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Um fogo devora um outro fogo. Uma dor de angústia cura-se com outra*, pelo menos para mim foi assim.

Eu nasci de um casamento arranjado, sem amor entre eles por mim, e talvez isso tenha contribuído para minha saúde ser fraca desde o nascimento. Li certa vez que vivências emocionais e corporais, se forem positivas ajudam o bebê a criar redes sinápticas, as ligações entre os neurônios ,de forma mais funcional.

Com dois anos, o hipocampo, a parte responsável pela aprendizagem e pela memória, cresce duas vezes mais rápido quando temos afeto e apoio emocional. Depois que minha irmã nasceu, minha saúde melhorou consideravelmente, aquele serzinho sempre sorria quando eu sorria e brincava com ela, segurava minha mão e parava de chorar quando eu a segurava. Aquela foi a primeira experiência de amor fraternal que eu tive, e só melhorou com a chegada de Natsuo.

Meu pai se tornou exigente quando o Shoto nasceu. Ele me obrigava a estudar todos os dias, eu tinha treino de atletismo e aulas de idioma e artes duas vezes na semana. Sempre ouvia que era para o meu bem, para me garantir um bom futuro e para que eu me tornasse o melhor. Eu não tinha interesse em nada daquilo, mas obedecer era melhor e mais seguro.

Shoto nasceu quando eu tinha seis anos e meio. Eu me encantei com seus cabelos de duas cores e olhos coloridos espertos e atentos que acompanhavam todos os meus movimentos. Mais do que Natsuo, mais do que Fuyumi, Shoto se tornou o centro de todo meu afeto.

Mesmo com as exigências dos meus pais, eu e meus irmãos éramos felizes e unidos. Eu amava o meu papel de irmão mais velho e sempre procurava fazer o melhor para os proteger, vigiava Fuyumi para ela não se machucar com as pontas e quinas, afastava os objetos pequenos de Natsuo e quando Shoto aprendeu a andar eu sempre o seguia, caso ele caísse.

Com a adolescência, as mudanças em mim começaram no âmago do meu ser, constante e poderoso como as lavas de um vulcão, e quando a pressão se tornou grande demais, os sentimentos que reprimi explodiram e mudaram para sempre a minha constituição.

Foi por volta daquela época que meu pai começou a treinar Shoto, assim como havia treinado os outros filhos. Meu irmão caçula se saiu melhor do que nós e logo nosso pai passou a exigir mais ainda dele, e nossas discussões pioraram.

Nii-san, eu preciso estudar — Meu irmão dizia quando o puxava para fora do seu quarto de estudos.

Você precisa se divertir, Shoto.

O papai vai ficar bravo quando chegar.

Deixa que eu me resolvo com o papai — Empurrei ele em direção aos nossos irmãos que estavam brincando com uma bola no nosso quintal.

Ele é muito certinho  Keigo comentou quando sentou ao meu lado  Tão diferente de você.

Hey  Cutuquei o seu lado  Eu sou certinho.

Não, não é.

Eu sabia que não era, há um bom tempo eu burlava as aulas extras e as aulas de atletismo, meu pai sempre brigava comigo, mas eu já havia passado da época de ligar.

Já estava entardecendo quando nossos pais chegaram.

Shoto! Por que não está estudando?

Pai, eu...

—Eu obriguei ele a brincar um pouco Entrei na frente do meu irmãozinho.

Volte para o seu quarto, você só sai de lá quando terminar sua lição, e você ,Toya, pare de atrapalhar o estudo dele.

Ele é uma criança! Não precisa aprender a ler latim!

CicatrizOnde histórias criam vida. Descubra agora