Ato 1.
Darwin estava certo, aquilo que se adapta sobrevive. E elas se adaptaram, as abelhas da parte detrás de sua cabeça haviam evoluído, talvez fossem vespas agora ou apenas abelhas melhores, abelhas mais perigosas, abelhas mais afiadas cujo zumbido pinica como tecido ruim. O que antes era um empurrão para a morte certa havia mudado, Rafael mudara. Aquele medo terrível que o fez se jogar da laje tarde da noite do último domingo, dois dias antes, agora não passava de um incômodo, mas sabe o que dizem de um hóspede, os piores são os silenciosos. Esses são os malditos que te tiram o sono.
Ele saiu cambaleando da empresa pintada de azul e virou à esquerda, parecia pensar em pegar o ônibus, mas sua mochila ficara em sua baia e ele definitivamente não pretendia voltar para lá. Quando seu corpo avisou que havia algo de errado, já era tarde. Rafael caiu na calçada sob aquele sol forte da tarde, mas antes de ser carregado para dentro do Volkswagen Fox branco daquele casal, que imediatamente após acordar pensaria que eram maconheiros de algumculto atípico, ele teve um sonho de outro mundo. Outra realidade sua alma musical diria.
O corredor era escuro, mas havia uma luz advinda de uma das portas, então se guiou até ela.
- Por que está dançando? – o garoto com uma franja ocasional caindo sobre os olhos perguntara, estava de terno preto, a gravata era como safiras.
- Não me provoque, não estou no meu melhor agora, Lucca – ela dissera e sua resposta ecoara pelo quarto.
- O quê? Você acha que alguém está? – ele bufou e apoiou uma mão na cintura.
- Lucca... qual seu problema? Por que está pegando no meu pé justo hoje? – por mais brava que estivesse, sua voz saíra falha.
- Meu problema é que R-Ra... Rafa morreu e você está dançando, Nayara. Dançando igual umagarotinha.
Ah, isto é depois da morte do Rafael deles, pensou este Rafael que olhava de um dos cantos do quarto que era rosa salmão, com certeza não era a primeira cor que lembraria ao pensar em Nayara, mas era o quarto dela, e havia detalhes dela espalhados por tudo. Sentiu o peito apertar.
- Você nadou hoje? Deu uns saltos maneirosna água ou brincou de prender a respiração por bastante tempo? – Nayara perguntara se alongando, já havia tirado a camiseta pois estava suando. Os óculos estavam sujos e por detrás das lentes as mesmas sardas bem posicionadas.
- Não, por que eu nadaria? Acabamos de voltar do velório.
- Acho que deveria, vai se sentir melhor.
- Melhor?! – Lucca cerrou os dentes. – Como eu me sentiria melhor depois de ontem?
- Lucca, eu estou tentando, realmente tentando lidar com isso tudo. Com toda essa merda e todo esse... não sei, sentimento, peso, mágoa, culpa, talvez. A porra toda – sua voz como dores por todo o corpo e seus olhos como os das crianças bororos que se tornaram estrelas no céu. - E se dançar é a única coisa que me mantém de pé, pode apostar sua bunda que eu vou continuar dançando. Então, sim, acho que deveria ir nadar um pouco. Esfriar a cabeça, sabe.
- Ótimo trocadilho. Hora perfeita.
- Não, eu... não queria parecer engraçada, de verdade.
Houve uma pausa entre a discussão e ambos se sentaram no piso de madeira que antes fora tão aconchegante. Rafael queria participar, mas sem o Rafael deles, sem um corpo, era apenas um observador - uma mosca na parede -, como quando viu cilaques sendo aniquilados no contorno dos campos no Dia Um logo após escapar de Silêncio.
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Os Quatro Cavaleiros do Fim
Aventura"Eles vão se levantar frente aos terrores que pairam a terra. Um por um, os quatro hão de vir para tomar dores novas e defender os humanos remanescentes da antiguidade. Do mal, do vil, do estranho e do poderoso, de tudo, se farão de escudo e de espa...