Capítulo 10 - O outro lado

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O caminho tornara-se estreito. Um passo em falso e Killian cairia no rio que seguia, lado a lado, com ele. Sem nunca ter tido a oportunidade de aprender a nadar antes, o desfecho não seria dos mais favoráveis. Todo o cuidado era pouco.

A mão direita roçou no tremendo aglomerado rochoso que rompia da terra. As árvores tinham sido deixadas para trás. Naquele lado da margem, o verde eclipsara-se na totalidade. Ali, seus homens não teriam madeira para cortar. 

O general explorava o terreno, sozinho. Dizia para si mesmo que era para trabalhar em duas frentes. Enquanto os soldados construíam a cerca, ele estudava potenciais pontos de interesse. Mas o tempo afastado de Jofrey e suas imposições estava a saber-lhe muito bem. Ele já sentia todo o corpo, tenso de dois dias intensos a trabalhar na madeira, a relaxar gradativamente, por cada passo dado.

Ele sempre se habituara a receber e acatar ordens, essa não era a questão. A verdade é que ele não conseguia ver um superior respeitável, de confiança, em Jofrey Rayne.

Killian estacou para analisar a largura do caudal do rio. O curso parecia estar a apertar-se mais naquela zona.

Ele arregaçou as calças até aos joelhos e sentou-se na beira, mergulhando uma perna de cada vez. A água fria fez com que ele se contorcesse. A pele quente do sol escaldante, mesmo que antes escondida pelo tecido, arrepiou-se. Numa nova investida, ele agarrou-se ao solo e jogou o corpo mais para a frente. Mesmo com as botas, que lhe cobriam os pés até os tornozelos, Killian percebeu que palpava terra e sorriu. Fazendo um semicírculo com os dois pés, ele percebeu a extensão ampla do terreno debaixo de água.

Despregando uma das mãos, ele levantou-se, sentindo a água a cobrir-lhe as pernas só até onde o tecido começava. A corrente não era muito forte, mas ele sentia a água a contorná-lo com alguma pressa. Ao largar a outra mão, ele começou a avançar. Não era como caminhar no solo exposto ao ar, era mais moroso, mais escorregadio. A aderência das solas das botas ajudava-o a fincar o piso com mais segurança.

Os músculos contraiam-se com o esforço desmedido e o receio subia com o nível da água. A meio do trajeto, a água já lhe chegava à cintura. O tecido pesava-lhe em volta das pernas. Ele ponderou voltar para trás, só voltar ali quando estivesse acompanhado, mas ao olhar para o outro lado, aquele que lhe era ainda desconhecido e lhe prometia tanto, ele agarrou-se à sua obstinação.

Para sua sorte, o terreno submerso começou a elevar-se até à margem. Era como se estivesse numa enorme vala encoberta. O general sentiu a água a descer cada vez mais, à medida que prosseguia.

Ao chegar à margem, Killian usou os braços para alçar o corpo para fora de água. Por precaução, tirou uma perna de cada vez. A precipitação não o ajudaria numa altura como aquela.

Ele sacudiu os membros inferiores e torceu o tecido enrugado das calças o máximo que conseguiu. A água escorreu-lhe pelas pernas já molhadas, como numa torneira. As botas não eram impermeáveis, ele conseguia sentir os pés molhados debaixo do material ensopado.

Ao erguer o rosto para o terreno enorme à sua frente, ele viu as mesmas árvores, os mesmos arbustos rasteiros, a mesma terra húmida. Se houvesse alguma novidade, ela estava muito bem escondida.

Sem perder tempo, Killian começou a trilhar aquele lado da mata, tentando não se afastar muito do rio. Ele tinha um bom sentido de orientação, mas qualquer um se perderia nas entranhas repetitivas de uma floresta. Os padrões multiplicavam-se infinitas vezes. Era complicado achar um ponto que diferenciasse o perímetro que se percorria e aquele que o antecedeu. Ele olhava por sobre o ombro para se certificar que o rio continuava lá.

Os pés pisavam a terra com força. O barulho dos pequenos galhos, que se iam despedaçando à sua passagem, perfurava o silêncio atroz. As marcas das botas, impressas no solo, seriam a sua bússola.

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