"Mãe Preta" está parada de frente ao santuário feito por suas próprias mãos, para seus santos. Ela pede à sua mãe Oxum pelo seu filho Capitão, que foi ferido gravemente com um tiro pelas costas pelos "Volante" chefiados pelo Capitão Goiana, promovido de patente, por causa dos cangaçeiros que matou.
O que não eram poucos.
Quando Goiana era sargento, matava e jogava a culpa no cangaço. A cada dia mais policiais chegavam no sertão para fazer frente ao cangaço.
Inclusive o exército nacional foi convocado, para deter o aumento da violência no nordeste brasileiro, devido a matança ocorrida há cinco anos atrás, na casa do Dr. Esmeraldo.
E devido a esses fatos, o sargento pulou para capitão em pouco tempo. E quando isso aconteceu, a cidade de Luzeiros foi fechada pelos militares e dezenas deles atiraram para cima, comemorando o feito histórico.
Até o governador do Estado de Pernambuco estava fazendo as honras ao maior militar do sertão. Porém, só para constar... Havia um homem que Capitão Goiana não queria conversa: Era o prefeito chamado carinhosamente pelo povo: de "Seu Paizinho".
"Seu Paizinho", era um homem alto e branco. Dono de várias lojas que vendiam peças de pano para roupa. O atual capitão sabia que o prefeito acoitava na surdina cangaçeiros do naipe de Lampião e Curió.
Porém, as frentes de balas do lado do prefeito ainda eram maiores que a do capitão. Como leram... Ainda eram maiores.
Mãe Preta sente algo de ruim no ar. Igual daquele dia que trouxeram o garoto ferido, e que logo depois de alguns meses sumiu, deixando o coração do Capitão de pai em pedaços.
O Capitão e esposa se afeiçoaram tanto ao menino como se fosse um filho. E durante várias noites pedia para ela, Mãe Preta, rezar na cabeça do menino enquanto dormia.
—Não há para o que rezar. — Repete "Mãe Preta", se lembrando dessa e de outras frases. —O menino é véio. Já nasceu grande.
Fogos de artifícios são lançados para o céu. O capitão Goiana descobriu o esconderijo do outro capitão e está chegando para invadir.
"Mãe Preta" senta na sua cadeira de balanço e começa a se balançar cantando uma canção muito antiga... Da sua época.
A idosa mexe constantemente sua cabeça, parecendo se assustar a cada grito ouvido e a cada tiro que alcança seu alvo.
A casa de "Mãe Preta" fica no lugar mais alto do esconderijo. Por trás das duas rochas de puro granito.
A casa da senhora zeladora dos Santos tem vinte metros quadrados, por oito metros de largura. Um quarto, uma cama de palha e um banheiro.
No meio da sala, um tapete feito da palha de côco, com um metro e meio de largura por dois de comprimento.
Na parede que separa o quarto da sala e do banheiro, encontra-se o altar com esculturas feitas por "Mãe Preta" dos santos católicos e do candomblé. Todos juntos. Como uma paróquia.
O temível silêncio acontece. Um brado de felicidade é ouvido dentro casa. As vozes eram desconhecidas dos ouvidos de "Mãe Preta".
Os homens do Capitão errado ouvia-se lá de baixo, como se estivesse subindo dos infernos.
" — Nós não somos cães! Nós não somos hereges! Nós somos os Volante! Aqueles que matam os desordeiros e vingamos a justiça!"Novo brado de dezenas de vozes é ouvido. "Mãe Preta" escuta as dezenas de pares subindo na direção da sua casa, e se senta na sua cadeira de balança. Se vai morrer, vai para o outro com dignidade.
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ALMA LUPINA - "Venha, entre e sirva-se" - Lançado em 24/03/2021
HorrorSete mulheres. Uma loba. Uma Alma. 1934. 24 de Dezembro... Natal. Um pai viúvo e preso na cadeira de rodas recebe uma visita inesperada. Uma criança, no pior dia da sua vida, conhece uma Loba azul que se tornará sua melhor amiga. Morte...