02 - Uma pequena prisioneira

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Luz acorda em um colchão velho, com sua roupa quase toda chamuscada, assustada. A garota olha para o teto, se senta e se encolhe. Parece, de longe, um lugar confortável. De perto, uma sala cheia de pó.

Ao avistar uma janela, Luz tenta abri-la desesperadamente, mas não consegue observar nada por ser muito baixa para isso. Com o auxílio de um balde, sobe nele e enxerga, agora, o que há lá fora. Um bairro normal, só que... com monstros e... também bastante água no fundo. Apesar de estar aflita, Luz gosta do que vê. Gosta tanto que se desequilibra em cima do balde e tenta se segurar numa estante, contudo o balde vira, assim como a estante. A menina cai de vez com muito barulho.

A porta é aberta.

— Ora, ora! A criança acordou. — Uma senhora bastante estilosa, com um rato em suas costas, sorri.

Luz berra e arremessa na mulher os diversos livros que caíram da estante. O rato grita e a senhora se defende:

— Feitiço do sono!

A garota apaga.

— QUEBRA DE TEMPO —

Amarrada e com uma fita na boca, Luz acorda e murmura; porém imóvel.

— Criança, criança... Isso é pro seu próprio bem. Ou pro meu próprio bem — A senhora ri com as mãos na cintura e imita um porco sem querer —, tanto faz!

— Talvez, do outro lado da cerca, eles não aprendam a falar, por isso que... por isso que ela estava gritando! — O bicho, surpreendentemente, fala.

— Hum... Bom argumento, King. — A senhora encara Luz. — O que você veio fazer aqui do outro lado da cerca, cara de pastel?

A menina murmura com a fita, que ainda está em sua boca.

— Ah, é claro...

A mulher remove a fita da boca de Luz.

— Por favor, não me devore!!! Eu só tenho quatorze anos!!!

— Não foi o que eu perguntei. E afe! Quem você acha que eu sou? A Eda aqui só come carne de qualidade, meu bem.

— Já eu como qualquer tipo de carne! — King engole um rato.

— Eca! Canibalismo. — Luz se choca.

— King, isso foi, tipo, supernojento. Só suma daqui, anda! — Eda faz um círculo de magia que tira King do quarto, e a porta se fecha em seguida.

— Caralho, gay! Como é que você fez isso???

— Criança, primeiramente, NADA DE PALAVRÕES NESSA CASA!

— Ah, pronto! Virou a minha mãe agora?! Não tenho paz em qualquer lugar do mundo MESMO.

— Escute: Aqui, praticamos magia e muita bruxaria. Tá a fim de ver feitiços bem legais e trabalhar pra mim?

King abre a porta.

— Eda, isso aí não é perigoso, não? Já li sobre trabalho infantil no Penstagram e...

— Vaza, King.

E a porta se fecha.

— Olha, eu adoraria, mas é que eu tô amarrada, né? Aí o negócio fica... meio complicado.

— Claro que está.

Eda desamarra a criança, que, de imediato, corre dali e desce as escadas. A mulher sorri e cruza os braços, como se já esperasse que isso aconteceria.

— Eu preciso pegar o meu livro e ir embora!!! — Luz avista o seu livro e avança para pegá-lo em uma mesa de centro, mas tropeça em King. — Ai!!! Rato filho da puta!!!

— Ei!!! Eu sou um DEMÔNIO!

— Criança, já chega! Sério, já deu. A regra número um desta casa é não falar palavrões! Por que adolescentes têm essa necessidade de--

— Eu só quero ir pra casa... — Luz chora e olha para baixo. — Ninguém me entende em lugar nenhum... Nem em casa, nem na escola... Eu tenho tanto medo de morrer sem fazer nenhum amigo e... Ai, sei lá... Deixa eu levar o meu livro, por favor!!!

Eda entrega o livro à garota, que limpa as lágrimas de suas bochechas.

— Então tá bom. Vá. Mas você tem um plano, menina? Iríamos trancá-la aqui até você arrumar um jeito de ir embora, porque, se vissem um humano caminhando pelas Ilhas Escaldadas... Poxa vida, não quero nem imaginar.

— Não confio em vocês.

— É justo, criança.

Luz limpa seu rosto, coloca seu livro por dentro de seu moletom roxo chamuscado e caminha para fora da casa em que se encontrava.

— Ela me chamou de rato! — King aponta para fora. — Não vai dar nem um castigozinho pra ela, Eda??? Caramba, viu...

Eda fecha a porta de casa, preocupada.

Do Outro Lado (A Casa Coruja - The Owl House)Onde histórias criam vida. Descubra agora