O dia de Miranda não estava dos melhores.
Um problema no ensaio de capa da edição e o humor da editora estava arruinado. O dia inteiro de assombro para todos da revista.
Em determinado momento da tarde a editora levantou-se para usar o banheiro. Ao lavar as mãos seus olhos rapidamente percorreram seu rosto no reflexo. Concentrou-se nos olhar vermelho, raivoso. Não era o tipo de raiva que a fazia ir em frente com mais força, que poderia ser direcionada para alavancar uma tarefa. Pelo contrário, era uma raiva que parecia mirar o foco de sua destruição para dentro, o alvo claro em si mesma.
De repente, uma sensação sufocante tomou conta da mulher. Precisar sair dali naquele instante.
Ela voltou para sua mesa e em cinco minutos escreveu um e-mail, não muito detalhado, dando plenos poderes para que Nigel, seu editor de arte, tomasse todas as decisões restantes. Assim que terminou ela abaixou a tela do notebook bom força e saiu em disparada.
"Emilly, avise ao Roy para me buscar agora. Cancele todos os meus compromissos até segunda a tarde. Não estarei disponível no celular e nem por qualquer outro meio. Isso é tudo." Miranda disparou enquanto ela mesma recolhia sua bolsa e seu casaco no armário, algo que nunca tinha feito antes na presença de uma assistente e que deixou Emilly ainda mais chocada.
Ela apertou o botão para o elevador e antes mesmo da porta abrir já estava empunhando o celular no ouvido, a discagem rápida salvando sua vida.
"Oi. O que você acha de viajar hoje?" Foi o que Emilly ouviu antes da porta fechar.
"Oi. O que você acha de viajar hoje?"
"Miriam?" Ela ouviu burburinho na linha e logo depois silêncio. "Oi... Eu não consegui ouvir direito o que você disse. Tudo bem?"
"Oi Andrea," Ela pensou por alguns segundos "eu estou saindo agora do trabalho e pensei em passar o fim de semana fora. Como as minhas filhas estão visitando a avó esta semana, pensei que você talvez pudesse querer ir comigo." A porta do elevador abriu no térreo e ela caminhou em passos largos até o carro.
"Ah, nada como ser a terceira opção." Andrea disse com um ar de sorriso quase fazendo Miranda sorrir também. Quase. "Quanto tempo eu tenho para dar a reposta? Quando você pretende sair?"
"Bem, eu estou indo para casa agora" Respondeu assim que fechou a porta do carro. "Eu gostaria de arrumar uma mala e ir direto para evitar trânsito, mas se você não puder eu posso esperar. Ou podemos ir de noite, eu posso passar para te buscar."
Pelo tom insistente Andrea percebeu que a mulher do outro lado da linha estava realmente precisando de companhia.
"Eu te ligo de volta em menos de cinco minutos dando uma resposta, tudo bem? Até já." Desligou antes mesmo de obter uma resposta.
Levou quatro minutos para o telefone tocar.
"Estou indo pra casa, devo chegar em quinze minutos. Se prometer me alimentar podemos ir quando você estiver pronta. Não consegui almoçar hoje, ia fazer isso agora na verdade."
"Então vamos fazer diferente. Vou te buscar agora, vamos para a minha casa, e de lá seguimos."
"Tudo bem. Até mais, Miriam."
Só depois de desligar o telefone ela percebeu que talvez não fosse uma boa ideia. Ela passou o endereço para seu motorista e ficou sentada, inquieta, até se dar por vencida.
"Roy, eu sei que posso contar com a sua discrição e com a sua lealdade." Ela disse olhando pela janela do carro como se alguma coisa muito interessante estivesse acontecendo do lado de fora. "Por esta confiança, eu vou pedir te pedir ajuda, algo que eu não tenho por hábito, você sabe." Ela fitou os olhos dele pelo retrovisor ao sentir o carro parar no sinal vermelho.
"Pode contar comigo, Miranda." Ele disse em seu tom bondoso e paciente de sempre. Ela meneou a cabeça e voltou a olhar pela janela.
"A algumas semanas atrás eu conheci uma pessoa em uma situação muito atípica, Roy. De uma maneira inesperada, esta pessoa se tornou a amizade mais próxima que eu já tive em anos." ela parou e respirou, tentando pensar em como prosseguir "Acontece que ela não sabe quem eu sou. Ela não sabe da revista, ela não sabe da minha influência, de como eu sou inalcançável para o mundo. Sabe apenas que eu tenho duas filhas, que trabalho demais e que gosto do meu café quente como o centro do sol." Ele sorriu, um ar de surpresa nos olhos. "A questão Roy," ela disse enquanto ele estacionava em frente ao prédio de Andréa "é que ela me conhece como Miriam, sem um último nome, e eu gostaria de continuar assim por mais um tempo. Posso contar com você?'
"Sim, Miranda." Respondeu prontamente. Com seu olhar preocupado ela entendeu o que ele queria perguntar.
"Não se preocupem, eu verifiquei todas as informações dela. Ela não está fingindo, você vai entender logo."
Em alguns minutos uma morena saiu do prédio com uma mala de mão e um sorriso largo tomou seu rosto ao ver Miranda sair do veículo. Ela não estava usando roupas de marca, nem lembrava em nada a forma de vestir das pessoas que costumavam gravitar em volta da editora. Em um movimento solto, Andrea deu um abraço firme na mulher mais velha e para espanto do motorista, o gesto foi retribuído. Miranda colocou a mala da mulher no porta malas e fechou, como se fizesse isso todos os dias.
Elas entraram no carro e ele pôde perceber que sua chefe estava visivelmente mais relaxada, mesmo que com uma tensão ainda pairando sobre seus ombros.
"Andrea, este é Roy, meu motorista. Roy, esta é Andrea."
"Pode me chamar de Andy, Roy. Muito prazer. Miriam é a única pessoa no mundo que não aceita meu apelido." Ela riu e rolou os olhos em falsa irritação, e Miranda sorriu, mesmo tentando torcer os lábios para esconder tal reação.
"É um prazer conhecê-la, Andy." Ele encontrou os olhos da editora no retrovisor. "Para casa, Miriam?"
"Sim. Depois você está livre até a segunda-feira. Ainda não decidi que horas vou para o escritório na segunda, mas definitivamente depois das dez."
Ele sorriu e logo o carro começou a se movimentar pelo trânsito. No banco de trás, Andrea e Miriam conversavam amenidades.
Realmente, definitivamente a jovem não estava fingindo. Ele estava feliz por Miranda.
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Dois Cafés (Mirandy)
FanfictionAndrea é uma jornalista que escolheu um café aconchegante como local seguro. Entre provas do cardápio e trabalhos sem fim, um belo dia ela se depara com Miriam (que, na verdade, se chama Miranda) e depois disso a sua vida nunca mais foi a mesma.