4. Elefantes azuis e filtros

275 51 295
                                    

Capítulo Quatro

   Uma coisa que nenhum livro de ficção científica te conta é a dor de cabeça fodida que você tem depois de voltar. Cada vez que eu abria os olhos, a sensação era como se tivessem mil agulhas espetando ao mesmo tempo o meu cérebro. Gemi involuntariamente.

   Após juntar todas as forças que tinha, abri meus olhos. Agora eu já estava de volta ao meu quarto branco característico, o mesmo que eu dividia com Jamia antes da suposta viagem. Tateei o lado oposto da cama, que aparentava estar mexido. O lençol estava quente, denunciando que alguém esteve aqui.

   "Eu vou ficar" A voz de Gerard reprisou na minha memória. Era ele.

   Subitamente, a dor não importava mais. Ele havia ficado comigo e eu passaria pela pior ressaca todas as manhãs se isso me fizesse encontrar ele no outro lado da cama.

   Respirei fundo e senti o cheiro de café passado que invadia meus sentidos, trazendo uma imagem mental perfeita de Gerard na cozinha, sem camisa, fazendo comida para nós. Apenas isso me animou para afastar os lençóis de vez.

   Me dirigi para o cômodo, pronto para ver os dentinhos pequenos que sempre amei bem ali, na minha cozinha. Na nossa cozinha. Naquele ponto meu sorriso já se formava de orelha a orelha. Eu era pura ansiedade, só podia pensar em como tudo havia se consertado.

   Pensava em como seria nosso futuro juntos, se a minha memória iria se restaurar aos poucos... Será que a gente tinha filhos? Eu sempre quis adotar, e ele também... Seria a primeira coisa que eu perguntaria.

   No entanto, meus planos não chegaram a se concretizar, já que única pessoa que ocupava a cozinha era, na verdade, Jamia.

   – Bom dia, flor do dia! Pensei que não fosse acordar. Foram as cervejas de ontem, né?

   – Bom dia... Como assim?

   – O engradado de cerveja que você comprou ontem, não lembra? Nossa, Frank, você precisa começar a se controlar mais. Logo nós vamos ter filhos e eu não quero que cresçam com o pai alcoólatr...

   A minha mente não estava mais ouvindo. Tinha sido tudo um sonho? Mas foi tão real... Não podia ter sido só isso. Eu precisava saber.

   – Jam, – a interrompi – Você lembra em 2007, naquela tour que você também estava, quando eu te procurei, poucos minutos antes de você viajar?

   – Que? Não lembro, amor. Por quê? – Ela indagou, enquanto me entregava um prato de ovos mexidos.

   Aquilo simplesmente não fazia sentido. Tudo o que eu vivi foi vívido demais para ser mentira.

   – Nada.

   A mulher me encarou como se eu estivesse louco. Provavelmente eu estava mesmo. Ignorando a comida, corri de volta ao quarto, vasculhando todos os cantos até encontrar meu celular. Digitei com os dedos rápidos. Gerard Way. A página carregou lentamente.

   Nascimento: 9 de abril de 1977

   Altura: 1,75 m

  Cônjuge: Lyn-Z (desde 2007)

   A última linha quase me deixou tonto. Puta merda. Nada havia mudado. Tudo continuou como a primeira vez.

   Todos os momentos foram fruto da minha cabeça perturbada: o parque, as declarações, as risadas... Eu deveria ser o criador de histórias em quadrinhos, não Gerard. O que era Umbrella Academy perto daquilo?

   Sentei-me na cama, chegando a conclusão de que eu precisava de um psicólogo. Não é possível um homem adulto ser tão preso ao passado a ponto de ter sonhos lúcidos ambientados em 2007. Nem Freud explicaria.

Way Finder [FRERARD]Onde histórias criam vida. Descubra agora