Em um momento eu estava lá, na minha cama, deitada sobre os cobertores macios. De pijama, eu respondia as mensagens que você me mandava - conversávamos todos os dias, sem falta, né? Harry, você e eu éramos inseparáveis, tanto na escola como fora dela.
No outro momento, eu estava logo ali. Parada, em pé, atrás de dezenas de pessoas que olhavam para você em seu caixão. Cheio de flores. Combinavam com você, Harry, seu jeito alegre. Esse mesmo jeito que me alegrava em noites depressivas - dias também. Esse mesmo jeito que alegrava muitos e invejava outros. Esse mesmo jeito que fez você estar onde está agora.
Harry. Eu te amava tanto... Eu te amo tanto.
Eu estava usando um vestido preto com detalhes que pareciam galhos negros de árvore, que ficavam em relevo, um cardigan preto desabotoado por cima e o all star que sempre estou usando. Um chapéu tapava a bagunça que o meu cabelo estava, e em sua frente, coloquei um véu para não mostrar minha maquiagem borrada - ao contrário de sua mãe, que visivelmente estava sofrendo muito e demonstrando isso com as várias lágrimas que rolavam pelo seu rosto e desfaziam sua maquiagem. Você sempre foi um ótimo amigo para me ajudar a escolher roupas... Espero não ter te desapontado com esse meu "look" , Harry. Porque, na verdade, nunca conversamos sobre a roupa que eu usaria no seu enterro.
Seu pai, aquele homem alto, muito bonito, robusto, bem musculoso, com a pele bronzeada no dia, com a barba perfeitamente feita, estava sério, mas uma lágrima conseguia escapar em alguns momentos, e logo atrás dela, outra... e outra. Depois ele enxugava o rosto com as costas das grandes mãos e retomava a sua postura.
Sua irmãzinha, pequenina de cabelos claros e olhos cor de avelã, provavelmente ficara em casa com a empregada, Dahlila, que sempre nos servia bolo e um suco feito na hora nas tardes em que eu ia a sua casa.
Eu estava mais o estilo de seu pai, tentando ficar séria, mas não conseguindo. Lágrimas e mais lágrimas escorriam pelo meu rosto todo, parecendo que cada uma daquelas lágrimas continha uma lembrança de nós - mas diferente das lágrimas, essas lembranças não saiam de dentro de mim. Essas pequenas e despercebidas gotinhas faziam minhas bochechas ficarem borradas por causa da maquiagem preta. Apertava minhas mãos (quando eu não estava usando-as para enxugar minhas lágrimas), de tão nervosa que eu estava. Eu não podia acreditar que aquilo estava acontecendo. Parecia que a ficha não tinha caído por completo. Eu não conseguia compreender que eu nunca mais o veria, por isso eu chorava tanto, mas tanto...
O impacto disso que aconteceu com você, Harry, comigo não está sendo completo. Se eu tivesse recebido esse impacto completamente, é provável que não estaria nem viva agora.
Assim que aquela aglomeração de pessoas saiu de perto do caixão, ou seja, lá pelo final da cerimônia, tentei me aproximar, já que eu estava lá atrás. Conforme eu me aproximava, minhas pernas pesavam mais, como se elas estivessem congelando por dentro.
Não consegui chegar perto o bastante para conseguir tocar no caixão se eu esticasse meus braços, mas eu estava a mais ou menos um metro de você - se é que estava lá.
Seus olhos estavam fechados, agradeci muito por isso. Eu nunca superaria o fato de ter visto seus olhos cor de mel, tão lindos, tão alegres, sem vida.
Em um momento você estava ali comigo. Falando sobre a sua vida. Desabafando.
No outro momento você estava naquele caixão, junto comigo naquele cemitério, embaixo de um céu nublado e em cima de gente morta.
Isso é demais para mim, mas eu consegui aguentar até o final da cerimônia.
Não sei o que estou fazendo. Estou desesperada. Eu não queria te perder.
Eu... estou escrevendo para um morto.
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Dear Harry
RomanceCamila demora para superar a verdadeira e forte amizade que tinha com Harry - os dois conversavam pelo celular diariamente, além de serem melhores amigos na escola -, e com sua morte ela fica com uma espécie de trauma, ainda escrevendo (em um "diári...