XXXIII - Trovão

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Miranda abriu a porta aproximadamente uma hora e meia mais tarde que o previsto. O aroma da mistura de alho, cebola, azeite e manteiga perfumava o ambiente, indicando que Andrea estava cozinhando.

A editora pendurou seu casaco no armário, deixou os saltos com um suspiro de alívio, a bolsa foi prontamente esquecida em cima da mesa junto ao livro.

Com passos lentos ela caminhou até a cozinha, apoiando-se no batente da porta para observar a morena em ação. 

Andrea se movia pela cozinha como quem morava ali a vida toda, como quem conhecia cada canto do lugar. A mesma facilidade com que ela se move fisicamente, ela tem emocionalmente para lidar com Miranda, a editora estava ciente disso. Andy se rendia a quase todos os seus pedidos, e quando não se rendia por inteiro, convencia a outra mulher a negociar para que as duas ficassem contentes com suas escolhas. 

Ninguém jamais havia feito isso antes. 

Ninguém jamais havia se integrado em sua vida tão rápido, com todas as respostas certas.

"Ei, você chegou!" Andrea interrompeu os pensamentos de Miranda com uma saudação aberta. Ela envolveu a editora num abraço apertado antes de dar um selinho carinhoso em seus lábios e logo voltar para perto do fogão. "O jantar fica pronto em dois minutos, eu deixei seu vinho favorito descansando."

A editora pegou duas taças e serviu o vinho enquanto Andy terminava o preparo. Não demorou até ela servir duas porções de massa fresca, com cubos de frango e legumes.

Elas comeram em relativo silêncio por algum tempo.

Entre garfadas e goles de vinho, a morena observava a mulher em sua frente, movendo-se de forma mecânica, a mente estivesse distante.

"Como você sabia o horário em que eu chegaria?" Miranda questionou descansando os talheres no prato cuidadosamente.

"Pedi pro Roy me avisar quando estivesse a caminho. Tentei te ligar algumas vezes mais cedo, mas não consegui, então deduzi que tinha alguma urgência no trabalho. Deixei as coisas preparadas para finalizar o prato quando você estivesse chegando."

"Hm."

"O que foi?" Andy franziu o cenho.

"Vi que você ligou hoje. Também te vi no seu almoço com Jacqueline Follet. Também vi que ela te ligou no outro dia." A voz de Miranda assumiu um tom gélido que Andy nunca presenciara antes. 

"E-eu não entendo onde você quer chegar com isso, Miranda. Porque você não falou comigo? Eu não te vi."

"Quando você ia me contar sobre ela, Andrea?"

"Miranda, eu realmente não estou conseguindo entender onde você quer chegar com isso. Eu nunca te dei satisfação sobre a minha vida profissional, eu nunca te falei nomes de pessoas com quem eu trabalho." Andy respondeu tentando manter a calma. "Espera - Foi por isso que você estava estanha no outro dia?"

Miranda olhou friamente para a mulher em sua frente.

"Nunca pensei que você fosse me decepcionar, Andrea, e ainda assim você conseguiu ser o maior desapontamento de toda a minha existência." 

Miranda se levantou lentamente, pegou sua taça e começou a sair do cômodo em direção as escadas.

Andy, levantando-se rapidamente e seguindo a outra mulher, disparou. "Miranda, por favor, eu não entendo o motivo de você estar tão brava comigo. Eu não fiz nada de errado, eu não te traí de forma alguma, eu só encontrei com ela por uma proposta de trabalho que eu sequer aceitei."

"Eu não quero te ouvir, não quero te ver. Por favor, saia da minha casa." A voz soou congelante enquanto ela subia os degraus com a postura exausta.

"NÃO!"

"EU MANDEI SAIR DA MINHA CASA AGORA!" Miranda se virou enfurecida, atirando a taça que estava em sua mão na direção da parede de frente a escada.

Seus olhos cruzaram com o de Andrea por alguns segundos. 

Nos olhos da editora, o ódio de uma fera. 

Nos olhos da jornalista, o medo de uma presa.

Miranda fechou os olhos e respirou fundo.  Não se lembrava de ter perdido o controle dessa forma nos últimos vinte ou trista anos. Ela se apoiou pesadamente no corrimão, parecia estar perdendo o chão.

'Vamos, respire, conte até cinco mentalmente, se acalme.', pensou.

Antes que pudesse chegar ao número três a porta da frente se fechou com a violência de um trovão.

Dois Cafés (Mirandy)Onde histórias criam vida. Descubra agora