14. Nas Nuvens

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Quando Ella pisou nas nuvens à primeira vez, a sensação foi muito esquisita. Fazia tempo que ela não voava e a garota estava praticamente acostumada a ser uma fada mutilada. Há anos vivia como humana, e entre eles essa habilidade nem era necessária.

Entretanto, todo o conforto que ela pudesse ter com o novo corpo foi embora quando viu que estava pisando em vapor d'água. Imaginando que ia cair, tentou bater as asas e salvar sua vida. Lembrando que não as tinha mais, tentou bater os braços em desespero até finalmente ser acalmada por Aline.

- Relaxe, você não vai cair. - a fada tentou tranquilizá-la – Esse chão foi reforçado com magia. - disse com admiração evidente – Foi para isso que eu e sua mãe trabalhamos por tantos anos. É uma pena que ela não pôde ver o resultado... - disse um pouco abalada

- E agora? Para onde nós vamos? - perguntou a mestiça, ainda tonta

Ao ouvir essa pergunta, a alegria no rosto de Aline foi embora. Rogério tinha razão, ela não poderia ficar com a menina para si. O único com algum direito de guarda naquele amontoado de nuvens era o bisavô dela. E, infelizmente, era sua missão providenciar o reencontro. Já sentindo saudades antes mesmo da despedida, ela evocou o feitiço de localização novamente.

- Vamos seguir essa linha, ela levará você até seu bisavô. - orientou a mais velha

Ao ouvir isso, Ella se empolgou bastante. Por mais que a família à que seu pai tinha apresentado-a tivesse causado um grande sofrimento nela, era natural a menina ansiar por conhecer mais sobre suas origens. Teve uma visão tão limitada sobre o universo das fadas durante a infância que às vezes esquecia-se da existência de parte dele em si.

Correndo o mais rápido que conseguia e tentando não olhar para baixo, a trilha mágica foi seguida pela bisneta. Se ela não estivesse tão focada em encontrar seu mais novo parente, teria percebido a enorme quantidade de olhares feios que recebia. Aline, que a seguia como podia, prestou atenção em cada um deles.

Ao chegar em um crematório, a mestiça entendeu o que o encantamento queria dizer e começou a chorar. Já não restava família que a acolhesse, apenas Gisele e seu ódio às fadas. Ella estava só. Vendo a mais velha se aproximando e também compreendendo a situação, a garota deu-lhe um forte abraço na única aliada que a vida manteve com ela.

Porém seu choro foi interrompido com o crescimento de algo estranho em suas costas. Ela tentou virar-se e descobrir o que era e, apesar de não ter uma visão plena, conseguiu perceber que eram asas novas feitas de magia. Ela olhou para Aline e finalmente sorriu.

- Talvez demore para você se acostumar com a prótese, nem tente voar agora. - disse a fada emocionada – Sabe, nós fadas acreditamos que nossas asas não são um problema a ser consertado. Uma fada mutilada andando por aí atrai muitos olhares feios.

Simplesmente ignorando as orientações recebidas de tão animada que se encontrava, Ella tentou voar pela primeira vez em anos. Porém, toda vez que conseguia erguer-se caia logo após.

- Uma hora você consegue, não se preocupe. - incentivou Aline – Agora temos que ir ao abrigo. - completou, já quase sem vontade

A mestiça chegou no local tão desanimada quanto qualquer outra criança sem esperança de ser adotada. Afinal, ela já tinha 15 anos e quase ninguém procurava fadas tão velhas para chamar de filhas. Mal sabia ela que a baixa chance de adoção seria o menor dos problemas.

Quando foi apresentada como filha de Hilda com um humano, a adulta presente não pareceu acreditar muito naquela história. Já as outras crianças, que tinham uma tendência maior em acreditar nas coisas fantasiosas, se empolgaram na hora e encheram a com uma calorosa recepção.

A grande fuga de CinderellaOnde histórias criam vida. Descubra agora