Capítulo 13

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Por Dulce María

Comecei a perceber que aquilo não era um sonho. Era uma triste realidade, na qual Christopher via todos os dias me ver. Na verdade, ouvi as enfermeiras dizer que ele só saía do hospital para ir em casa tomar banho e mantinha Poncho aqui.
Poncho veio me ver algumas vezes e chorava em todas elas. Não dizia nada. Any alegava que tinha que cuidar da loja o dia todo e que Miguel e as gemeas estava ficando com Mai - a mesma cancelou todos os shows. Mai não conseguia vim me ver, ela não podia ter fortes emoções por causa da gravidez e ainda não tinha conversado com Nico. Para ele, ela simplesmente tinha que ficar com as crianças.
Christian quando vinha me trazia boas risadas, como sempre. Ele estava babando por Mai.
Eu queria ver as minhas filhas. Só isso.
Minto. Na verdade, eu queria acordar e não sabia como. Não sabia nem que dia era (exceto quando Ucker dizia "Já tem tantos dias que você está dormindo..." E fazia uma piadinha que eu era muito dorminhoca, mas sei que era uma piada sem um pingo de humor).
Sabia que eu havia emagrecido e estava cada vez mais fraca.

Já se passou muito tempo desde que Ucker não vinha me ver. Será que tinha desistido? Pensar nisso fazia meu coração doer. Ainda mais quando vinha uma enfermeira muito simpática, Valeria, e sempre elogiava-o até dizer que chega. Será que estão juntos? Christopher já me falou dela algumas vezes.
Os dois fariam um belo casal. Talvez eu devesse partir e deixar ele ser feliz com ela...

Um clarão cega minha visão e logo depois vem uma escuridão - que nem no acidente.
Quando tudo fica claro, abro os olhos e me vejo num espaço - literalmente - branco. Chão, paredes e tetos. Apesar que nem vejo onde começa e termina uma parede.
Olho para todos os lados me perguntando silenciosamente onde estou, até que alguém aparece ao meu lado.
Um garoto, que parece ter uns dezessete anos. Ele tem o cabelo castanhos e os olhos também, que me lembrava exatamente.
Ele fica me encarando e dar um sorriso.
Olá - ele quebra o silêncio.
Quem é você?
Pode me chamar de... - ele coloca a mão no queixo - ãnh, talvez Renan? Ou Diego? Jaime talvez?
Você tem cara de Luis.
Luis. - ele parece pensar - Gostei.
Então, Luis, quem é você?
Seu anjo da guarda e seu futuro filho.
Como? Você disse anjo e filho?
Bem, sou aquele que você tem conversado nos últimos 33 dias.
Faz parte do meu "sonho" então? - ergo os dedos fazendo aspas.
Sonho? - ele ri ironicamente - Você ainda acredita que isso é um sonho?
Bom, não exatamente... - respondo sem graça.
Não temos tempo. Estamos na véspera do Natal, estou com fome - ouço o estômago dele roncar - E você não tem muito tempo.
Antes que eu possa abrir a boca para falar ele prossegue.
Você está quase morrendo. Por favor, deixa eu continuar? Obrigado - cara folgado - Você era assim também, lembra? Bom, se tudo der certo e você cooperar, daqui uns anos a Sam vai se encantar por mim, como o papai encarou por você. - ele tagarela sem parar e tudo o que fala, vejo cenas. Mai dando a luz uma menina e na sua pulseira tem escrito Samantha e eu, meses depois, dando a luz a um menino chamado Luis. Vejo os dois se apaixonando, assim como eu me apaixonei por Christopher. Ele era o pai. - Você está chocada? Francamente mamãe.
Mamãe? Me sinto uma velha tendo um filho deste tamanho. Você é maior do que eu!
Não é difícil - ele dá um sorriso torto que nem Ucker dava quando em chamava de baixinha - Puxei o papai neste requisito. Mais como eu dizendo, você sabe por que está aqui?
Não?
Porque Ele - aponta para cima - quer te dar uma nova chance.
Deus?
Sim.
Por que segunda chance?
Porque todos merecem.
Por que não acertei na primeira?
Quer mesmo saber?

Antes que eu possa responder, sou puxada bruscamente para trás. Como se estivesse assistindo de camarote, vejo cenas na qual eu sou completamente fria, rude e sem paciência com as pessoas que eu mais amo nessa vida.
Vejo minhas discussões e insultos com Ucker no curto período que ficamos juntos. Minhas frieza com Any e vejo que ela sempre saia chorando (o que é estranho, porque Poncho nunca veio falar comigo sobre isso. Ela teria escondido dele?). Uma ou outra briga com o Poncho, por causa do Rodrigo. Christian me cobrando coisas que eu sempre escondi deles. Minhas brigas com Mai, que também ficava chateada comigo, mas não falava nada - apenas conversava com Any, em todas as brigas de ambas. Vejo minhas filhas.
Todo grito que dei com elas, os momentos em que neguei atenção, carinho e etc, elas reclamando com a babá meu comportamento. E então vejo meus pais fazendo o mesmo comigo. Estou uma cópia deles. Fria. Achando que elas só precisavam de mim quando passassem mal.
Se sou assim, por que meus amigos me amam e me querem tanto por perto?
Por que eles te amam apesar de tudo - Luis responde - Não se assusta por eu ler seus pensamentos e respondê-los ?
Você tem feito isso nos último trinta e poucos dias.
Verdade. - ele concorda - Enfim, no fundo eles acham que você é assim por causa dos seus pais e agora por causa do meu pai. Mais são só desculpas que arranjam para não te deixar. Independente do seu lado frio, eles a amam o suficiente para não te deixar na mão. Eles são a sua família mesmo que não possuam o mesmo sangue.
Tipo família espiritual?
Isso. Como eu ia dizendo, você pode evitar isso.

Ele aponta para baixo e vejo minha família num cemitério diante de uma lápide escrito "Dulce María, mãe e amiga leal. 24/12/2014". As meninas estão em volta de Ucker, como sempre e todos choram.
A imagem some.
E também. - aponta de novo.
Agora estamos numa igreja situada em uma coluna com uma vista incrível. Vejo Ucker no altar e a Valéria caminhando em sua direção, sorridente. Depois a imagem desaparece. Agora vejo Christopher indo a minha lápide. Diversas vezes, mas a cada "dia" ele está com uma roupa e rosto diferente. Ele está envelhecendo.
Depois vejo minhas filhas em um orfanato chorando. Vejo Cecília com pircings, tatuagens e com o cabelo descolorido de verde. Ela conversa com um cara - estranho - sobre eu ter abandonado ela, não saber quem é o pai e ela não conversar mais com a irmã. A outra cena é de Alicia, dançando em bordel, fazendo striptease para todos os homens (e algumas mulheres) daquele lugar inundo.
Não!
Sim. - ele diz calmamente.
Elas são suas irmãs! - respondo - Você tem que cuidar delas.
Elas só serão minha irmãs, se você optar pelo o que te falei.
Como faço? - pergunto chorando.
Já te falei que Any vai ter mais um menino? Vai chamar Pablo. Ela já está grávida, mas ainda não sabe.
Serio? - meus olhos brilharam - Não me distraia. Como faço?
Tem mais uma coisa.
O que?
Olhe.

Agora estamos de volta ao meu quarto. Digo, do hospital. Meus amigos estão sentados e em pé ao lado da cama. Alicia e Cecília estão deitadas comigo enquanto Ucker toca o violão e meus amigos cantam. Na bancada pequena que tem no quarto, tem algumas coisinhas de comer. No chão vejo presentes e uma pequena árvore de natal.
Ah! - dou um gritinho - Eu amo o natal!
Pelo menos isso, você tem de compaixão. - o olho feio - Desculpa mamãe.
Como faço para voltar?
Redimir-se.
Não fiz nada de... - antes de terminar falar, ele me olha feio - Você tem razão. Todo esse tempo tenho sido orgulhosa, fria e rude. Não só com meus amigos, filhas, empregados ou com Ucker. Até comigo mesma. Eu dramatizo tudo, vivendo presa ao passado. Quando tive oportunidade de reconciliar com Christopher, agi que nem uma adolescente e corri dele. Agi inconscientemente, não pensei em mim e nem nas minhas filhas... Justo as pessoas que mais amo nessa vida! Eu fui fria com quem nunca mereceu é sempre afastei todos de mim. Eu poderia dizer que me sinto um lixo quanto a isso, mas seria dramatizar. Eu sinto muito, muito! Mais já passou e se eu quiser viver, tenho que dar um "adeus" para o passado. Porém jamais me esquecendo de quem eu sou. Sinto muito, Deus!

Termino de falar e choro. Peço perdão a Deus e a todos quem eu amo em silêncio. Sinto Luis me abraçando e dando um beijo em minha testa. Antes que se afaste, o ouço sussurrando.
Você conseguiu. Até logo mamãe.

Please, stayOnde histórias criam vida. Descubra agora