A Verdade

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Julieta começa a arrumar uma pequena mala, Aurélio entra e observa a cena.

— O que faz?

— Preciso voltar ao Vale amanhã, estou com um problemas em um dos cafezais— ela mente, nem o olha.

— Julieta—ele a chama, seus olhos enfim o encaram. —O que estava fazendo no hospital hoje cedo?

—Não sei do que você está falando— digo sem olhar em seus olhos, continuo a fazer a mala, ouço seus passos se aproximar de mim, mas desviou e sentou na cama, eu continuo na inútil tarefa de dobrar as roupas e pôr na mala, fugindo do seu olhar, e de saber que eu não poderia mais esconder o que estava acontecendo.

—Alice, mãe de Ema, adoeceu do nada, em um dia ela estava rindo com Ema no jardim comendo laranjas, no outro estava desmaiada perto da cama da filha, foi o choro de Ema quem me despertou naquela manhã, eu a vi definhar e nada poder fazer, a doença que ela tinha, quando descobrimos era tarde demais para alguma cura — ele  parou de falar por um minuto, a voz embargou, lembrando do quanto sofreu, eu não ousava olhar para ele, permaneci em silêncio, sentido na ponta da língua as indagações querendo sair, ele quase nunca me falou do seu passado com a mãe de Ema, não por ter sofrido como eu com Osório, mas pelo contrário por terem se amado, e ter padecido quando ela se foi, ele continua o seu desabafo— Logo após a sua morte descobriu que por muito tempo ela sabia dos seus sintomas e ocultou de todos, porque fez isso eu nunca vou saber, talvez assim como você, ela quis nos poupar,  mas sei que por muito tempo me culpei por não ter percebido nada, por ter sido omisso, que por muitas e muitas vezes ela deve ter passado mal e eu não vi, dormia e acordava ao lado dela e nada percebia, pare por  um minuto e me ouça— seu tom elevou um pouco, apenas para poder chamar a minha atenção, sua mão segurou a minha impedindo os meus movimentos, e fazendo eu olhar para ele— Julieta, prometi a mim mesmo que jamais iria deixar isso ocorrer de novo, se está doente, não esconda de mim, te peço, estarei do seu lado, sempre.— as lágrimas que eu com todo o custo tinha segurado desceram por meu rosto, eu olhei para ele e vi o medo que sentia, seus dedos entrelaçam nos meus.—  Por favor — ele suplicou baixinho.

—Eu não estou doente— fiquei de frente para ele,  que começa a chorar de alívio, limpei suas lágrimas com meu dedos, enquanto eu ainda chorava, não conseguindo mais me controlar— Estou assustada, estou com medo—o que não chorei no consultório ao receber a notícia, nem até aquele momento, vem como uma torrente forte, minhas pernas fraquejam, meu corpo desabou para frente, sendo  amparada pelos braços de Aurélio que a põe em seu colo, seus dedos seguram com força a sua camisa, quase que a rasgando, os soluços ecoam alto no quarto, ele a ajeitou melhor em seu colo, passando um braço por suas costas, o outro agarram as pernas dela, e suavemente ele vai balançando o corpo, tentando acalmá-la.
 

Ao abrir seus olhos percebe que ainda se encontra no colo de Aurélio, cabeça em seu peito, percebe também que ele se movimentou, sentando mais no meio do cama, com as costas escoradas na cabeceira, seus braços ainda apertam o seu corpo, percebe a camisa dele molhada por suas lágrimas, o quarto mergulha na escuridão, janela aberta trazendo um pouco da luz do luar, ainda não se mexeu, mas se sobressalta quando ouve a voz dele.

— Você está melhor? — sinto seus dedos  em minhas costas, apenas balancei a cabeça concordando—Verdade mesmo?— ergo a minha cabeça, encontrei aqueles olhos azuis, carregado de preocupação, passos os dedos por seu rosto, seu nariz, a barba, seus lábios, seus olhos focados em mim, vejo a mão dele vir em minha direção e alisar meu rosto, minha cabeça repousa em sua palma, fecho meus olhos por um instante e quando os abro ainda tenho sobre mim aquele mar azul, não havia mais como me esconder, nem guardar segredo de algo que com o tempo iria aparecer por si só, respirando fundo, desço de seu colo, ficando ajoelhada na cama, entre suas pernas, a mão dele volta a tocar meu rosto, como quem diz estar ali, pronto a me ouvir, uma nova respiração profunda de minha parte, por fim eu falo.

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⏰ Última atualização: Jan 10, 2021 ⏰

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