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Todos os meus garotos estavam cheirosos e com o cabelo molhado, bem-vestidos e prontos para o que quer que Rita estivesse planejando. Pedro, claro, havia dado um pulo de susto ao ver Raissa parada no sofá, mas disfarçou com um sorriso. Depois das sete, a campainha tocou três vezes. Pulei do sofá, onde todos no momento se encontravam, e corri até a porta da frente. Rita segurava cinco caixas de pizza, e trazia uma sacola nos braços. Atrás dela, Clara sorria largamente, carregando uma enorme caixa de... alguma coisa. E atrás delas, um garoto. Ele tinha a pele clara como Rita, mas o cabelo e os olhos escuros de Clara. O garoto era alto, é muito bonito, com um ar jovial rodeando suas bochechas coradas.

— Olá. Sejam bem-vindos.

Saí da frente para que todos entrassem, e então percebi que o garoto trazia algo nas mãos também. Mais sacolas, e... jogos. Os três entraram cumprimentando à todos os que estavam dentro da sala. Apresentamos cada nome, com uma descrição breve sobre os pontos principais de cada um. Quando chegou na vez do moço novo, minha curiosidade apitou.

— Esse é o Rafa. Ele é meu irmãozinho mais novo.

Clara disse, surpreendendo a todos. Mais novo? Pelo o que eu conhecia dela, ela estudava no primeiro ano de enfermagem na mesma faculdade que nos. Tinha dezoito anos então... ele devia ter menos. Mas parecia ter a idade de qualquer outro ali...

— Certo, vamos começar com o salgado!

Rita pronunciou animada, antes de organizar as caixas de pizza em cima na mesinha de centro. Ela abriu algumas enquanto Daniel escolhia um filme na Netflix. Toni e Pedro saíram para buscar mais cadeiras, Rafa rapidamente se prontificou para ajudar. Quando todos voltaram e se acomodaram, finalmente começamos a comer, usando pratos de plástico que eles haviam trazido.

— Depois me diga quanto ficou tudo isso. — Meu irmão disse para Rita.

Passei os olhos pela pilha de comida, e senti meu coração se encher de alegria. Era muita coisa, e Rita havia conseguido reunir tudo aquilo em menos de uma hora. Era de fato, a garota mais maravilhosa que eu conhecia naquele momento. E por falar em maravilhosa, ela sorriu, e respondeu:

— Não foi nada.

Antoni, que estava sentado ao lado dela no sofá, reclinou levemente o ombro na direção dela, e brincou:

— Me deixe pelo menos te levar para jantar.

Ela riu, mas meu irmão fechou a cara. Com medo de que qualquer coisa pudesse estragar a noite incrível que tínhamos pela frente, me levantei e peguei o primeiro jogo da pilha de tabuleiros. Ótimo, meu maior terror no mundo dos jogos... imagem e ação. Mímica, era esse o meu problema. Mas antes que eu pudesse trocar correndo de ideia, Daniel pegou o jogo das minhas mãos e ergueu triunfante.

— Eu amo esse jogo! Meninos contra meninas?

Raissa cruzou os braços indignada.

— Assim vocês teriam um a mais.

Franzi a testa analisando a conta por um segundo.

— Somos um número ímpar, um time sempre vai ter um a mais... — Corrigi.

A cara de surpresa de Raissa foi tão genuína, que todos caíram na risada. Quando as gargalhadas diminuíram, Matheus exigiu um consenso.

— Vamos jogar nos seguintes times: as pessoas da casa contra as visitas. O que acham?

Alguns sinais de positivo depois, dividimos a sala ao meio, sentando um time de cada lado, e o jogo em cima de um banquinho bem no centro. Toni se ofereceu para embaralhar as cartas com as palavras, mas Pedro tomou seu lugar, alegando que ele não possuía habilidade o suficiente. Que habilidade? Muito simples, Pedro embaralhava cartas como um mestre. Seus dedos longos e finos se moviam na velocidade da luz, e minha barriga se enchia de borboletas com o movimento. Um calor estranho se espalhou dentro de mim, quando seus olhos encontraram os meus.

Eu tenho olhos claros, azuis como os de Matheus, e a maioria das pessoas acha lindo. Cresci com as pessoas elogiando a mim e a meu irmão, dizendo o quanto éramos sortudos por ter puxado os olhos de nossa mãe. Mas eu de fato nunca havia entendido essa obsessão que as pessoas tinham por olhos claros. Nunca vi tanta graça, nunca achei tão lindo quanto achava aquele par de olhos castanhos. Porque era aquela cor, profunda e escura, altamente misteriosa que fazia meu corpo todo ferver. Era aquele par de olhos considerados "sem graça" por tantas pessoas, que faziam meu mundo girar daquela forma. Tive que piscar algumas vezes para quebrar o encanto, e pela primeira vez, senti que Pedro sabia o que eu sentia.

— Certo, já que temos mais gente, começamos.

Ninguém negou quando Daniel se levantou da cadeira e pegou uma carta. Com calma, ele leu o conteúdo, e então a ampulheta foi virada. Meu amigo se afastou, e com toda a graciosidade que não tinha, começou a bater os braços como um louco. Fui a primeira a gritar:

— Pássaro!

Daniel balançou a cabeça em negação.

— Coruja— Antoni gritou.

— Coruja é um pássaro criatura! — Meu irmão bradou irritado.

Matheus sempre ficava irritado em jogos de competição, porque ele simplesmente não sabia perder. Daniel parou de bater os braços, e começou a se afastar. Então, correu e pulou, voltando a bater as asas.

— Avião! — Gritei.

O cozinheiro fez sinal para que eu comtinuasse, porque provavelmente eu estava no caminho certo.

— É... piloto? — um não vindo da cabeça — Pouso? — Mais um não com a cabeça.— Decolagem? Decolar?

Daniel ergueu os braços em vitória enquanto comemorava com um "isso" bem alto. O time adversário vaiou de brincadeira, enquanto Matheus fechava a cara. Nada de brincadeira por ali.

— Que tipo de avião bate as asas?

Daniel deu de ombros se sentando na cadeira ao meu lado.

— Você é uma gênia — Murmurou.

As duas horas seguintes foram baseadas naquele jogo insano, que renderam muitos gritos e risadas. No fim, o time da casa ganhou, e Matheus exibiu um belo sorriso até o fim da noite. As pizzas acabaram, os refrigerantes foram esvaziados, os doces e o bolo devorados em minutos. Nenhum de nós acreditou quando Clara conferiu o relógio, e eram quase uma da manhã. Conversas, risadas e um filme depois, começamos a nos despedir, e infelizmente a sala terminou vazia. Olhei para trás, apenas para constatar que os garotos haviam me deixado sozinha na arrumação. Ótimo.

Tranquei a porta e andei até a sala, já catando todo tipo de lixo que encontrei no chão. Quando minha coluna quase cedeu, joguei os que tinha na mão e sai para procurar um saco, afim de facilitar meu trabalho. Assim que voltei, para meu alívio, encontrei Pedro no meio de tudo.

— Oi. Desci pra te ajudar.

Eu não sabia se ria ou se o abraçava. No fim, não fiz nenhum dos dois. Ele pediu que eu abrisse o saco, para que ele jogasse os lixos dentro, então obedeci. Fiquei parada na frente de Pedro enquanto ele se abaixava e se levantava para jogar as coisas no grande saco. Parecia muito mais lixo do que comida.

Quando terminamos, ajeitamos as cadeiras de volta aos lugares de origem, e começamos a subir as escadas. Meu quarto era o primeiro do corredor, onde eu entrei, e por algum motivo meu amigo me seguiu. Pedro permaneceu dentro do quarto com a porta aberta, conforme eu tirava os sapatos e os guardava no guarda-roupa.

— Está tudo bem? — Perguntei.

Ele pareceu pensar por um momento.

— Acha que vou me apaixonar algum dia?

A pergunta me surpreendeu tanto, que acabei deixando cair a escova de cabelo que segurava. Engoli em seco para tentar me concentrar no que precisava dizer, e não no que sentia, mas uma parte de mim me dizia pra parar de mentir. Doía, doía muito ver Pedro tentar amar aquelas garotas. Porque ele parecia desesperado por qualquer uma, enquanto eu estava bem ali...

— Pedro.

Me virei de frente pra ele, tentando manter o olhar fixo no dele. Aquele olhar... já estava na hora. Fechei as mãos com força, tentando manter o mínimo de equilíbrio conforme ele me olhava com dúvida.

— Seria tão difícil assim se apaixonar por mim?

Garota em gotasOnde histórias criam vida. Descubra agora