Capítulo Catorze

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Observava com atenção o papel de parede vermelho velho que se encontrava na sala de estar da minha casa. O cheiro que me envolve é reconfortante, no entanto péssimo pois parece que alguém despejou um frasco de perfume no tapete branco.

Para ficar mais confortável, deito-me no sofá castanho de couro que se encontra encostado a uma parede em frente à televisão. Deixo o meu cabelo espalhar-se sobre o braço do sofá, enquanto relaxo ligeiramente todo o meu corpo a olhar o teto. Nunca me apercebi, mas há restos de humidade presentes no teto.

O tic-tac constante do relógio pendurado na parede impede-me de estar num estado totalmente relaxado. Desvio o olhar para o mesmo, e verifico que faltam exatamente dois minutos para as quatro horas da tarde. Estou estranhamente ansiosa, e o motivo que para mim é desconhecido, está-me a deixar terrivelmente desconfortável.

Volto a olhar o relógio e noto que já passaram quarenta e quatro segundos desder que tivera desviado o olhar. A minha respiração está acelerada e sinto que os meus olhos estão arregalados. Não tenho noção do que se está a passar, mas não estou com um bom pressentimento.

Mais trinta e seis segundos foram à vida, e eu encontro-me a morder o lábio com certa força e a fechar as mãos em punhos. Direciono novamente o olhar para o relógio e faltam já doze segundos para as quatro. O meu olhar não se move do relógio, e vejo o ponteiro dos segundos avançar lenta mas rapidamente.

Três segundos...

Dois segundos...

Um segundo...

Assusto-me quando a porta se abre. Levanto-me rapidamente e espreito vendo o meu irmão. Suspiro de alívio, pois estava ansiosa por nada.

Todo o alívio que anteriormente sentia, desaparece assim que quatro homens vestidos de branco caminham até mim. Arregalo muito os olhos e ando lentamente para trás. Não sei porque vêm eles atrás de mim, mas quando olho de relance para o meu irmão ele está a morder o lábio nervosamente e com o olhar fixo no chão.

Durante os meros segundos em que estive a olhar para ele, foi o tempo suficiente para que os quatro homens me conseguissem agarrar. Tocar.

Debato-me contra eles o máximo que consigo e mexo-me freneticamente para que me larguem. Eles recusam, pois as suas fortes mãos apertam-me mais e arrastam-me para fora de casa. Quando passo pelo meu irmão, ele olha-me com olhos lacrimejantes e eu leio-lhe nos lábios "Desculpa-me" inúmeras vezes. Abano negativamente a cabeça tentando ignorar o facto de o meu próprio irmão me ter entregue.

Sem parar de me debater para conseguir que eles me larguem, já me encontro fora de casa. Várias pessoas param na rua para verem o que se está a passar, e se eu não estivesse preocupada em tentar lutar pela minha liberdade estaria irritada por as pessoas serem tão curiosas.

No amontoado de pessoas que se juntou à volta de minha casa, e de uma carrinha branca, eu reconheço um penteado. Penteado aquele que jamais algum dia serei capaz de esquecer. Não só reconheço o penteado, como sei de imediato a quem ele pertence.

O seu famoso cabelo cacheado com a sua tão conhecida bandana está-lhe a assentar perfeitamente na sua cabeça, a sua camisa tão bem no seu corpo forte e musculado enquanto que passa por mim rapidamente, sem me olhar. Não lhe consigo ver a cara, e o pouco que vi dos seus membros superiores revelaram-me que ele está diferente de todas as outras vezes. Todos os seus piercings e tatuagens desapareceram, e está apenas... "Ele" no seu estado normal.

Deixo de o ver a partir do momento que me fecham na carrinha, onde tudo é branco por dentro e por fora. Não há uma única janela que seja capaz de me dar visão para aquele ser maravilhoso, e eu estou-me a sentir fraca por isso. Não totalmente só por esse motivo, mas principalmente. Limito-me a pensar nele e no pouco que vi dele. Em como ele passou por mim, e sem abrir a boca ou olhar-me, disse-me tudo. Posso também estar errada e não ser ele. Mas...

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