5 anos antes...
Aline sempre foi motivo de chacota na universidade devido ao seu interesse em uma causa perdida: ser feiticeira. Desde o fracasso da primeira tropa de fadas enviadas para buscar aquele líquido precioso, toda a população pareceu aceitar que ficar nas montanhas era o máximo que poderiam conseguir. Era praticamente senso comum que as pessoas haviam extraído mais do que deveriam e a magia tinha entrado em extinção.
Sempre que a viam com um livro de algum feiticeiro humano do passado, não perdiam a chance de lembrarem-na do destino que conheceram as fadas da primeira tropa enviada para buscar a preciosidade. A sonhadora ficava um pouco deprimida por ter um desejo tão perigoso, porém não podia evitar de se encantar com todas aquelas ações milagrosas e sempre sonhou em ser capaz de reproduzi-las.
Quando foi estudar geologia, já sabia que era por querer encontrar magia. E quando essa vontade apareceu nas aulas, as piadas voltaram. Mais velha e mais decidida, ela se esforçou para ignorar todas. Sua admiração pela feitiçaria só cresceu com o tempo e qualquer pensamento sobre as recompensas que teria em caso de sucesso fazia todo o sofrimento valer a pena.
Por isso, ela não desistiu de procurar. Acreditava piamente que a magia era renovável, como a água. Procurou em todas as fontes possíveis, tentando descobrir onde seria mais provável de encontrá-la, e descobriu algo que poderia estragar todos os seus planos.
Aquele líquido encantado era encontrado em lagoas calmas, coisa que não existia nas montanhas. Ela teria que sair da proteção que era a cidade isolada das fadas e enfrentar a possibilidade de encontrar humanos novamente. Isso era aterrorizante para qualquer traumatizado pelo passado de seu povo tão maltratado pela escravidão, mas não para Aline. Ela sabia que conseguiria beber magia antes das pessoas e então ninguém teria a menor chance contra seu poder. A fada já conseguia se imaginar fazendo diversos experimentos para manipular magia e tornar-se uma feiticeira mais habilidosa, e isso era tão empolgante!
A conclusão de todo esse raciocínio fê-la acabar dependurada em uma nascente de cachoeira no alto de uma montanha, quase caindo. É claro que Aline poderia bater suas asas e voar para longe se quisesse, todavia, fazendo isso jamais encontraria o que procurava. Aquela cachoeirinha se transformaria no rio Rivié, que desembocava em uma lagoa onde ela acreditava haver magia acumulada. E se ela não conseguia chegar lá, pegaria as gotas preciosas antes que elas o descessem.
Nem com a visão mais aguçada do mundo ela conseguiria ver uma gota de magia caindo em meio a várias feitas apenas de água. Porém, por um momento, a fada se iludiu o suficiente para pensar que tinha tal capacidade e simplesmente largou a pedra em que se segurava e começou a cair até fazer uma linda manobra e começar a voar atrás do que acreditava ter encontrado.
Quando imaginou alcançar o ponto onde estava o prêmio, pousou tão rápido que chegou a raspar a perna em alguma pedra. Aline praguejou ao ver que o joelho estava sangrando, entretanto sua expressão mudou da água para o vinho quando percebeu que, depois muito tempo já dentro d'água, o machucado cicatrizou magicamente. Oficialmente a magia era renovável e, um século depois da busca fracassada das fadas da primeira tropa, ela estava ressurgindo.
Tendo agora a descoberta chave, a fada compilou tudo em um livro para ajudar a divulgar sua pesquisa e conseguir o orçamento necessário. Para sua surpresa, foi um sucesso de vendas. Todas as vezes em que simplesmente ignorou quando riam de sua tola ambição davam frutos naquele momento. Aquela conquista foi a prova de que todos aqueles que caçoavam dela estavam errados e ela poderia sim ser uma feiticeira.
Graças a fama adquirida, foi convidada para ver o reitor da universidade. Provavelmente a ideia era que ela fosse buscar magia para enfeitiçarem as nuvens. O fato de que a cidade humana mais próxima distava 100 quilômetros da lagoa do Rivié tranquilizou-a quanto a segurança da expedição na qual embarcaria. Já conseguia sentir o sabor da magia em seus lábios e o poder que teria quando se tornasse uma feiticeira.
Claro que usaria parte dele para ajudar seu povo a ficar seguro, como o reitor exigiria. Fazendo assim, um bem a si e a toda a sociedade. Já via os poços de extração serem instalados, com moderação, para não consumirem tudo como os humanos outrora fizeram.
A pesquisadora só tinha a agradecer a fama que a sorte trouxera para ela. Pensava que talvez todo esse apoio popular pudesse ser uma forma do destino de comunicar que tudo daria certo e a conclusão cobriu-a de confiança. Em seu encontro com o reitor da universidade e a pró-reitora de pesquisa e extensão era possível sentir cada partícula do orgulho e certeza, que ela exalava e, posteriormente, da decepção tremenda.
- Srta. Aline, reconhecemos que você foi excelente em sua formação na geologia. Suas pesquisas contribuíram bastante para essa ciência e devemos muito a você, porém essa missão é muito perigosa. - afirmou o reitor – Então eu decidi que você deve ir acompanhada de alguém para a sua segurança. Essa é a Oficial Hilda. - disse apontando para uma fada no canto da sala em quem Aline não percebera até então – Ela acompanhará você para proteção em possível ataque de humanos.
- Mas por quê? A cidade mais próxima habitada é a 100 quilômetros da floresta! - ela falou indignada por subestimarem suas habilidades
Pegando magia para morar nas nuvens ela poderia ser uma feiticeira como sempre sonhou e também uma grande heroína. Seria um prazer tremendo esfregar na cara daqueles que duvidaram de suas ambições que elas tinham sim futuro e ainda gozar de prestígio como salvadora da pátria. Já acompanhada, teria que dividir a glória com alguém.
- Que garantia você tem de que nenhum humano iria àquela região? E que garantia há de que o rio não levou seus resquícios para alguma cidade deles e seguiram o trajeto como você pretende fazer? - o reitor respondeu, sem parecer se importar com aquela falta de respeito
Ouvir argumentos tão lógicos fez Aline compreender que estava deixando o egoísmo dominá-la. Percebeu que estava mais empolgada com a possibilidade de voltar como grande heroína das fadas do que com os estudos que poderia fazer quando tivesse a magia em mãos.
Ela bufou irritada, torcendo para que no final não precisasse de ajuda de nenhuma fada para proteger-se dos humanos. Principalmente se ela realmente conseguisse encontrar uma quantidade suficiente de magia para beber e fazer grandes feitiços.
- Então meu projeto foi aprovado? - perguntou ela, tentando pensar no lado positivo de tudo aquilo
- Sim. Basta enviar os documentos necessários para a pró-reitoria de pesquisa e extensão. Boa sorte em sua missão – respondeu o reitor Geraldo com um sorriso
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A grande fuga de Cinderella
FantasíaE se a Cinderella sofresse discriminação por ser metade fada? E se a Fada Madrinha quisesse levá-la para morar com as fadas e fugir do preconceito? E se ela negasse para ficar com o príncipe? Após fugirem da escravidão, as fadas decidem viver nas mo...