Um ano depois
Olhei-me no espelho, conferindo se o vestido preto e branco, justo ao corpo, havia ficado bom. Chequei a maquiagem, passei um batom, e por fim, arrumei meus cabelos, jogando-o para o lado, para dar um efeito melhor ao corte long bob que eu adotei recentemente.
Quando cheguei à sala, Joice e Maria estava à minha espera. Elas dividiam esse apartamento há mais de três anos, quando começaram a trabalhar juntas, e há um ano, eu me juntei a elas. Ambas trabalhavam na matriz da mesma empresa que eu, para onde estava cedida, nesse tempo em que fazia o curso de especialização.
Era um final de semana do mês de outubro, e resolvi sair para espairecer, já que em torno de dois meses, eu terminaria meu curso e voltaria para minha cidade, apenas para preparar meu TCC, e por fim apresentar.
Durante esse tempo em que morei aqui, só fui em minha cidade uma única vez, nas férias do final do ano passado. E foi durante esses dez dias que estive lá, que cedi às investidas do Bruno, e passei a me encontrar com ele todas aquelas noites. Escondido, é claro. Longe de nossos amigos e nossa família.
*
Pegamos um táxi até uma boate, que nunca havíamos ido, mas onde nossos colegas de trabalho estavam a nossa espera. O local estava lotado, tanto dentro, quanto fora, mas entramos do mesmo jeito, e duas horas depois, eu já havia bebido mais do que devia, e o efeito do álcool estava me fazendo suar excessivamente. Juntamente a superlotação do local, eu me sentia sufocada e, confesso que, se pudesse, eu já teria ido embora. Fui para o lounge, que ficava em um espaço aberto, e me sentei em uma única mesa que estava vazia.
Bebi minha água, enquanto checava as várias mensagens do Bruno em meu celular, quando minha atenção foi desviada para dois rapazes. Um deles estava extremamente bêbado, enquanto o outro lhe segurava pela cintura, com os braços apoiados em seus ombros.
Eu ainda os observei por alguns instantes, até me dar conta de que ele havia derrubado uma garrafa de água mineral. Levantei-me, pegando-a e ao erguer meu corpo, nossos olhares se encontraram, e ele me ofereceu um sorriso tão lindo, que me deixou paralisada.
— Oi? — Sua voz me despertou, e então eu pisquei várias vezes, até me dar conta de que seu amigo bêbado, estava escorregando de seus braços.
— Hã, oi. A sua água. — Ergui a garrafa e ele bufou uma risada.
— Você pode segurar até que eu ache um lugar para largá-lo? — Pediu, com diversão em sua voz.
— Ah, desculpa... — Apertei os lábios, envergonhada e apontei para mesa, onde havia deixado minhas coisas — Pode colocá-lo ali. Estou sozinha.
— Poxa, muito obrigado. — O rapaz murmurou com alívio, levando-o até cadeira — Meus braços já não aguentavam mais.
— Pelo visto, alguém saiu do controle hoje. — Tentei soar divertida, e ele sorriu, assentindo.
— Ele está no direito... Estamos comemorando nossa formatura — Seus ombros encolheram — Quer dizer, foi em julho, mas como não tivemos festa, a turma decidiu comemorar agora.
— Hum. Parabéns! Formaram-se em que? — perguntei, enquanto o rapaz embriagado se inclinava sobre a mesa.
— Gastronomia. — Ele respondeu, me deixando surpresa.
— Nossa, que legal. Nunca conheci um... — Cerrei os olhos, tentando buscar a palavra, mas eu não sabia.
— Gastrônomo. — Ele completou.
— Então você será um chef de cozinha? — Indaguei com curiosidade.
— Há várias possibilidades, mas seguirei pelo caminho mais óbvio. Quero meu próprio restaurante... — Ele explicou, sem tirar o sorriso dos lábios, deixando em evidência a paixão que ele sentia pela profissão.
— Que incrível, pois eu não sei nem fritar um ovo sem estourar a gema — falei descontraidamente — Tento me virar na cozinha, mas olha... Faço o básico mesmo, apenas para não passar fome.
— Ah, eu amo cozinhar. Faço isso desde novo... Aliás, sou André. — O rapaz esticou sua mão em minha direção.
— Giovana. — Levei minha mão até a dele e apertei — E dizer que você cozinha desde novo, seria um pleonasmo, porque você não parece ter tanta idade assim...
— É, digamos que ouço bastante esse tipo de coisa, quando digo que pretendo ser chef... — André apertou os lábios e encolheu os ombros — Mas tenho vinte e quatro anos, mesmo que pareça ter dezoito, e cozinho desde criança. Melhor assim? — Suas sobrancelhas ergueram-se e eu assenti, mordiscando o lábio para evitar de sorrir — E você, Giovana? Faz o que?
— Bom, sou formada em administração e estou fazendo especialização em R.H., trabalho na filial de uma empresa em outra cidade...
De repente, seu celular vibrou sobre a mesa e seu olhar desviou até a tela, onde aparecia a imagem de uma garota. Ele pediu licença e atendeu a ligação, enquanto meu coração murchava por imaginar que ele fosse comprometido. O que não significava nada, pois, apesar de estar há oito meses sem beijar na boca, eu não seria capaz de dar em cima de um rapaz que acabei de conhecer.
— Bom, a namorada do beberrão está com o carro aqui na frente, então devo carregá-lo até lá. — André informou, afastando a cadeira e se pondo de pé.
— Hã, você quer alguma ajuda? — perguntei fortuitamente.
— Eu te faço um jantar, se você me ajudar levá-lo até o carro... — Ele falou com um suspiro aliviado, que me fez sorrir.
— Irei cobrar esse jantar, viu? — Brinquei, levantando-me e indo até seu amigo.
— Acredite que o prazer em cozinhar será todo meu... — André piscou, me fazendo sentir um arrepio na nuca.
Parei ao lado de seu amigo, e esperei que o André passasse os dois braços por cima dos seus ombros e erguesse seu amigo, enquanto eu ia atrás, segurando-o pela cintura e ajudando a guiá-lo. Andamos entre as pessoas, até chegar na frente da boate, onde um carro estava parado do outro lado da rua, com o pisca alerta ligado. Colocamos seu amigo dentro, e assim que a namorada partiu com ele, eu e André ficamos parados na calçada, encarando a avenida movimentada.
— Bom, então, vai entrar? — Ele perguntou, enquanto colocava as mãos nos bolsos da calça.
— Sinceramente? Não estou a fim... — resmunguei — Minhas colegas de trabalho estão lá dentro, mas esse lugar não é para mim.
— Sinto o mesmo. Gosto de coisas mais calmas. Vim apenas pela comemoração. — Ele admitiu e virou o rosto para o lado, me encarando — Quer sair daqui?
— O que você sugere? — Ergui as sobrancelhas, sentindo um nervosismo percorrer meu corpo.
— Uma volta pela cidade. Comer alguma coisa. Ir até um barzinho... — disse com casualidade, levando os olhos até seu pulso — Ainda são duas horas da manhã. Você tem hora para voltar?
— Não. — Agitei a cabeça para os lados — E você?
— Minha mãe me deixa ficar na rua até meia noite, mas hoje, excepcionalmente hoje — Ele enfatizou, mediante um sorriso — Ela me deixou chegar mais tarde.
— Olha, espero que isso seja mentira, porque eu não quero ser motivo de castigo para um menor de idade... — Eu ri, erguendo o dedo para ele, como se lhe repreendesse.
— Digamos que eu já estou de castigo por ter fugido de casa há alguns anos... — Ele piscou, me deixando confusa com seu comentário, mas não lhe questionei, apenas segui para o estacionamento da boate ao seu lado.
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Todas as razões (DEGUSTAÇÃO)
RomanceDurante três anos Giovana comeu o pão que o diabo amassou, em um relacionamento tóxico, cheio de mentiras e traições. Cansada de tudo, e prestes a passar uma temporada em outra cidade, ela pediu um tempo e estava decidida a seguir sua vida. Em sua...