O Acordo

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Era manhã, e os habitantes da cidade do lago estavam começando a acordar. Bard passava entre as pessoas, alguns cuidando dos feridos, e outros distribuindo comida. Mas todos reclamavam da falta de mantimentos. O que mais se ouvia eram pessoas dizendo que não tinham o suficiente.

- Façam o que puderem. Crianças, feridos, e mulheres primeiro. - Era o que Bard respondia. Ele pretendia resolver o problema da comida, mas achava que talvez não fosse tão fácil quanto esperava.

Ele estava bem cansado, pois todo o povo da cidade do lago dependia dele, e confiavam plenamente em suas decisões. Tinha conseguido trazê-los até Valle, mas as provisões eram muito escassas.

Ele foi ao encontro de Alfred, que estava do lado de fora de uma das casas meio destruídas.

- Bom dia Alfred. Como foi a vigília?

- Nada para reportar senhor, nada passa por mim - Alfred respondeu com a voz sonolenta.

Bard prosseguiu, até que viu algo que o fez parar imediatamente.

- Exceto um exército de elfos, pelo que está parecendo - Ele disse.

Na sua frente, havia um exército gigante. Elfos vestindo armaduras douradas e brilhantes, capas vermelhas, e carregando arcos e aljavas cheias de flechas, estavam parados, numa formação perfeita. A formação se estendia por quilômetros sem fim.

Bard deu mais alguns passos, hesitante. Assim que se aproximou, as duas colunas de elfos mais próximas viraram de lado, formando uma passagem. Bard prosseguiu.

Ele foi caminhando, até que viu algo se aproximar. Era uma rena, grande e majestosa. E montada nela, estava Thranduil. Atrás dele vinham alguns elfos, montados em cavalos.

- Meu senhor Thranduil - Bard cumprimentou. - Não esperávamos vê-lo aqui.

- Soube que precisavam de ajuda - O elfo disse, e se virou para a passagem por onde tinha acabado de entrar.

O povo da cidade do lago se amontoava, entusiasmados, ao ver carroças dirigidas por elfos entrarem, todas abastecidas de provisões. Bard sorriu, vendo toda a comida ser distribuída.

- Vocês me salvaram - ele disse - Eu não sei como agradecer.

- Sua gratidão é equivocada. Eu não vim até aqui por vocês, eu vim apenas recuperar uma coisa que é minha. - Thranduil se referia a gemas que estavam na montanha, em posse de Thorin. Ele já havia tentado negociá-las com o anão, que havia recusado rapidamente.

Com isso, as tropas élficas começaram a avançar, em direção a montanha.

- Esperem, por favor, esperem - Bard correu atrás do rei élfico. - Você entraria em guerra por causa de um punhado de gemas?

- Uma herança do meu povo não será facilmente abandonada.

- Nós somos aliados nisso - Bard disse - Meu povo também tem direito a parte da riqueza daquela montanha. Deixe-me falar com Thorin.

- Vai tentar dialogar com um anão? - O rei perguntou, como se a ideia fosse ridícula.

- Para evitar uma guerra? É claro!

O barqueiro em certa parte contava com Aerin. Caso Thorin não se dispusesse a cumprir sua parte no trato, ela poderia tentar convencer o anão. Bard não sabia, que a elfa não tinha nenhuma chance de convencer Thorin de coisa alguma.

...

Eu já tinha desistido de falar com Thorin. Não adiantava nada, e ele parecia capaz de mandar os anões atirarem em mim se eu falasse mais alguma coisa sobre a promessa dele.

Os anões tinham erguido uma barricada no lugar onde antes ficava o portão dianteiro. Era totalmente intransponível. Thorin achava que os habitantes da cidade do lago pudessem tentar invadir a montanha, atrás do ouro.

Era de manhã, e eu estava em cima da barricada. Eu obviamente vi o exército élfico aglomerado na cidade de Valle, e instantaneamente soube que isso só iria atrair problemas.

Eu ouvi o som de cascos batendo sobre a pedra, e vi uma figura se aproximando a cavalo. Imediatamente reconheci Bard. Acenei com a cabeça na direção dele, e no mesmo instante vi Thorin e os anões subindo até onde eu estava. O olhar de Thorin mostrava pura raiva. Aparentemente ele também notara o exército élfico.

Bard lançou um olhar para mim, antes de se dirigir a Thorin.

- Salve Thorin, filho de Thráin - Ele cumprimentou - Estamos felizes por ver que conseguiu sobreviver.

Eu me afastei, me posicionando no fundo, atenta a conversa.

- Por que vocês vem aos portões do rei sob a montanha, armados para a guerra? - Thorin perguntou.

- Por que o rei sob a montanha se esconde dessa forma, como um ladrão em seu covil? - Bard rebateu.

- Talvez seja porque eu espere ser roubado!

- Não viemos aqui para roubá-lo! Viemos atrás de um acordo justo. Não vai conversar comigo?

Thorin lançou um olhar de ódio ao arqueiro, mas mesmo assim, se virou e desceu da barricada. Foi até a parte inferior do portão, e ficou na frente de uma fenda grande o bastante para poder ver o lado de fora, sem permitir a entrada de ninguém. Eu o segui, e fiquei para trás, observando.

Ao mesmo tempo, um corvo sobrevoou a montanha, indo para longe.

- Estou ouvindo - Disse Thorin.

- Em nome do povo da cidade do lago, eu peço que honre a sua promessa. Uma parte do tesouro, para que eles possam reconstruir suas vidas.

- Não negociarei com homem nenhum enquanto houver um exército a minha porta.

- Esse exército atacará essa montanha se nós não nos acertarmos.

- Suas ameaças não me dizem nada - Thorin disse.

- E quanto a sua consciência? Ela não lhe diz que nossa causa é justa? - Bard disse - Meu povo ofereceu ajuda a vocês, e em troca vocês deram a eles apenas destruição, e morte.

- Quando os homens da cidade do lago nos ajudariam sem a promessa de uma recompensa?

- Um acordo foi selado! - Bard insistiu.

- Um acordo! Que escolha tínhamos a não ser trocar o nosso direito de nascença por cobertores e comida? Pagar o preço por nosso futuro, em troca de nossa liberdade! Você chama isso de um acordo justo? Diga-me Bard, o matador do dragão, por que devo honrar esses termos?

- Porque você nos deu a sua palavra! Isso não significa nada?

Mas Thorin não respondeu. Ao invés disso ele saiu da frente da abertura na rocha, e ficou de costas para a parede.

- Thorin, você deveria ouvi-lo. Ou a sua palavra não vale nada? - Eu comecei, mas Thorin mal me escutou.

- Vá embora, ou nossas flechas voarão! - Ele trovejou.

Bard, com raiva, se afastou. Montou em seu cavalo, e partiu.

- Thorin, eu-

- Não Aerin, agora você vai me ouvir - Thorin disse, com raiva - Você vai lutar ao nosso lado, ou vai embora. Deixarei que vá livremente, e nunca mais terei dívida alguma com você, está entendendo? Não temos espaço para quem não sabe onde está sua lealdade. Eu já tomei minha decisão, cabe a você tomar a sua! - E com isso, ele se afastou.



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