Damn similarity

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Anne
Medicine — Daughter
"You've got a warm heart
You've got a beautiful brain
But it's desintegrating
From all the medicine"

Perdi o ar quando percebi Margot me esperando, como uma estátua; ao seu lado, um carro preto estava estacionado, com vidros fumê escuros e um brasão familiar para mim. Apertei a bolsa contra o meu corpo e fui em direção ao carro. Alguns olhares e cochichos acompanharam cada movimento meu.

Margot estava apática, como é habitual. Saudei o motorista que segurava a porta e aguardava que eu entrasse. Ela fez uma volta para se sentar no banco do passageiro, mas, antes que ela pudesse fazer isso, eu a impedi.

— Vá para o banco de trás — solicito. O pedido, naturalmente, soava como uma ordem. A mulher robô não disse nada quando alterou a sua ação, se sentando ao meu lado alguns segundos depois.

O motorista manobrou o carro e, em poucos minutos, só tínhamos a paisagem de pinheiros que dividiam os raios solares. O dia foi intenso, com a sensação de esgotamento físico e mental, estava despreparada para a próxima etapa. Fechei os olhos e a imagem que surgiu na minha mente me deixou incomodada e arrepiada ao mesmo tempo. Ele permaneceria em meus pensamentos por um tempo, mas eu o deixaria de lado, comprimindo o sentimento até se tornar . Faço isso com frequência.

— Qual o custo de não contar para Bertha o que ocorreu nesta manhã? — pergunto a Margot, que desvia os olhos do tablet em suas mãos. Ela protestaria.

— Não sei quem a senhorita pensa que sou, mas... — assim como presumi.

— Pare de fingir que tem moralidade e diga o seu valor! — exijo, interrompendo. A divisória automática impedia o motorista de nos ver ou ouvir, o que a deixava ainda mais patética.

Dez mil dólares — Margot propõe, voltando a mexer no tablet.

— Por esse valor, você permanecerá calada sobre tudo o que fiz durante a ausência de Bertha — acrescento. Margot estende a mão sem olhar para mim.

Fechado — declara. Encaro a mão, entediada, não era como se estivéssemos em um filme sobre a máfia. Ela tira a mão quando percebe que não vou apertá-la.

— Depositarei aos poucos, para não causar suspeitas — aviso para Margot, que balança a cabeça ao aceitar o termo. O valor era um trocado de bala para a Bertha, mas a história muda quando nos referimos a uma adolescente de dezoito anos.

A viagem foi extremamente longa e cansativa, os minutos se arrastaram para a eternidade. Tinha apenas três horas para ir ao pilates, preparar a coreografia com um grand jeté e terminar todos os deveres escolares. Não senti nenhum alívio ao chegar aos portões da residência Shirley; eu não me sentia em casa, aquele lugar não era meu lar.

A mansão não era outra coisa senão concreto. Sem recordações ou momentos valiosos. De certa forma, o local me refletia sobre o meu estado de espírito. Ele não tinha vida, assim como eu. As paredes brancas,-sem cor-, as salas quase vazias,-se não fossem pelos poucos móveis colocados no centro de cada cômodo-, as refeições sem sabor e, é claro, o silêncio. 

Quando passei pelas portas principais, tive a visão das empregadas posicionadas em uma fila alinhada, mesmo tendo pedido um milhão de vezes para que parassem de fazer isso. Somente se...

— Sentiu minha falta, querida? — Bertha questionou, descendo as escadas. Cerrei os dentes, receando que meu queixo caísse, demonstrando o quão impactada estava. 

Lar de rosas e espinhos - ShirbertOnde histórias criam vida. Descubra agora