Pássaros cantavam do lado de fora, repousando seus pequenos e leves corpos nos galhos das árvores secas, que esperavam pacientes pelo calor revigorante da primavera. Ele se esforçou para escutá-los, mas a voz rouca do professor abafava e distorcia aquela canção tão tranquila.
Memórias sussurravam do lado de dentro, e nem mesmo um grito seria capaz de aquietá-las, nenhuma força existente no mundo poderia reprimi-las. Elas eram quase inaudíveis, porém, tão repetitivas e cruéis que poderiam guiá-lo sem nenhum problema até precipício da loucura.
Mas Shoyo era forte, por mais que não acreditasse. Sua energia era tão calorosa e absurda que seria capaz de incendiar qualquer memória ou pensamento ruim. Entretanto, isso ainda era uma habilidade desconhecida por ele, e toda essa energia era congelada pelo frio persistente da impotência que ele acreditava ter.
Ele via os papéis jogados em sua carteira, via aquelas notas baixas, seus olhos se encheram de água.
Decidiu buscar refúgio nos pássaros e nas árvores mais uma vez, para impedir que aquelas lágrimas descessem, mas ao olhar para a janela ele só pôde encarar a sua própria face, seu reflexo inquieto, ridículo.
"Isso não diz nada sobre você, Shoyo. Não diz nada sobre o seu valor."
Uma memória doce, esquecida nas distantes partes da mente, ultrapassou todas as outras que o perturbavam. Seu coração sempre se aquecia ao ouvir a voz suave de sua mãe.
Mas ela logo se desvaneceu, assim que Hinata olhou novamente para suas notas.
Eu preciso melhorar... Eu preciso... Ele pensava consigo mesmo, enquanto o semblante impassível de seu pai invadia sua mente.
Não posso mostrar isso pra ele... Não posso.. Não posso...
Ou...
A ideia de ser obrigado a deixar o vôlei era assustadora demais, dolorosa demais, cruel demais.
Shoyo não aguentou. Repousando sua cabeça na mesa, ele escondeu o rosto e chorou da maneira mais silenciosa possível.
. . .
Já dentro da mente de Kageyama, os pensamentos estavam um tanto mais desordenados. Ele não tentou prestar atenção nos pássaros nem mesmo no professor. A única coisa que passava pela sua cabeça era Hinata, e seu comportamento estranho de mais cedo.
Ele não estava bem, isto estava claro. Seja pela falsidade de suas expressões quanto pela maneira distraída que jogava no treinamento da manhã.
Kageyama não o encontrou durante os intervalos entre as aulas. Procurou por todos os lugares, mas não se deparou com nada além de sua ausência gritante.
Aquilo já estava se tornando uma tortura. Onde ele estava? Teria ido embora? Não era do feitio de Hinata fazer algo assim, ainda mais sem dar explicações a ninguém.
Ninguém.
Kageyama estava sozinho. Não tinha tentado falar com ninguém do time ainda, aliás, estava evitando ter que fazer isso.
Mas... Por qual motivo?
Ele não sabia dizer.
Perdida no meio de seus pensamentos inflexíveis, estava a ideia de que aquilo não era necessário, estava a ideia de que ele seria a primeira e talvez única pessoa com a qual Hinata falaria se tivesse que ir embora.
E, percebendo isso, ele caminhou até as salas do terceiro ano, tentando se desvencilhar do gosto amargo que aquela ideia egoísta e patética lhe causava.
VOCÊ ESTÁ LENDO
𝐨 𝐬𝐨𝐥 𝐬𝐞𝐦𝐩𝐫𝐞 𝐦𝐨𝐫𝐫𝐞 𝐧𝐚 𝐞𝐧𝐯𝐞𝐫𝐠𝐚𝐝𝐮𝐫𝐚. (𝒉𝒂𝒊𝒌𝒚𝒖𝒖)
Hayran KurguOnde Hinata Shoyo, atormentado pela figura paterna e por um novo vício além do vôlei, não consegue mais sorrir como antes. Ou, onde Tsukishima Kei, confuso consigo mesmo, não entende por que algo dói dentro de si quando olha para Hinata e não vê seu...