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"A única certeza que temos na vida e que vamos morrer um dia, então, porque não correr riscos hoje?" 

  Dizia a voz reconfortante de William Menezes, o galã do rádio, como era chamado nos anos 80. Hebe acordou, mas não abriu os olhos, só iria fazer isso quando o despertador tocasse. Estava quentinho demais para desperdiçar os um minuto ou dois que seu corpo costumava se adiantar em acordar. 

" A sorte de um as vezes e azar de outros... Principalmente quando você é pobre, aí o azar é sempre seu!"

Eunice Villela que também apresentava o estranhamente humorístico e forçado jornal das 4:30 da matina completou fazendo o companheiro de voz amanteigada rir. Hebe se perguntou quem diabos conseguia ser engraçado as 4 da Manhã.

Hebe esticou as pernas e curvou os dedos dos pés ouvindo estalos de relaxamento. Ela nem conseguia mais ouvir o que diziam no rádio agora que virou o corpo para a parede. Tudo estava quentinho, e calmo. Até dona Antônia abrir o armário com toda força e começar a falar alto como fazia todos os dias:

— Hebe, Levanta, esse despertador não vai tocar não!

A calmaria gostosa sumiu mais rápido do que chegou, Hebe deu um pulo de susto. Quando aquela velha tinha entrado no quarto?

Dona Antônia tinha essa mania que irritava Hebe, ela nunca a chamava com calma, era sempre aos berros. E era quase sempre segundos antes do despertador que, segundo ela, " não era confiável".

— Levanta logo menina vai acordar teus irmãos!

Disse por fim fechando o guarda-roupas e saindo de mãos vazias do quarto. Hebe se levantou segurando a cabeceira da cama, com o coração ainda acelerado de susto. Assim que chegou a porta o despertador tocou anunciando as 4:45, Hebe voltou de pernas bambas para desligar o celular, contando se era  tempo suficiente para  se arrumar, levantar Cris e Vinícius, arrumar Cris, tomar café, pegar a Kombi, Trazer as flores, Pegar Cris, Vinícius e dona Antônia e ir para a Loja.

Tudo isso antes das 7 da manhã. Se não fosse parada pela polícia e apreendida por andar sem carteira. Não que ela fosse péssima motorista. Pelo contrário, nunca tinha nem sequer furado um sinal! Mas a carteira custava dinheiro. E ela só conseguia dinheiro quando dirigia a Kombi até fora da cidade, para comprar flores.

Andou até a beliche sem roupa de cama de Cris e Vinícius.

— Cris... Cristina — chamou baixinho cutucando a irmã que se enrrolou novamente, deu uma certa dó, mas ela chamou de novo— Cris levanta pra se arrumar— A pequena abriu os olhos cheia de sono e assentiu enquanto a irmã falava, mesmo que não estivesse entendendo nada. Uma mãe acharia fofa a cena de Cris coçando os olhos cheia de preguiça e tentando achar os chinelos embaixo da cama, mas Hebe era irmã e não mãe. Portanto ela via uma menininha tirando a remela dos olhos enquanto tentava levantar.

— Vini... Vini !— Chamou na beliche superior, cutucando o braço do irmão que repeliu sua mão virando ao contrário para a parede.— Silvio Vinícius!— Chamou novamente fazendo o garoto virar e a encarar com uma expressão azeda— Se eu voltar aqui e você não tiver pronto eu como teu pão!

Saiu do quarto indo direto no banheiro tomar uma chuveirada gelada.  A água gelada nem era para despertar o corpo e sim porque se fosse quente ela iria demorar demais, a água gelada sempre a incentivava a sair logo do chuveiro.

Até que a morte nos JunteOnde histórias criam vida. Descubra agora