziram no plano teórico as aspirações de emancipação da classe operária. Todas as componentes da doutrina de Bernstein se encontram em sistemas anteriores ao marxismo: um socialismo fundamentado em noções morais de justiça, a luta dirigida mais contra o modo de repartição da riqueza do que contra o modo de produção, uma concepção de antagonismos de classe reduzidos ao antagonismo entre ricos e pobres; a vontade de enxertar na economia marxista o sistema do "cooperativismo". Ora, em seu tempo, eram teorias autênticas da luta de classes proletária, foram o alfabeto histórico onde o proletariado aprendeu a ler.

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