Capítulo 14 - O significado das coisas

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Killian caminhava em torno da lagoa, com a ansiedade a pesar-lhe os passos. A nebulosidade do dia anterior concentrara-se sobre a água, não se arrastando muito para além do limiar definido pela Hajmaná. O espaço parecia bem mais preenchido de verde do que ele se recordava, mas sabia que não se tinha enganado no percurso até ali. As memórias do que lhe era novo fincavam fortemente dentro dele.

No ar, o general continuava a sentir a carga intensa da vida. A humidade grudava-lhe na pele, já levemente bronzeada pelo efeito do sol, tão presente dos últimos dias. As botas suplentes tornavam o seu andar mais firme sob a terra.

O pensamento inquietante de que a nativa não viria cobria-lhe as feições. O rosto sério, fechado, com a hipótese de ela ter-lhe escapado por entre os dedos, e nunca vir a descobrir mais sobre quem e o que ela é. Cada decisão tem uma consequência, e talvez essa fosse a dele, por não ter batalhado mais por respostas, naquele primeiro encontro. Porém, ele não seria capaz de o fazer, de a encurralar para seu interesse próprio. Seria deselegante da sua parte, para não dizer desumano.

Com as pernas cansadas dos movimentos repetitivos, Killian sentou-se sobre a relva, na proteção da sombra de uma árvore. As folhas dos ramos baixos esticavam-se para lhe tocar no topo da cabeça, mas os fios castanhos mantinham-se intactos.

Leve como uma pena, Nileya aproximou-se do general e sentou-se do seu lado. A naturalidade dos seus gestos apanhou o homem desprevenido, que, de olhos presos no distante, demorou a perceber a presença da jovem. Os cabelos brancos esvoaçantes, no ar sereno da tarde, fizeram-no voltar o rosto surpreendido.

‒ Você veio...

A nativa sorriu-lhe, feliz por ele estar na mesma sintonia que ela. Ambos estavam ansiosos por aquele encontro. O homem ajeitou o corpo sobre a grama, de forma a ficar sentado de frente para ela.

‒ Acho que saltámos uma parte importante no outro dia. Não sei como te chamar.

‒ Nileya, meu nome é Nileya.

‒ Nileya... ‒ Killian tentou repetir a palavra de sonoridade peculiar. ‒ É um nome... diferente.

‒ Significa "rio que corre" ‒ explicou num tom de voz sereno, paciente. ‒ Nile-ya.

‒ Eu sou Killian ‒ apresentou-se, levando a mão ao peito.

‒ Kill-ian ‒ pronunciou a garota, separando os dois sons. O seu semblante tornou-se pesado, de repente, como se visse no nome dele um Destino trágico. O general perscrutou-a preocupado, sem perceber o que a tinha afetado tanto. ‒ "Sombra que mata". ‒ A tradução era feita com uma mistura dos conhecimentos de sua própria língua com o inglês. Para ela, todos os nomes significavam algo e aquela foi a forma que arranjou de dar sentido ao desconhecido.

‒ Não sou perigoso. É só um nome. ‒ Ele estendeu o braço para lhe acalmar com o toque, já que as palavras pareciam não fazer efeito sobre a nativa petrificada à sua frente. Mas logo recolheu-o, ao vê-la retesar-se. ‒ Uma escolha infeliz dos meus pais, aparentemente.

‒ Foram seus pais que deram seu nome?

Ali estava a ponte entre os dois, a curiosidade sobre o mundo um do outro. Killian percebeu que isso o salvara de um desentendimento que os poderia afastar definitivamente. Seus músculos relaxaram um pouco com a esperança de um melhor rumo para os dois.

‒ Sim. De onde eu venho, é assim que se faz. Como arranjou o seu?

‒ Virsari consegue ver além. Ele comunica com os Deuses para saber como cada recém-nascido deve ser chamado.

‒ Um povo que vive na floresta, no meio dos animais, e que é governado por vários Deuses? ‒ Ele fez uma longa pausa para conseguir assimilar tal cenário. ‒ Isso é incrível!

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