Capítulo 6 - Um ator melhor que Naruto

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Uma semana havia se passado. Sasuke e Naruto ainda foram ao cinema naquela noite, e, no geral, pode-se dizer que foi melhor do que a última vez — Naruto não havia levado um projétil plástico no olho nem ficou trancafiado no banheiro; e também não estava tão mal-humorado com as demonstrações de afeto de Sasuke, porque agora Naruto tinha em mente a plenitude de uma sutil certeza. E desses encontros em diante dos dois é que vieram, sim, os sorvetes, os algodões-doces do parque, os beijinhos confidentes nas filas dos brinquedos, do Burguer King, os refrigerantes — coisas de encontros de verdade, enfim — e todas as demais coisas que Sasuke achou ter direito, enquanto Naruto achava ter decidido estar tudo bem.

Mais um tempo se passou, e agora já era sexta-feira, um dia antes de Sasuke Uchiha completar 17 anos. E Naruto sabia bem o que esperar daquela festa. No decorrer dos passeios, (Sasuke e) os toques ficaram mais ousados, mais quentes do que fofos, porque, Deus do céu, como Sasuke amava Naruto; e ele estava tão seguro disso, como quem tem a certeza de uma infecção no corpo. Ali, sob o manto da virilidade e intensidade emocional como só a jovialidade pode oferecer, Sasuke vislumbrou o chão de estrelas do amor, o filtro indeslindável do otimismo que só a paixão poderia lhe emprestar mesmo, e que deixava bonito até o ato de um mendigo lhe pedindo "por favor, moço, por favor, qualquer coisinha já ajuda, qualquer coisinha".

Enquanto a professora entregava as notas da prova de literatura ("Itachi, parabéns! 9.8"; "Naruto, pode melhorar: 6.4"; "Gaara, meus parabéns! Nota máxima!"), Naruto comecara a passar mal. Um boxeador invisível socou-o no estômago com pontadas terríveis! Pontadas lancinantes! Pontadas, sobretudo, ah, meu Deus, ah, Jesus Cristo, sobretudo imaginárias!

Itachi não percebera no início, embora sua visão do fundo da sala fosse ótima: ele conseguia avistar a tudo, e naquele momento estava mordendo as chaves, brincando com elas nos lábios, por entre os dentes, sob e sobre a língua, um showzinho particular para Gaara, que, sempre ao olhar para o lado, seguia o padrão de ficar por dois segundos de uma forma envergonhada de deixá-lo vermelho, para então desviar o olhar para o próprio colo, ou para a folha com "uhullll, 10.0" à sua frente. Tanto Itachi quanto Gaara só viriam a perceber que Naruto estava com dor na barriga quando ele deixasse a cabeça na mesa, as pálpebras fechadas com força, os lábios ressecados (ele havia ficado sem umedecer com saliva e deixado a boca aberta para ressecar mais rápido, uma saca de mestre) e as mãos abraçando os quadris como se ele fosse partir ali na sala mesmo. Cortesia do clube de teatro. Itachi ficou encarando aquela cena com olhos semicerrados enquanto a professora não percebia nada. Isso até Gaara, tão educado quanto escandaloso, elevar o tom para dizer que:

— PROFESSORA! O Naruto tá passando MUITO MAL, deixa eu levar ele lá fora, no banheiro, POR FAVOR!!!

A professora olhou para Gaara, olhou para Naruto, olhou para o resto da turma e disse que Gaara podia levá-lo para fora de sala; que, qualquer coisa, o levasse à enfermaria; que, qualquer coisa, pedisse para mandá-lo para casa.

Gaara buscou o amigo e a mochila dele, e eles foram para a enfermaria. E Naruto interpretou tão bem que até mesmo Gaara e a enfermeira acreditaram. O olhar pesado. Os lábios entreabertos puxando um ar seco. A palidez no rosto dele e o aperto na blusa sempre que dava um passo, como se andar lhe gerasse pontadas. O cretino foi tão bom que a enfermeira lhe deu o passe para ir para casa, se quisesse, ou para matar quantas aulas no dia precisasse, se decidisse ficar. Quando ela lhe perguntou o que estava sentindo, Naruto só resmungava e gemia, segurando a mão dele sobre o estômago, como se ela estivesse enfiando uma faca nas tripas dele, e ele ali, falando ai ai pera pera devagar. Quando ele precisou deitar e ela apertou mais, nossa, aí ficou escandaloso demais até para ela, escandaloso demais para ser fingimento. E, no final, se Naruto tossice e deixasse um pouquinho de meleca escorrer pelo nariz, nossa, a porra da mulher lhe daria um bilhete dizendo que ele morreria amanhã mesmo. Terminado tudo, agora eles vagavam pelo corredor, um escorado no outro.

Chocolate Amargo   (sasunaru narusasu itasasu itanaru itaara gaanaru)Onde histórias criam vida. Descubra agora