Caminho

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Na estrada, o movimento, o vento e o ressentimento que volta a aparecer.
Estou andando sem rumo, um pouco arrependida, mas preciso da caminhada para transparecer.

Paro um pouco para respirar e consigo sentir o cheiro verde das plantações.
Preciso arrumar tudo aqui dentro, consertar esse emaranhado de emoções.

Gostaria de saltar daqui, queria sentir meu corpo junto da grama, mas o muro não me deixa atravessar.
Muro esse que eu mesmo construí, na esperança de que ninguém pudesse me fazer desmoronar.

No meio do campo, uma única árvore solitária, a última que vai florescer.
Me pergunto se o caminho para tudo aquilo foi árduo, continuar de pé enquanto tudo ao redor começava desfalecer.

No jardim flores brancas que enfeitam a passarela e no meio delas só uma se destaca para quebrar o padrão.
Uma flor de lótus, a beleza mais genuína, o interior intrigante que afetou minha percepção.

Ando ocupando a mente, gastando energia, tudo isso na intenção de não ter tempo para sentir dor.
A minha consciência não me deixa distinguir se esse lugar é assombroso, ou se é acolhedor.

O ponto alto do dia, o consolo de fim de noite, a casa que está maior agora, e o céu, o retrato da desilusão.
O aperto no peito e a mágoa não são suficientes para vingar as palavras que proferi em vão.

O abraço apertado que me enlaça, o calor que transpira do meu corpo e por um instante eu gostaria que o tempo parasse.
Penso que fiz um alarde enorme por coisas fúteis que ficaram no passado, mesmo sem querer que tudo aquilo voltasse.

A sensação de desalento que dá lugar a melancolia.
A sensação de abandono que dá lugar a frustração.
A dor no peito, o despertar para vida.
Os falsos deuses, o esfolar da carne, instrumento de adoração.

Eu sou mais de uma agora, e essa voz que chama por mim não quer me deixar descansar.
A voz da indecisão, como um vírus que se espalha, com um único propósito de me fazer pensar.

Pensar no que estou fazendo, e se tudo que eu já fiz um dia está certo.
Pensando sempre no meu passado, já que meu futuro é tão incerto.

E a sequência não acaba, o tempo passa e foi embora tudo que eu conhecia.
Aquela árvore morreu, o campo já não é mais verde, e as flores não exalam mais alegria.

A cada dia tudo morre e somos obrigados a nos adaptar com essa repetição.
Dia após dia tudo se repete, somos controlados pela morte e consolados por uma superstição.

A pressa que eu tenho para crescer me incentivou a cair nessa perdição.
Tem uma parte de mim que corre atrás dos seus desejos, e a outra que cede a oposição.

Vou fugir dessa voz que grita em desespero, fugir da melancolia que com a tristeza se assemelha.
Dar o veneno para não morrer envenenado, controlar para não ser controlado, ser o lobo e não a ovelha.

Agora vou apagar a luz, tenho que deixar tudo de lado.
Vou me acostumar com o escuro, aceitar que tudo está acabado.

Poesia DisfóricaOnde histórias criam vida. Descubra agora