A felina achava que a tempestade a havia sido dispersada, no entanto estava bem longe disso.
— Ele é o Hades? — uma voz masculina inquiriu.
Na soleira da cozinha o jovem de cabelo loiro escuro olhava desconfiado para ela, como se houvesse algo mais, porém implícitos, nem sempre palavras são necessárias. Ela se recompôs voltando com olhar ferino e reprovador para seu afilhado, o garoto apenas desviou os olhos não querendo demonstrar o leve temor que sentiu, Bastet podia era deusa da fertilidade, mas não isentava seu lado intimidador.
— Há quanto tempo estava nos espionando? — ela indagou sem cerimônias.
— Calma aí — ele brincou tentando amenizar o clima, o que efeito contrário. — Acabei de chegar.
— Como sabe que ele era Hades — a felina retorquiu, uma dúvida que a deixou inquieta, apesar de querer saber como Tarden chegou em sua casa, nunca havia citado sobre o lugar.
Assim como essa inquietação perdurava na mente da deusa outras tomavam conta, o que fazia ela querer amaldiçoar o rei do submundo, pois metade de suas preocupações envolvia Hades.
— Minha vó Deméter, ela me falou sobre ele — Tarden contou, sem ter noção da dimensão do que havia dito.
A deusa ergueu as sobrancelhas em surpresa. Não aquilo só poderia ser um equívoco, desde quando Tarden entrou em contato com os olimpianos? quem seria imprudente o bastante para expô-lo aos seus inimigos. A felina fitou os olhos castanhos contendo a raiva que crescia, enquanto ela movia tudo ao seu redor para protegê-lo ele negligenciava todo o seu esforço.
— Quem deu permissão — ela silabou contendo a raiva, Anúbis e Perséfone não poderiam ter tal descuido.
A felina se afastou revirando as almofadas do sofá mais próximo atrás da bolsa, não era seguro ficar na casa com o garoto, eles não teriam proteção o bastante caso houvesse um ameaça.
— eu sou um deus, posso ir onde quiser — Tarden voltou a replicar contrariado, e lá estava a teimosia do seu afilhado.
Uma risada sarcástica escapou dos lábios de Bastet, ela se virou voltando a avaliar o garoto.
— Um deus imprudente — murmurou.
— Tia, vocês não podem esconder tudo de mim, eu faço parte dessa história.
— Isso não lhe dar direito de entrar em terreno inimigo — replicou. — Não faça todo nosso esforço ser em vão.
Não queria nem supor a ideia de alguém por as mãos em Tarden, havia se passado poucos anos desde que ela pegara o pequeno bebê choroso no colo, mas nunca esqueceu como aqueles pequenos olhinhos a encararam com profundidade, foi ali que soube que faria tudo por Tarden. Ela era uma deusa da fertilidade, vira muitos nascimentos e abençoava que a procurava, todo nascimento de um humano ou deus tinha seu modo especial, uma vida recém chegada era sempre uma dádiva, contudo o nascimento e Tarden havia despertado algo a mais, um sentimento que a entorpecera de tal modo que dispersou por um instante tudo que havia sucedido naquele ano, ela apenas tinha sentido o mesmo com Malu.
Tarden exibiu uma cara carrancuda, mas não tornou a retrucar, sabia que sua tia não deixara margem para discussão.
Ela permaneceu vasculhando até encontrar a bolsa desgastada. A viagem até Heliópolis era exaustiva mesmo com seus atalhos, Bastet passou por Tarden entrando na cozinha sofisticada procurando algumas frutas acessíveis, Azila era responsável pelos afazeres culinários, de um simples achocolatado a um prato típico do Egito, Bastet não cansava de elogiar seus empenhos.
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Ascensão [LIVRO 2]
FantasíaMarcas são lembretes de feridas recentes ou não, Bastet tem muitas delas, invisíveis aos olhos de humanos e deuses, mas ainda estão presentes lembrando de suas escolhas e ressentimentos. O mundo se reinventou, mais moderno e conectado, os deuses est...