Chicago, 7 de março de 1962

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Ansiosa, Piper estava sentada na sala de espera. Ela se deliciava com a situação, no entanto, fazendo um esforço homérico para não gargalhar. Queria rir, porque tinha se safado magistralmente de ir parar atrás das grades. Queria rir porque a sensação de liberdade era incrível. Ela havia cometido um furto e havia sido genial. Não havia sido pega, ninguém desconfiava dela, ou não estaria ali, naquele aeroporto, esperando para embarcar para a Europa.

Em seu bolso, ardia um cartão com o nome Percy Jackson gravado. Leo Valdez havia dado aquele cartão a ela, chateado porque ela tinha decidido seguir a carreira de ladra profissional longe das Américas. Leo era quem havia ensinado tudo que ela sabia até agora. Seus conhecimentos iam desde destrancar maçanetas, abrir cofres, se disfarçar usando perucas, lentes e enchimentos e até mesmo inventar personagens.

Leo era dono de uma joalheria totalmente legal, com peças não muito chamativas ou valiosas. No entanto, era no fundo do espaço, por trás de uma porta quase imperceptível, que o verdadeiro dinheiro acontecia. Só no último roubo que havia cometido - jóias maravilhosamente valiosas de uma solteirona soberba que havia assegurado as peças no dobro do valor que elas tinham -, Piper havia recebido quase quarenta mil dólares de pagamento pelo roubo. O equivalente a 25% do valor que Leo pretendia vender as peças no mercado negro, para colecionadores ou qualquer outro tipo de gente disposto a pagar.

Era dinheiro o suficiente para recomeçar, longe dali, em um lugar que ninguém nunca reconheceria seu nome. Lá, ela não precisaria ser Piper McLean. Poderia dizer o nome que quisesse, ter a história que quisesse, desde que fosse magistralmente contada. E ela pretendia procurar Percy Jackson para fazer negócios.

Percy, aparentemente, era o equivalente europeu de Leo. E tinha trabalho para pessoas como ela, além de pagar bem. Ela estava ansiosa para fazer uma pequena fortuna e garantir um futuro confortável, além de colocar a boa educação que havia recebido e se inserir no meio da alta sociedade. Podia se passar por uma donzela francesa - seu francês era impecável -, ou pela viúva britânica de um lorde qualquer - seu sotaque inglês era ótimo. Uma baronesa italiana, talvez - não era fluente, mas bem, só de usar o acento para conversar em inglês, bastaria. Piper poderia ter várias facetas, inúmeras histórias e ser quem quisesse, enquanto desfrutava das melhores roupas, refeições e companhias. E isso, sim, era o que ela conhecia como liberdade.

Não tinha começado nessa vida porque queria, não. Mas depois de ver seu nome envolvido em um escândalo após uma noite de bebedeira em um bar, com o filho de um poderoso advogado que, claro, não tinha tido o precioso nome envolvido... bem, não se viu com muitas outras alternativas. Homens protegem homens. Poderosos protegem os poderosos. Aquilo quase a havia matado de ódio, porque a história tinha sido toda distorcida. Ela estava, sim, no bar se divertindo. Até o panaca mimado e riquinho se achar no direito de encostar as mãos nela. E ela tinha usado um canivete para se defender. Óbvio que o que foi dito no boca a boca e até na edição do jornal foi que ela estava facilitando para o jovem rico e sedutor e que depois havia surtado quando ele não correspondeu.

Na pacata e recatada cidadezinha do interior em que morava antes, ninguém queria empregar uma garota problemática e que tinha comprado briga com os poderosos. E Piper havia sido a única a perder o emprego e a credibilidade.

E então, baby, a girl gotta eat. Se mudou para Chicago, procurando uma oportunidade melhor na cidade grande. Mas não se sentia em casa em Chicago. Ainda sentia que estava ali para se esconder de algo. E isso a irritava, porque ela não tinha porque se esconder. Conheceu Leo por intermédio de uma ex-colega bar tender, que conheceu nas poucas semanas que trabalhou em um pub. A garota, Kate, havia indicado o nome do Valdez para ela, dizendo que ele seria capaz de ajudar se ela fosse inteligente o suficiente. Piper se considerava uma pessoa inteligente. E, além disso, estava disposta a fazer quase qualquer coisa para conseguir recomeçar onde quisesse, tendo a vida que quisesse.

Quando se deu por si, já havia cometido dois furtos magistrais. Ganhado mais dinheiro do que já havia visto na vida. A única regra que tinha era que não roubava pessoas que não poderiam lidar com o prejuízo. Nunca prejudicaria inocentes, pobres ou pessoas honestas, mas não tinha nada contra prejudicar grandes figuras da alta sociedade, cujas transações eram cheias de trâmites duvidosos. Sentia prazer em fazê-lo, se fosse bem honesta, porque gostava de ser mais inteligente do que pessoas inteligentes. Gostava de aplicar golpes em golpistas.

Seu primeiro furto, por exemplo, ela havia roubado uma obra de arte valiosa que também havia sido roubada, anos antes - Leo havia conseguido uma vaga para ela como assistente de cozinha em uma festa que aconteceria na casa e ela, uma vez lá dentro, improvisou. Entrou como assistente de cozinha no banheiro e saiu uma loira esplendorosamente linda, que poderia muito bem ser uma convidada dos anfitriões. Ninguém questionaria a loira cheia de joias e usando roupas caras andando livremente pela residência. Depois disso, tinha sido fácil se esgueirar até a sala com as obras de arte privadas para o público e pegar o que queria. Só a tela, que ela facilmente enrolou e depois guardou na mochila, no banheiro, quando voltou a colocar a roupa da auxiliar de cozinha. Saiu dali antes que qualquer um pudesse dar falta da peça. E quando descobriram... não podiam chamar a polícia, porque a obra roubada não deveria estar ali, porque também tinha chegado lá por meio de um furto. Era genial.

Aprendeu que colecionadores - de joias, arte, livros originais, armas, ou seja lá o que for - não ligam para como as coisas são obtidas. Só queriam ter as peças. E estavam dispostos a desembolsar uma quantia exorbitante para isso. E ela sabia fazer o serviço.

Piper sorri quando ouve a chamada para seu voo. Estava indo para Londres e, consigo, carregava só coisas básicas. Ia começar uma nova vida e, é claro, isso significava investir uma boa quantia em roupas, sapatos e joias. Era hora de se reconstruir.

East Side Story - JasiperOnde histórias criam vida. Descubra agora