Camuflada

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- Bem, temos que começar de alguma forma né Lilah. - Helena diz deitada na minha cama olhando para o teto coberto de estrelas néon roxas e alguns tons de verde néon que eu desenhei.

Me mantenho na mesa do computato pesquisando e digitando possíveis pessoas que possam ser as duas cartas.

- Você acha mesmo que esse tal de Alex ainda vai estar nos amigos do Facebook dela? - Pergunto girando a cadeira, ficando de frente para o corpo entediado e pensativo de Helena.

Helena levanta deixando o cabelo todo bagunçado, me dando uma leve coceira na mão para arrumar aqueles fios no lugar.

- Esse Alex era um dos melhores amigos da Mary, eu acho, sei lá, parecia que ela tinha um crush nele, eles viviam grudados cheios de segredinhos. - Ela diz com um leve tom de ciúmes, que me faz rir.

- Você é muito ciumenta baixinha. - Digo rindo.

Penso um pouco pra tentar me lembrar desse tal Alex.

Volto a tela do meu computador e observando as fotos que Mary postava, meu peito aperta ao ver aquele sorriso doce e olhar vivo novamente, depois de três anos...

Após a morte de Mary eu nunca mais consegui olhar uma foto dela novamente, tudo que vinha a minha cabeça ao ver aquelas fotos era a falta que ela fazia e as cenas daquele dia passavam de forma desesperadora em minha mente.

Mary era mais que uma amiga, era o amor da minha vida, meu primeiro amor.

Pra uma garota de 12 anos na época que vivemos, não é comum nenhum pouco isso, mas para quem não sabe, a bissexualidade não é uma escolha.

E sim, eu não sou lésbica, continuo sentindo atração por homens, mas com a Mary era mais que isso, e eu não entendia, mas era amor, puro amor.

Por um momento me pego desejando ter beijado enquanto pude aqueles doces lábios que esboçam um sorriso puro na tela do meu computador.

Me sinto louca de novo e fugindo novamente da minha missão principal, mas é difícil, Mary era mais que linda, era como se Afrodite tivesse deixado uma parte de si em uma menina.

- Meu Deus eu tenho que parar de babar em uma garota que já morreu... - Digo a mim mesma baixo, de olhos fechados e respirando fundo.

Helena levanta da cama e olha pra mim.

- Lilah, você tá chorando. - Ela diz séria.

Olho meu reflexo no espelho e me assusto, eu fiquei tão focada em Mary que não senti minhas lágrimas caindo ao rever ela.

- É melhor você fazer isso Hellen.. Eu vou acabar queimando meu PC assim. - Digo limpando as lágrimas e me levantando.

Helena senta na cadeira e começa a observar as fotos rapidamente, a procura de um garoto que nem eu me lembro direito.

Helena parece mais focada que eu, mas acho certo, depois de tanto sofrer pela irmã, com as fotos delas duas juntas em toda a casa, com certeza seria "menos difícil" pra ela.

Me jogo na cama e tento pensar nesse garoto, mas parece que minha mente excluiu 10 anos da minha existência com a morte de Mary.

Eu me lembro de Mary como se eu a tivesse visto ainda ontem, assim como no dia em que nos conhecemos..

Mary era uma pessoa muito querida na escola onde estudávamos, mas era só isso que todos viam.

Ele nunca viram o quanto que Mary sofria bullying na mão de certas amigas dela, e foi assim que eu conheci ela.

Na hora do recreio, eu como antissocial que sou comecei a andar sem rumo pela escolinha até a escadaria pro pátio onde a maioria das crianças iam pra comer as frutas que tinham lá, em especial, a manga.

Naquele pátio haviam duas mangueiras que além de fornecer a fruta doce e gostosa que eu amo até hoje, fornecia sombra, muita sombra, até onde tinha um pequeno parquinho onde as crianças do 1º ano e a gente do 5º, gostávamos de brincar, eu adorava o balanço mas ele vivia lotado então eu ficava observando todos sentada na escada.

Nesse recreio eu observei uma coisa que me deixou muito brava pra uma garota de 10 anos.

Aquelas garotas tratavam ela como uma empregada, ela não podia ter nada novo e bonito que elas quebravam ou roubavam dela, e aquele dia foi a jardineira Florida que ela tinha ganhado de aniversário e a sapatilha vermelha.

Elas jogaram a sapatilha de Mary, no telhado da escola, e começaram a RASGAR a jardineira da garota, eu não aguentei ver aquilo calada e acabei me metendo na minha primeira briga de escola.

A... Como eu gostava dela...

Aquele dia voltamos machucadas, sujas e sem sapato, mas com uma grande amizade que durou até o fim da vida de Mary.

É, crianças são pragas quando querem ou não aprendem a ter educação com os pais, eu aprendi isso aquele dia.

Helena me tira de meus devaneios - ou mais apropriadamente falando - do meu sono profundo, me chacoalhando.

- Eu não sou bolo pra você tá me mexendo não Hellen! - Digo me levantando e me espreguiçando.

- Enquanto você dormia eu descobri o endereço desse tal de Alex. - Ela diz com uma cara vitoriosa.

Me levanto da cama e olho no Google maps o quão longe é aquela casa.

- Ela não é muito longe, acho que a minha mãe consegue levar a gente. - Digo calçando meu tênis e vestindo uma blusa de frio.

Saímos do quarto em direção a sala onde minha mãe assiste sua série policial favorita ao lado de Carl, que claramente está bêbado.

Chego até minha mãe junto a Helena e pedimos para que ela nos leve até a casa de uma amiga e assim que ela aceita e vai atrás da chave do carro, respiro em alívio.

- Vamos esperar lá na garagem. - Aviso minha mãe indo até a garagem puxando Helena.

O caminho até a casa de Alex não é tão longo, algumas quadras depois de onde eu estudo.

A casa é grande, dois andares, com um enorme quintal onde um casal de vira-latas brincam com uma garotinha de no máximo uns 4 anos.

Decemos do carro e ficamos no portão, Helena assobia para a amenininha que nos olha com curiosidade e corre até o portão.

- Oi lindinha, estamos procurando o Alex, ele ainda mora aqui? - Helena pergunta agachada na altura da menina.

A menininha fica sem jeito e abaixa a cabeça, correndo em seguida para dentre da casa.

- O que eu fiz de errado? - Helena pergunta confusa.

Solto uma risada.

- Ela deve ter ido chamar alguém mais velho, crianças hoje em dia não podem conversar com estranhos sozinhas. - Explico pra ela.

Alguns minutos depois uma garota de cabelos loiros longos, magra, vestindo um vestido preto simples caminha até nós um pouco confusa.

- Quem são vocês? - Ela pergunta abrindo o portão.

- Meu nome e Delilah e ela é Helena, estamos procurando o Alex, ele ainda mora aqui? - Pergunto com calma pra ela mostrando a foto que Helena imprimiu de Alex e Mary juntos.

Ela congela ao ver a foto e seus olhos se enchem de lágrimas, olhando diretamente para Helena.

- Você é a irmã dela não é? - Ela pergunta desesperada, deixando lágrimas caírem de seus olhos verdes familiares.

- Sou... Você é irmã do Alex? - Helena pergunta segurando o choro.

A garota fica sem jeito por um momento e abaixa a cabeça.

- Aconteceu algo com ele? - Pergunto séria.

Ela olha para mim e para Helena e respira fundo.

- Meu nome agora é Alexa, não sou mais esse garoto.. - Ela diz baixo, ficando um pouco sem jeito.

Eu nunca pensaria que isso poderia acontecer, mas era por isso que não encontrávamos Alex tão fácil.

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